sexta-feira, 29 de abril de 2011

Núpcias Alquímicas

Cheguei atrasado hoje ao consultório por conta de ficar vendo a cerimônia do casamento de Kate e William. Hilária era a quantidade de palpiteiros na transmissão, em todos os canais. Analistas de moda, bispos anglicanos, cronistas e fofoqueiros em geral que abafavam o maravilhosos coro e suas músicas reverberando na Abadia de Westminster. Felizmente eu tenho TV a cabo e consegui ver a cerimônia pela BBC, deu até para ouvir a música sem precisar ouvir falar da família da noiva e sua empresa de festas e banquetes. Lógico que se ouve uma série de comentários azedos, sobretudo de intelectuais arrotando coisas sobre a sociedade do espetáculo e a monarquia pop. Confesso que cheguei a me emocionar com a força do ritual e a evocação da Tradição em todos os detalhes, do vestido da noiva à carruagem, culminando com o beijo na sacada, com certeza um must em todas as publicações tipo Revista Caras a partir de amanhã, nas bancas. Como terapeuta junguiano sou bastante ciente da importância dos ritos de passagem, a importância da Tradição que serve de referência às novas gerações, da emoção que um casamento Real provoca em pessoas que nada tem e nada terão a ver com a Monarquia Inglesa.
Nossa sociedade tecnicista transforma tudo em bem de consumo e em valor agregado, subtraindo do Símbolo a sua força expressiva. No programa do Pânico, no Domingo de Páscoa, os comediantes (?) do programa perguntavam para aquelas meninas de carroceria avantajada se sabiam o que se comemorava na Páscoa. As respostas se dividiram em "comemoramos o coelhinho da Páscoa" até "O nascimento de Jesus". Ter um bumbum malhado não garante um Cérebro malhado, meninas. A Páscoa não comemora o nascimento de Jesus. Nem do coelho Pernalonga.
Os símbolos perdendo o seu valor perdem também a sua função principal, que é a de serem fatores de estruturação da consciência.
O casamento de Kate e William, como já postei ontem, dá um alento à mitologia evocada por Príncipes e Princesas no imaginário coletivo. A Casa dos Windsor foi bastante maltratada nas últimas décadas por divórcios, crises de anorexia, a morte trágica e estranha de Lady Di, sem dúvida a mais midiática das princesas. A última imagem que ficou foi dos funerais de Diana, que já não era uma princesa mas foi levada pela mesma carruagem de cem anos usada na cerimônia de hoje. Uma imagem de profunda tristeza seguida, treze anos depois, pela imagem das núpcias.
O casamento da Príncipe herdeiro e a Princesa significa, nos símbolos alquímicos, muito estudados por Carl Jung, a união dos opostos, dos Princípios Masculino e Feminino formando a quintaessência, a substância da vida. Renovação, esperança, recomeço, retomada do caminho da transformação nesses tempos bicudos, onde todos parecem perder contato com a sua essência humana. Tempos de massacres escolares, pedófilos e criminosos virtuais. O símbolo do Casamento, das Núpcias alquímicas, renova a esperança e o orgulho em Ser Humano, nessa época em que estamos tão desumanizados. É muita responsabilidade para aqueles dois, recém saídos da adolescência.
O casamento alquímico é uma tarefa de todos, a união da alma e do corpo, do epírito e da matéria. os símbolos, os rituais, as tradições nos ajudam, quem sabe, a reavivá-los.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

William e Kate

Estava ouvindo um analista na CBN falando tanta bobagem a respeito do casamento Real na Inglaterra, o casamento de século entre o Príncipe William e a belíssima plebéia, Kate, que resolvi dar o meu pitaco. O tal do fulano dizia da inutilidade e irrealidade dessa história de casamento real no mundo moderno. O casamento Real é irreal, poderíamos resumir de seu comentário.
O filme ganhador do Oscar desse ano, "O Discurso do Rei", mostra de forma dramática a necessidade da família Real inglesa se adaptar aos novos tempos, fazendo uso de uma nova e potente mídia, o rádio. O príncipe Albert sendo completamente gago, sobretudo em situações de exposição social, emudecia em espasmos de esforço diante dos microfones. O seu pai berrava para ele falar, o que com certeza não ajudava muito. Desde então a nobreza da casa dos Windsor tem feito das tripas coração para se adaptar aos tempos da hipermídia e dos tablóides publicando conversas íntimas entre o pai de William, Charles e sua amante Camila, onde ele dizia que "queria ser o seu Tampax" (não me parece uma fantasia sexual agradável, a menos que Charles seja um vampiro, mas essa é outra história).
Eu particularmente não tenho lá tanto interesse na monarquia inglesa, nem em outras monarquias, mas acompanhei com interesse a morte da Princesa Diana e a sensação coletiva e mundial de luto pela morte prematura de uma mulher que deu uma face social e militante à monarquia empoeirada.
Nessa época em que os jogadores de futebol são contratados ou não em função de seu valor midiático, a casa Real Inglesa continua valendo ouro. As meninas continuam crescendo com fábulas de princesas e príncipes, os filmes de Hollywood continuam propagando no imaginário das pessoas a união de pobres e ricos, plebéias e príncipes em suas comédias açucaradas. O espetáculo das Revistas Caras da vida propaga exatamente essa idéia, de aristocracias sorridentes brindando a sua felicidade de plástico na Ilha de Caras. O casamento do príncipe bundão com a morena estonteante toca sim, profundamente no imaginário coletivo e traz ventos de renovação para a Casa Real Britânica. O casal real, como mais uma peça na cultura pop, serve como ícone de identificação para o cidadão comum. As roupas de Kate já viraram moda, o sorriso de William já prenuncia a sucessão em grande estilo, quando a sua avó vai pular uma geração (a de Charles, ufa!) e vai entregar a Coroa majestosamente (desculpe o pleonasmo) para o seu neto e a sua bela esposa. Esperemos que ela faça isso bem rápido, antes que a primeira crise conjugal chegue aos tablóides.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Mistério da Páscoa

Ontem o evento foi bem legal. Pequeno, como planejamos, para podermos errar. As pessoas não sabiam, mas eram "cobaias" do espaço e do evento, como nós. Acho que nos saímos bem, palestrantes e o grupo, que foi receptivo, generoso, estimulante. Rita, uma das palestrantes, me levantou muito a bola para falar de Carl Jung, psiquiatra sumiço que muito influencia nosso trabalho. Acabei falando de Neurociência e trabalho multiprofissional. Não deu para falar do véio, que é um assunto muito longo. Mas hoje, na Sexta Feira Santa, fica difícil não produzir um texto junguiano.
Ganhei um DVD baixado da internet há uns dois anos com várias teorias de conspiração sobre o atentado de Onze de Setembro. Outras partes eram dedicadas a outras "farsas", como a história de Jesus. Lembrei o título do DVD, "Zeitgeist". Os autores desse vídeo fizeram vários paralelos entre a história de Jesus e outras mitologias, como a suméria, egípcia, judaica. Tentavam desmascarar o complô que inventou histórias sobre Jesus. Para um junguiano, é um debate meio besta. A história de um rabino que viveu há cerca de dois mil anos na Galiléia e deixou ensinamentos e feitos extraordinários, como um verdadeiro Avatar espiritual, foi evidentemente remendada de vários mitologemas que vinham de outras culturas. Só para citar, o Nascimento Virginal, a Criança Divina, o Escolhido, todos são mitologemas que já haviam aparecido em outras mitologias e foram sendo incorporadas ao mito cristão. Zeitgeist não desmascarou ninguém.
Um filme que eu amo é "A Última Tentação de Cristo", de Martin Scorcese, um filme realizado no final dos anos 80 e que causou uns atentados de fundamentalistas nos cinemas em que foi exibido. Fundamentalistas cristãos, frizemos, pois acharam a leitura do filme, baseada em livro de Nikos Kazantzakis, escandalosa. Vou citar uma cena que causou a ira dos ativistas. Cristo opta no filme, de forma alucinatória, a descer da cruz, casar com Madalena, ter uma família. Depois de muitos anos, encontra um pregador contando a história que celebramos hoje, da Morte e Ressurreição de Jesus, o Cristo. O Jesus do filme chama o pregrador de lado e fala que nada daquilo aconteceu, que ele se casou, constituiu família, portanto, a história era falsa. O pregrador, se não me engano Saulo de Tarso que viria a ser São Paulo (não a cidade, o apóstolo) retruca que para ele de nada fazia diferença a história que aquele desconhecido contava. O "meu" Jesus é que interessa e esse morreu na cruz e venceu a morte. Bingo. O mito cristão conta uma trajetória espiritual, do homem Jesus ao Cristo espiritual, que volta da morte como Corpo Luminoso e Consciência Crística. É isso que vem sendo recontado e reelaborado nesses séculos. No final do filme, Jesus acorda de seu sonho e percebe, com alívio, que seu Sacrifício está consumado.
Hoje comemoramos o sacrifício de um ser que chama sobre si todo o sofrimento humano e vai redimí-lo com esse sacrifício. Temos tantos horrores escondidos na natureza humana, mas temos também a capacidade de entrega, de sacrifício da própria vida para benefício do Outro. Lembro dos funcionários da usina de Fukushima que se queimaram e contaminaram de radioatividade na luta febril para esfriar os reatores. Muitos deles devem ter o futuro comprometido por essa luta. Eles podem ter sacrificado a própria vida para evitar um desastre nuclear. Eles representam a morte e ressurreição daquele filho de carpinteiro da Galiléia. Mesmo que não sejam cristãos.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

A Clínica Integrada

Na época da minha residêcia eu fazia parte de um saudoso grupo no Instituto de Psiquiatria do HC, o Grupo de Interconsultas. O nosso foco de estudo era o paciente internado em um Hospital Geral com um quadro psiquiátrico, prévio ou não à internação. O grupo era bem legal, mas o seu logotipo era um desenho de um corpo humano todo fragmentado, como um quebracabeças que não se junta. A idéia era que a gente iria colar aqueles pedaços, mas a imagem transmitia exatamente a impressão contrária. Nesses anos todos, posso afirmar que a Medicina e a Psiquiatria mais contribuíram para aumentar do que diminuir essa fragmentação.
Durante anos eu brincava (e desde Freud sabemos que as brincadeiras são sempre muito verdadeiras) que iria montar uma clínica de três andares: o primeiro andar seria uma academia, mas uma academia diferente. O trabalho físico serviria para criar e aumentar a consciência corporal. Professoras vestidas de Xuxa dando gritinhos e forçando os limites dos alunos seriam proibidas. Mais flexibilidade e menos hipertrofia, mais alongamento e menos repetição automática e algo maníaca de movimentos. Condicionamento gradativo, tonificação e manutenção, sem tentar bater recordes todos os dias e instrutores motivados gritando "Vamo' lá!"nos seus ouvidos.
No segundo andar, técnicas Mente-Corpo: Visualização Criativa, conhecida entre os junguianos como Imaginação Ativa, Yoga e Meditação. Expansão da Consciência e tranquilização de sintomas ansiosos e técnicas de copyng (não consigo traduzir essa palavra. Copyng seria algo como "lidar com") de estresse e estressores. O terceiro andar teria uma sala de Nutrição e mais do que isso, de Terapia Nutricional. O trabalho seria acompanhado e complementado pela Psicologia e Psicoterapias Junguiana e de EMDR. Se todas as salas falharem, aí sim o paciente finalmente entraria na sala do Psiquiatra.
Acho melhor não pedir financiamento para nenhum laboratório. Acho que eles não vão curtir o projeto, que foi desenhado para dar prejuízo para eles. Os medicamentos que eles produzem, em muitos casos, são maravilhosos, mas a ação combinada de técnicas e trabalhos humanos de baixo impacto tecnológico certamente diminuem ou mesmo anulam a necessidade de tratamento medicamentoso. Não só de medicamentos psiquiátricos, mas de todos os dinossauros da indústria, como remédios para o Colesterol, Diabetes, Hipertensão. Acho melhor não postar esse blog. Vou ser cortado do circuito dos laboratórios. Chega de chocolatinhos e outros brinquedos para o doutor.
Vamos fazer uma pequena aula para inaugurar esse projeto. Psiquiatria, Psicoterapia e Nutrição trabalhando integradas. Não temos três andares, e ainda falta muito para termos toda essa equipe. Mas já estou sentindo aquele desenho do homem fragmentado se juntando, aos poucos. Todos os pedaços.

domingo, 17 de abril de 2011

Civilização Inflamatória II

No Congresso Brasileiro de Psiquiatria no ano passado eu assisti uma palestra bacana (adoro garimpar exposições legais em meio a um mundo de mesmice e de jabás de laboratórios que são a base de um congresso médico). O gaúcho bravo dizia que os medicamentos psiquiátricos tinham virado uma commoditie. Diagnósticos, tratamentos, estratégias terapêuticas, tudo regido pelo discurso e a lógica do mercado. Auch! Essa doeu.
Fui a um jantar em consideração a um amigo, era um evento do laboratório, eles fizeram os médicos assistirem aula até às 22:00 hs para poderem ir comer o churrasco. No meio da primeira aula eu saí, atravessei a rua e comi boas porções de camarão e chopp pagos com meu dinheiro ganho honestamente. A classe médica perdeu muito nas últimas décadas, a consulta virou um bem de consumo de baixo valor, já que o que interessa é ter acesso aos exames e às prescrições. Pelo menos podemos exigir que respeitem a nossa inteligência. Teve um congresso no sul que no meu crachá não estava nem escrito Médico, mas Prescritor. É assim que somos enxergados, como os donos das canetas e dos carimbos. Um Prescritor.
Apesar dos bilhões de dólares gastos com exames, pesquisas e procedimentos, as pessoas não estão mais saudáveis. Lembro de uma música de Renato Russo, que dizia que "Há tempos são os jovens que adoecem". Ontem foi enterrada uma filha de Roberto Carlos, o rei, fulminada por um infarto sem ter chegado perto dos cinquenta anos.
O Infarto do Miocárdio tem um componente inflamatório. Diversos tipos de Câncer também derivam da atividade inflamatória. Outro dia estava conversando com uma cliente que estava terminando o curso de Nutrição, procurando material para o seu TCC, como ela é portadora de Lúpus Eritematoso (doença autoimune, portanto, inflamatória), queria pesquisar sobre estratégias de lidar com a doença pela Nutrição. A sua orientadora não tinha nenhuma pista para lhe dar. Como não, cara pálida? Falei para ela do aumento vertiginoso das doenças inflamatórias da metade do século vinte para cá. O que mudou de forma tão importante de lá para cá que os remédios, procedimentos e protocolos médicos viraram um commoditie, mas há tempos são os jovens que adoecem? Antes de mais nada, talvez o maior triunfo da Medicina Ocidental, que foi o advento dos antibióticos e o controle das epidemias e endemias, pela ação preventiva, medidas de higiene e saneamento básico. A fome também foi sendo combatida. A população foi crescendo exponencialmente com essas medidas, gerando a necessidade de aumentar a produção de comida. A comida passou a ser cultivada com adubos não orgânicos, os animais criados sem espaço e pasto. Houve um aumento relativo da gordura Ômega 6 em nossa dieta em detrimento das gorduras essenciais Ômega 3. As quantidades de açúcar e farinha também forma crescendo progressivamente em nossa alimentação. Recentemente li um trabalho em que documentava que os bebês de mães jovens, viciadas em fast food e bolachas já nascem com um organismo propenso à obesidade, como se viesse ao mundo falando: "Vamos acumular que está faltando comida". É só olhar na rua e ver que a tendência epidêmica da obesidade já chegou por aqui. É óbvio que isso afeta a evolução de várias doenças, o Lúpus Eritematoso incluído. Quando acabei de falar a minha cliente me olhou com cara de "como estou ouvindo uma aula dessas no consultório de um psiquiatra?". Pois é. Podemos lançar mão de diversas fontes de conhecimento para ajudar os pacientes. Continuamos médicos, não apenas prescritores.

sábado, 16 de abril de 2011

Civilização Inflamatória

Vou aproveitar esses posts para organizar as idéias para a aula do evento anunciado no último texto. A minha aula vai ser fortemente baseada num autor que venho lendo há algum tempo, um psiquiatra francês, radicado no Estados Unidos, chamado David Servan-Schreiber. David era um pesquisador e neurocentista de destaque, com acesso aos primeiros aparelhos de Ressonância Funcional, os mesmos que provocaram um intenso avanço em nossa compreensão da maravilhosa máquina quântica chamada Cérebro. Em um dos procedimentos para iniciar a pesquisa, David entrou no aparelho para usar o seu Cérebro, no intuito de regular as imagens. Após um silêncio, pediram para repetí-las. Ele achou que o aparelho estivesse com problemas. Infelizmente, não era isso. O exame detectou um Tumor Cerebral que depois revelou-se maligno. Em poucos dias, o jovem e promissor pesquisador deixou o lugar dos médicos e experimentou o difícil lugar dos pacientes. O final da história é feliz, pois após longos tratamentos ele se recuperou e está bem, escrevendo livros que eu adoro ler. A sua carreira como pesquisador é que mudou completamente o foco. David pesquisou profundamente uma visão e uma estratégia mais ampla para enfrentar o Câncer. Descobriu que a Literatura Médica e os colegas estimulavam essa pesquisa com um sorriso amarelo no rosto. Médico acredita em remédios e bisturis. O resto são terapias "alternativas". O próprio nome já é pejorativo e traz um ar de charlatanismo. Que existe muita gente desesperada cuspindo farofa na encruzilhada ou sendo enterrada em rituais xamânicos na busca da cura, não tenho dúvidas. Mas os insights que David colheu em sua jornada de cura foram muito preciosos para serem ignorados.
O que é o Câncer? É um nome que descreve um processo de multiplicação irregular de células. As células cancerosas se multiplicam mais rápida e incorretamente do que as células normais. Rudolf Virchow, um grande médico alemão, observou em meados do século Dezenove a relação entre Câncer e Inflamação. Foi ignorado, como muitos autores de uma descoberta intuitiva. Um século e meio depois foi validado. Hoje é estabelecida a relação entre Inflamação e Câncer. Da mesma forma, muitos psiquiatras do século vinte estabeleceram relações entre Stress e Doença Oncológica. Não foram poucas as vezes em que eu ouvi e ouço um esgar de rancor dos colegas contra essa hipótese. Eles caçam as teorias dos psicanalistas como Torquemada caçava e incinerava as bruxas. Pois vejam só, os psicanalistas tinham razão num monte de coisas. Mágoa vira doença, sim, conflitos internos também. As feridas psíquicas tem conexão com falhas na resposta imune, consequentemente, se você acha que a gripe que pegou após uma prova difícil ou o fim de um namoro teve algo a ver com o stress, sim, teve. Stress, alimentação inadequada e industrializada, sedentarismo, aceleração psíquica e física, traumas e perdas, tudo isso está relacionado com nossa Civilização Inflamatória. Queremos mais, mais, mais. Mais comida, mais dinheiro, mais reconhecimento, mais atenção. Um imbecil matou doze crianças porque estava precisando de um pouco de atenção. Conseguiu, inclusive, está nas capas de jornais e bombando seus vídeos no Youtube.
David descobriu que a Meditação, os Exercícios, a Alimentação e a mudança de hábitos eram formas maravilhosas de reforçar as defesas naturais de seu organismo, levando-o a superar a sua doença por duas vezes. O seu médico observou, satisfeito, que a sua resposta aos medicamentos foi brilhante. Ele deve ter uma genética muito boa, pensou, enquanto tomava a sua Coca Diet e comia um donut, cheio de açúcar e de corantes.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Espaço "Quattro !"

Essa vai para os leitores e leitoras desse blog (todos os seis!): dia 21 de Abril é uma Quinta Feira, feriado e programamos um evento aqui na clínica para apresentar o trabalho das pessoas e de quebra fazer algo que me fez escolher esse espaço, que é compartilhar conhecimento. Estava pensando em falar sobre aceleração e violência, ainda pilhado com o ocorrido na semana passada em Realengo, mas desisti. Não vou falar também sobre Tiradentes, embora seja uma figura histórica muito bonita. Não devo falar sobre a Páscoa, que tem uma simbologia muito bonita de Morte/Transformação/Ressurreição, extremamente significativa em tudo o que vivemos psiquicamente no dia a dia.
Vou falar sobre as novas técnicas que ajudam a evitar ou a usar menos medicação psiquiátrica ou mesmo outros tipos de medicação, diretamente relacionadas com o estresse e a aceleração de nossa vida pós moderna. Meditação, Reeducação Alimentar, Psicoterapia, EMDR, que é uma nova técnica de diminuição de sofrimento através dos movimentos oculares, Higiene do Sono e dos ritmo biológicos e Exercícios Físicos. Essa palestra vai fazer link com as duas outras, onde a nossa nutricionista, Adriana, vai falar sobre "Dieta sim, por que não?" e Rita, que vai falar de Dinâmicas Familiares. A nossa outra psicoterapeuta, Theca, vai estar em outro workshop e não virá dessa vez.
Vai ser uma boa ocasião para experimentar o espaço e iniciar esse trabalho de compartilhar e aproximar as pessoas desse tipo de saber, tão protegido pelos cartórios e igrejinhas universitárias e corporativas.
Os leitores e leitoras do blog tem preferência. As vagas são limitadas. Favor fazer a sua reserva no (11) 3726 8478. O horário do evento será das 9:30 às 13:00 hs. Pediremos apenas 1 kg de ração ou algum produto para cuidado de cachorros (xampu, coleira, ossinhos de couro, etc) pois ajudamos grupos de resgate e cuidado com cachorros abandonados em São Paulo, cada vez uma realidade mais frequente em nossa cidade. Benvindos.
PS: nosso endereço e como chegar será passado após a inscrição. Até lá.

domingo, 10 de abril de 2011

O Ato Gratuito

Ontem o Portal UOL publicou uma entrevista com o único amigo que Wellington Menezes, o assassino da escola em Realengo, teve em sua vida. O sujeito frequentava a Igreja Evangélica com Wellington e saíram de lá atritados com os dirigentes e o conselho de anciãos. O sujeito fez associações e interpretações suficientes para levá-lo a uma boa avaliação psiquiátrica: Wellington teria frequentado uma seita chamada "Os Treze Iluminados", daí a intenção de fazer treze vítimas. Era um fã do atentado de Onze de Setembro, daí a intenção de fazer o seu atentado no dia 07/04, pois sete mais quatro soma onze. Segundo o rapaz, que uma vizinha classificou como tão esquisito como o assassino de Realengo (se você quer uma boa fofoca, entreviste os vizinhos), Wellington destruiu o seu computador para apagar o seu laço com a seita misteriosa. O rapaz era vítima de perseguições e abusos junto com Wellington em seus tempos de Ensino Médio. Uma das razões do ato terrorista ter sido perpretado na escola foi o suposto bullyng que teria sofrido em sua passagem por lá.
A matéria, com esse rapaz pirado de dar com um cachorro morto na cabeça, mostra o desespero da mídia em tentar achar um culpado, um bode expiatório que nos devolva a paz. A possibilidade de um louco invadir a escola de nossos filhos e descarregar dois revólveres mais de 60 vezes é por demais aterrorizante. Tem que haver uma explicação. Encontramos na mídia toda uma gama de informações desencontradas, mexericos de vizinhos e palpiteiros de diversas áreas desfilando os seus achismos.
Wellington cujo corpo deve estar sendo constantemente manipulado por mãos impuras e vai ser sepultado sem o lençol branco imaculado que solicitou, apagou realmente todos os vestígios de motivo para o seu ato monstruoso. Nada de computador, diários ou de memória. É como se ele nunca tivesse existido. Esse é um dos horrores de nossa pós modernidade: a violência é um ato em si, não precisa de ideologia, não precisa de justificativa. Até a Al Qaeda tem uma ideologia que dá fundamento aos seus atentados. Talvez o mais assustador do ato psicótico de Wellington seja que aquilo foi apenas um ato em si de ódio contra o mundo, contra a inocência perdida, sem nenhuma justificativa, sem nenhuma ideologia. Na era da hipermídia, aparecer na televisão, ser objeto de atenção é uma febre mundial. Antigamente as pessoas eram famosas porque eram especiais, hoje são especiais porque são famosas. Ser um exBBB é o auge da fama.
O rapaz perturbado do Realengo, que destroçou a vida de muitas famílias, nos deu o arrepio na espinha da violência como um ato em si, que não necessita de um motivo.
Lembro de um filme de psicopata que eu gostava muito: "Seven", onde Morgan Freeman perseguia um assassino em série que matava pessoas inspirado nos sete pecados capitais: ira, inveja, preguiça, cobiça, gula, o assassino pegava pessoa que ao seu ver representavam esses pecados e os matava, com paciência e crueldade. Esse velho policial era acompanhado pelo jovem colega, interpretado por Brad Pitt. Todos vão ficando mexidos com a investigação. A cena que eu lembro o personagem do velho policial conversa com a jovem esposa do parceiro, que lhe segreda que está grávida mas não conseguia contar para o marido, obscecado por perseguir o tal psicopata. Ela não sabe se vai colocar uma nova vida nesse mundo em que vivemos. O velho tira olha para ela e diz: "Mime muito essa criança. Nunca deixe de estar atenta a ela." Parece que num mundo dominado pelos sete e vários outro tipos de pecado capital, a nossa única proteção é dar a nossa atenção aos mínimos detalhes da vida e do outro que está na nossa frente. Wellington atirou nos seus fantasmas. Acertou na nossa indiferença.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Realengo, 07 de Abril de 2011

Ontem o Brasil teve, pela primeira vez, um massacre escolar, com um atirador sociopata invadindo e matando adolescentes indefesos na escola onde cursou o seu Ensino Médio. A presidente Dilma observou que não tínhamos essa "tradição" por aqui, e várias pessoas mais ou menos ilustres falaram sobre esse tipo de tragédia não acontecer em terras brasileiras.
O inesperado e o absurdo do espetáculo de violência gratuita fez a mídia buscar freneticamente todo tipo de profissional ligado ou não a esse tipo de evento para desfilar os seus palpites: uma educadora alertava para os vídeo games violentos; um filósofo para as falhas da comunicação humana; um psiquiatra chamava Wellington Menezes, o perpretador, o assassino em série, de psicótico; outro psiquiatra afirmava que o discurso do rapaz em seu bilhete suicida continha frases fundamentalistas islâmicas entremeadas de outras de conteúdo místico. O seu conteúdo seria "desconexo". Resumidamente, o chutômetro levado a status de esporte nacional. Todos se acotovelando diante das câmeras para dar o seu pitaco.
Durante essa Quinta Feira tive um dia cheio no consultório, estava sem internet e a história veio me chegando em pedaços, até se condensar em seu horror. Quando cheguei em casa, fiquei zapeando de canal em canal procurando pelo o que todos procuram diante de uma tragédia como essa: O que aconteceu? Por que aconteceu?
Uma tragédia como essa está sempre além de nossa compreensão. Cada um faz uma leitura pelo buraco de fechadura de seu sistema de crenças. Eu vou dar o meu pitaco, pelo buraco da fechadura da Psiquiatria.
O texto de Wellington não é desconexo. De forma alguma. O seu texto contém uma série de instruções detalhadas sobre o que e como fazer os preparativos e sepultamento de seu corpo. Quase uma erotização de sua própria morte. O conteúdo não é fundamentalista islâmico. Wellington passou a sua infância indo de porta em porta com a sua mãe, distribuindo folhetos de uma Igreja Protestante que ela frequentava. O texto tem uma influência evidente da linguagem do Velho Testamento. Ele determina, como um semi deus poderoso, todos os cuidados e proibições com relação a seu cadáver: ele deveria ser tocado por mãos puras, de pessoas que não pecavam contra a castidade. Se manuseado por pessoas impuras, as mesmas deveriam estrar cobertas com uma luva. O seu corpo deveria ser lavado, purificado e envolvido sem roupas por um lençol branco, que já levara para a escola e estava numa bolsa. Os mesmo cuidados que recebeu o corpo de Jesus após a crucificação. O bilhete não é desconexo. É assustador pela falta de necessidade de justificar de qualquer maneira o porque daqueles atos.
Wellington era filho de uma moça com problemas psiquiátricos, prima da senhora a quem chamou de mãe toda a sua vida. Foi adotado e criado como uma espécie de acompanhante dessa senhora. Era estranho e teve desde sempre sérios problemas de socialização. Os seus pais adotivos morreram nos últimos cinco anos. Com o seu suicídio ritualizado, pretendia se reunir à sua mãe morta, o único vínculo que ele formou em sua vida (pede expessamente para ser sepultado ao lado da cova em que sua mãe "dorme"). Matando as meninas bonitas que estavam deitadas, inermes, ele explodiu a muralha de silêncio que o separava do mundo. A morte foi a sua forma de fusão, a chance de chamar a atenção sobre a sua existência insignificante. Como muitos adolescentes ou adultos jovens que perpretam esse tipo de violência, Wellington passou uma boa parte de sua vida apartado socialmente, acumulando desejos e frustrações que gradativamente se transformaram em ódio e numa ação organizada e gélida de vingança. Ele sabia que só Deus poderia lhe oferecer algum perdão. Nós, humanos, não.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Felipão

O técnico de futebol Luís Felipe Scolari é mesmo uma figura. Ainda me lembro quando assumiu a seleção, em 2001, e enfrentava um lobby nacional para convocar Romário. A seleção estava jogando em Goiás, se não me engano, um torcedor passou e lhe deu um xingo, exigindo Romário na Copa. Felipão deu-lhe literalmente um chute na bunda, foi todo mundo para a Delegacia até a turma do deixa disso aparecer e apaziguar a situação. Esse é o Felipão.
Voltou para o Brasil já completamente consagrado, com vários títulos, uma Copa do Mundo inclusive, e vários milhões de dólares na conta. Ainda encontra forças para treinar um Palmeiras completamente esfacelado, por um terço do que ganhava no exterior e ainda tem que aguentar repórteres recém formados comparando o seu salário com o orçamento dos times que enfrenta no Paulistinha. Ainda ameaçou buscar o moleque no Inferno se algo acontecer à sua família. O mesmo bom e velho Felipão. A minha secretária do lar, Rafaela, é palmeirense roxa, sócia da Mancha Verde. Quando o Palmeiras contratou Max Pardalzinho e Adriano Michael Jackson, caímos de pau nela, com boas gargalhadas na cozinha. Outro dia o Adriano Michael Jackson meteu quatro gols numa partida. No Comercial do Piauí, ok, mas o moleque, completamente desconhecido, fez gols e voava em campo como ninguém. Tive que aturar gozação da Rafa, como são as coisas do futebol. Lembrei a ela que só o Felipão para tirar leite desse território árido que é o elenco alviverde.
É muito raro um técnico fazer um jogador jogar mais do que realmente joga. O Telê cansou de lesar os clubes que compravam jogadores do São Paulo que jogavam uma barbaridade no Morumbi, para depois se revelarem jogadores bem medianos longe do Mestre. Felipão também causa essa impressão. Ele consegue extrair o máximo dos jogadores, sobretudo dos medianos, para depois ser aquela decepção quando vão para outros clubes. Felipão trabalha os seus grupos com dois princípios que aplica sempre e que sabe que aplica, embora não dê nomes científicos para isso: o princípio da Atenção Plena e o princípio da Visão Compartilhada.
O primeiro princípio é o de ter no grupo pessoas que sempre estão no fio da navalha, sempre na ponta dos cascos física e psiquicamente. Por isso ele não levou Romário. O baixinho quebrava os seus dois princípios, sempre com a preguiça e o individualismo inconpatíveis com a família Scolari. Quando você ouve o homem espinafrando o time ou comprando briga com Valdívia e Kléber, as estrelas do parco céu palmeirense, ele está mandando um recado para todos: aqui não tem corpo mole, aqui tem que ter entrega. E alma. E atenção completa, elétrica. Ontem, finalmente, elogiou o Kléber, depois de meses de rusgas. Quando você consegue de seu grupo a Atenção Plena, não precisa de nenhum palestrante motivacional na concentração.
O outro princípio é o da Visão Compartilhada. Esse é o princípio de família que ele coloca em seus trabalhos. Na Copa de 2002 ele colocou todos os jogadores para jogar. Todos. Todos estavam compartilhando a visão do objetivo em comum e da possibilidade de alcançá-lo. Não é à toa que ele levou o limitado Portugal a uma final da Eurocopa e à duas quartas de final de Copa do Mundo. Todos acreditavam na visão que compartilhavam, de chegar pelo menos até lá, de ir cada vez mais longe.
Felipão tem a característica dos grandes líderes. Isso não se ensina em workshops de final de semana.

domingo, 3 de abril de 2011

Zumbis Farmacológicos

A Folha de hoje publicou hoje uma matéria sobre o que a repórter chamou de "Efeito Zumbi" dos medicamentos psiquiátricos. Para começar, colocou todos no mesmo balaio. Seguiu-se depois um lixo de referências inadequadas, lugares comuns tendenciosos e alhos com bugalhos com sintomas e efeitos colaterais. Vou passar a semana ouvindo falar nisso, a fantasia de que do Psiquiatra Malvado que a todos submete com seus medicamentos será reforçada na cabeça das pessoas. Posso até receber essa matéria em E-Mail-Denúncia contra a Máfia de Avental.
Ontem falei sobre os Zumbis Emocionais. Juro que não combinei nada com a Folha de São Paulo. Os zumbis representam bem a nossa época, as pessoas cada vez mais famintas e apáticas, procurando por sangue, ou seja, por emoção e por algum contato físico. Não era um quadro psiquiátrico em si, embora esteja na base de vários quadros psiquiátricos. As pessoas alternam o hiperestímulo com a apatia. Os leitores podem checar os outros posts, falo disso o tempo todo.
As informações dos profissionais entrevistados são desencontradas, novamente misturando alhos com bugalhos. Existe uma tendência a um uso abusivo, seja nas indicações seja nas doses, de medicamentos com ação mais ou menos sedativa no Sistema Nervoso Central. Um dos pacientes citados na matéria teve um quadro depressivo, provavelmente por Burn Out, um termo para um quadro de esgotamento por múltiplos e importantes estressores. O paciente em questão teve esse esgotamento por desadaptação ao seu trabalho, numa empresa de telemarketing. Ele não aguentava mais ser xingado e desrespeitado por clientes e chefia, causando um colapso. A médica deu cinco tipos de remédio, o paciente suspendeu o tratamento por conta própria. Um detalhe do ofício: quando o diagnóstico é bem feito e o tratamento bem estabelecido, não dá certo suspender o tratamento. Em algumas semanas ou meses, o resultado da retirada dos medicamentos é a recaída, muitas vezes de forma mais intensa do que no início do tratamento. Se ele retirou os medicamentos e ficou melhor, é porque o tratamento foi mal indicado e/ou aplicado.
Já cansei de ver pessoas com a vida devastada por sintomas depressivos, ou ansiosos ou de abuso de substância por tratamentos inadequados ou interrompidos antes dos resultados poderem sequer serem avaliados. Esse tipo de matéria levanta uma lebre correta de forma errada e imprecisa. Os medicamentos não devem ser usados desnecessária nem em doses maiores do que as suficientes. Os medicamentos tem efeitos colaterais, inclusive o de causar, em alguns casos, uma diminuição da resposta afetiva, que a matéria da Folha chama de Efeito Zumbi. Mas esses remédios salvam vidas e reconstróem famílias todo dia. As pessoas não imaginam como era lidar com essas doenças antes desses medicamentos estarem à nossa disposição. Não imaginam o alívio que um tratamento bem feito pode trazer a um paciente que está sofrendo.

sábado, 2 de abril de 2011

Zumbis Emocionais

Antigamente eram as meninas do Tchan. Hoje temos as vitaminadas do Pânico. O inconsciente masculino reage contra o emagrecimento progressivo das modelos e das mulheres que servem como ideal inatingível. Queremos opulência, abaixo a Anorexia e a Bulimia. Por que estou falando disso?
Edward, o vampiro romântico da saga "Crepúsculo", é uma compensação para o inconsciente feminino. Não é à toa que aquele altão magrelo do Robert Pattinson virou sex symbol com o papel. Ele é apaixonado, verdadeiro e completamente cuidadoso e delicado com a sua amada, Bella. Como o inconsciente masculino procura pela mulher cheia de curvas, o inconsciente feminino tem sede desértica de homens românticos, atenciosos, apaixonados.
Um junguiano não deixa de notar a proliferação de filmes e seriados de vampiros e zumbis. Não deixa de ser um sintoma em nossos tempos bicudos. Recebi um comentário no blog de uma moça desesperada pelo namorado-que-não-consegue-assumir-a relação e que fica punindo-a com a grande arma do homem pós moderno, que é o sumiço. Ela se desespera, pede por uma definição, ele se queixa que ela está "invadindo o seu espaço". Finalmente, ele some, e a moça fica enlouquecida com o sumiço. Devo procurá-lo? Não querida. Não deve. Mas já te aviso: você vai procurá-lo, e não será bem recebida. Os homens estão sendo contaminados pelo vírus dos Zumbis Emocionais. A doença é grave e altamente contagiosa. O Zumbi Emocional tem uma profunda dificuldade de vínculo, fica ensimesmado com a sua vida e sua busca pouco objetiva de sucesso e bens de consumo, não dá espaço para vínculos, nem com mulheres nem com ninguém. Durante a noite, o morto vivo sai à procura da caça, ou já tem uma equipe de ficantes à disposição, que ele escolhe como quem escolhe uma camiseta. Durante cerca de meia hora ele é amoroso e se entrega e faz amor como um náufrago que encontrou uma ilha. A mulher sente aquela entrega, aquela conexão. Não é possível que não sinta no resto do dia o que sentiu naquela meia hora. Não é possível? É possível, sim. O amor é um bem de consumo, um aplicativo de celular. Nosso zumbi emocional volta ao seu mundo árido e narcísico. Não liga no dia seguinte, está sempre cheio de trabalho e "passando por um momento difícil". Está sempre enrolado. Nossa obsessiva amorosa esperneia, ameaça, termina a relação inexistente dezenas de vezes. O zumbi emocional ignora: mulher é assim, surta mesmo.
Edward é o contrário disso. Outro dia eu vi num programa da TV a cabo que um grupo de senhoras já próximas à meia idade formaram um fã clube, as "Twilight Moms", ou "As Mães do Crepúsculo". Rivalizam com as filhas adolescentes pelo lugar na fila e gritam com o romantismo e a pegada de vampiros e lobisomens querendo engolir aquela magrelinha sem graça, Bella. Difícil deve ser voltar para casa e encontrar o maridão, com a pança caindo sobre a bermuda, dormindo na frente da TV, que nunca sai dos canais de esporte.