sábado, 26 de março de 2016

o País do Mi Mi Mi

Para os leitores deste blog, fiéis ou eventuais, uma pergunta para abrir este post: o que tem em comum o Dr House e Bernardinho?
Estava assistindo a semifinal da Superliga de Vôlei (um sãopaulino deve procurar por outros esportes ou outros campeonatos para seguir): de um lado, o Osasco e do outro, o Rio de Janeiro. Osasco com meia seleção brasileira, e o time do Bernardinho, que sempre acaba levando o título. Parecia que neste ano seria diferente: o Osasco é um time mais maduro e alto, o time de Bernardinho tem muitas meninas. Eu moro em Cotia, então vai, Osasco! “Ganhamos” o primeiro jogo. Se Osasco ganhasse o segundo jogo, estaria na final. Ganhou o primeiro set. Agora vai. Comecei a tremer quando via o comportamento dos dois técnicos: o carequinha do Osasco calmo, ponderado, traçando as saídas táticas. Bernardinho espumando, puxando a própria gola da camisa polo (atenção senhores marqueteiros de moda masculina: uma camisa polo que resiste ao Bernardinho tem que ganhar o mercado. Basta de comerciais de seguros de casa. Bernardinho tem que vender moda masculina). Logo percebi onde iria dar. O Rio de Janeiro virou o jogo e meteu 3 a 1 no Osasco. E o carequinha afundou calmo e racional até a última bola.
Dr House passa as 8 temporadas de sua série humilhando, achincalhando e torturando a sua equipe de todas as formas. Durante a série, um de seus assistentes se suicidou e outra morreu com uma interação medicamentosa que levou seu coração à falência. Seu melhor amigo, Wilson, termina a série com um Câncer terminal. House também destruiu a sala de sua ex namorada, Cuddy, com o seu carro, em uma crise de ciúmes. Ser colaborador, amigo ou amante do Dr Gregory House é tão ruim como ser próximo do Lula.
Bernardinho e House treinam a sua equipe para um estado de Atenção Plena. Mas não é uma atenção relaxada, como da meditação. É uma atenção tensa, no fio da navalha, que inclui o medo de perder, de errar ou de tomar um berro enlouquecido na sua orelha. Nesta época do politicamente correto, onde todos são vítimas ou precisam ter a sua autoestima massageada, nesta sarabanda de pós feministas, igualdade de gêneros e cross dressers, temos que aceitar todo tipo de choradeira que impede as pessoas de simplesmente cumprir as suas tarefas e entregar o que foi pedido. Precisamos de Bernardinhos e de Houses em todos os redutos de autocomiseração. Atenção, senhoras e senhores! Quem espera que a empresa, o Estado ou a fantástica fábrica de imbecis patrocinadas pelo governo (?) do PT venha te ajudar, dar oportunidade ou reconhecer os seus direitos, prepare-se para bons anos de desemprego, choro e ranger de dentes.
Em épocas de crise, como essa que lançou a ex oitava Economia do mundo ao Inferno, o estado de Atenção Plena e de Prontidão, que são impostos por Bernardinhos e Houses, produz mais sobreviventes e mais pessoas aptas a atravessar a tempestade. De todos os fantásticos prejuízos da barbárie petistóide, talvez o mais espetacular foi ter lançado o país num lodaçal de autopiedade e autoindulgência. Todos são coitadinhos e todos são vítimas da situação. E culpado, sempre, sempre é o outro. No caso, nós, os golpistas. Ninguém responde pelos seus erros colossais. O inferno é sempre o Outro. Ou o Inferno é sempre um infinito Mi Mi Mi.

domingo, 20 de março de 2016

Linchamento Virtual

Na metade final dos anos noventa, o homem mais poderoso do mundo, o presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, envolveu-se com uma menina de vinte e poucos anos que era estagiária na Casa Branca. O seu nome era Mônica Lewinsky, que teve a sua vida devastada pela exposição de sua intimidade em tempo real, fornecendo detalhes gráficos sobre onde como e quantas vezes fez favores sexuais ao seu chefe, dentro do coração do poder do Império Americano. Mônica pode ter mudado para pior a história da humanidade. A revelação de seu caso enfraqueceu e colocou nas cordas a gestão de Clinton e certamente colaborou para a eleição de George W. Bush, uma das figuras mais minúsculas a prestar juramento como presidente americano. Pode-se dizer que ela influenciou até o que acontece agora no Brasil, pois foi na presidência de George W. que foi inaugurado o estilo - “ Eu faço qualquer coisa que me der na telha e meus marqueteiros dão um jeito depois”. O desprezo pela opinião pública, a manipulação do medo e do ódio de pessoas culturalmente mais simplórias e a ordem de encher os bolsos, mesmo que o preço seja quebrar o país fez escola, a escola da putaria generalizada, que terminou com a quebra americana em 2008 e a crie mundial que Lula chamou de “marolinha”. Essa escola aparece nas revelações da Lava Jato. Um dos poucos políticos presos nos escândalos tupiniquins disse a frase síntese de nosso momento histórico: “O PT exagerou no roubo”. Essa frase enseja que, até para a roubalheira e a putaria há limites. Um mínimo de decoro, ou de proporção.
Quase vinte anos depois, a jovem estagiária que teve um caso com o chefe e mudou o rumo da história reaparece e dá finalmente a sua parte da narrativa. Mônica Lewinsky retorna uma mulher em seus quarenta anos, bem diferente da pós adolescente cheinha, de bochechas rosadas, que aparecia em modelitos duvidosos nas fotos da imprensa marrom. Uma mulher bonita e com as frases bem ensaiadas para colocar seu ponto de vista. Ela amadureceu bem e finalmente analisa, em uma aula que está no TED.com, a sua experiência como “Paciente Zero” da era de linchamento moral trazida pela internet. Uma menina de pouco mais de vinte anos recebia mensagens onde era chamada de “Vaca”, “Puta”, “Vagabunda” e todos os adjetivos do gênero, que não são difíceis de se imaginar. Durante um bom tempo tomava banho e usava o banheiro na presença de sua mãe, já que seu risco suicida era bastante considerável. Ela teve o suporte de uma família estruturada e amorosa e uma equipe de médicos e terapeutas que a ajudaram a reconstruir a vida longe dos holofotes da mídia carniceira. Muitos não tiveram a mesma sorte. Em sua aula ela lembra de um rapaz de uma universidade que foi filmado transando na cama com seu namorado e, após o vídeo postado em redes sociais pelo colega de quarto, atirou-se de uma ponte no rio gelado, pondo fim ao linchamento virtual que estava sofrendo.
Já coloquei aqui, inclusive neste post, minha posição com relação à atual crise política brasileira. Segundo um jornal Inglês, uma crise surrealista mesmo para padrões brasileiros. Mas não posso deixar de registrar a minha náusea diante da divulgação de conversas privadas de Lula e sua família. Em tempos de linchamento virtual, a exposição da intimidade das pessoas à infâmia e à execração pública é uma arma política e de propaganda no mínimo temerária, pelo seu peso e pelo precedente que se abre. Já escrevi isso antes e repito: em conversas particulares somos injustos, falamos besteiras que não repetiríamos em público, falamos mal de quem gostamos e fazemos fofoca pelo prazer da maledicência. Colocar uma conversa privada para o mundo ver é uma forma de tortura usada pela polícia secreta de países da Cortina de Ferro. Isso está errado e precisa parar.
Nelson Rodrigues disse: “Quem dera os homens de bem tivessem a ousadia dos canalhas”. Pois eu diria que a ousadia dos canalhas não orna nas mãos de homens de bem.

domingo, 13 de março de 2016

A Mão do Artista

Chegou à consulta desesperada: tinha certeza que estava iniciando uma Demência, como a personagem Alice do filme, parada na esquina de uma rua conhecida sem conseguir achar o caminho de casa após a sua corrida. Como Alice, ela passava de seu quarto à cozinha e ficava olhando para a geladeira sem conseguir lembrar o que tinha ido fazer lá. O processo para se aprontar era quase infinito, porque interrompido dezenas de vezes para checar o celular, arrumar a almofada ou procurar por alguma coisa perdida que já não lembra o que é. Ela não percebe, mas a sua verdadeira dificuldade é de manter a Atenção às mínimas tarefas do seu dia a dia e concluí-las. A vida vira um caos se a capacidade de iniciar, perfazer e concluir as tarefas se perde, ou nunca se desenvolve.
As pessoas se queixam cada vez mais de problemas com sua Memória, quando na verdade estão perdendo a sua capacidade de Atenção. Temos dois tipos de Atenção: Focal e Difusa. A primeira, como o nome já diz, se relaciona com a capacidade de manter a atenção em determinado estímulo ou tarefa até conseguir concluí-la. A difusa funciona como uma espécie de radar que avalia o ambiente quase 360 graus, percebendo movimentos na visão periférica ou alguém sussurrando o seu nome no meio de uma infinidade de ruídos. Pessoas hiperfocadas em seus objetivos e tarefas perdem a visão do que está acontecendo à sua volta, assim como pessoas completamente desfocadas não conseguem concluir as tarefas mais simples, como no caso descrito acima.
Durante uma cirurgia, o cirurgião precisa das duas atenções operando juntas e separadas ao mesmo tempo, num balé complexo de relações. O hiperfoco tem que estar no ato cirúrgico em si: a abertura dos tecidos, a localização espacial das estruturas e do reparo que deve ser feito, a velocidade das manobras e das suturas. Tudo isso já seria bastante serviço, mas não é suficiente. É preciso estar atento aos auxiliares e pedir que os movimentos se encaixem com eficiência, além de atentar aos dados que são passados atrás dos campos pelo anestesista. Tudo isso precisa se encaixar no plano cirúrgico para produzir o menor dano e os melhores resultados. No seriado do canal Sony “Code Black”, sobre o cotidiano de um Pronto Socorro em Los Angeles, o cirurgião chefe adverte o seu aluno, que se sente perseguido e injustiçado. Quando parte para o confronto, fica de queixo caído, pois o chefe arrogante explica que está tentando, na verdade, transformá-lo num artista, não num pedreiro. Chegando do Pronto Socorro, esse aprendiz sabe ser rápido e eficaz, mas opera de forma grosseira. O chefe quer ensiná-lo a sentir a cirurgia como um violinista dedilhando a sua música, não uma cozinheira cortando seus bifes.
Vivemos num mundo onde mesmo os pedreiros não sabem fazer o seu serviço, quanto mais pensam em fazer as tarefas com arte. Não saber direcionar nem modular as capacidades de Atenção é uma tragédia moderna que afeta muitas pessoas, como a presidente Dilma, por exemplo. Suas frases desconexas, as citações erradas e tresloucadas, os coices endereçados a seus auxiliares e ministros, e, sobretudo a incapacidade de avaliação das situações dentro de um contexto amplo para escolher o melhor caminho, criaram os resultados que levaram milhões de brasileiros às ruas no dia de hoje. Como no livro “Foco”, de Daniel Goleman, temos que ser artistas para manter o foco em nossas tarefas, perceber as pessoas à nossa volta que possam ajudar ou pelo menos não atrapalhar e sentir o que está acontecendo no mundo, no mercado, na comunidade que nos acolhe. Foco em si, foco nos outros e no mundo. Isso cria os verdadeiros artistas ou a sua falta destrói projetos e vidas.
E a paciente do início deste post? Depois de um longo trabalho e do ajuste da medicação, aprendeu a se manter dentro de uma tarefa de cada vez e nunca interromper o que está fazendo se não tiver algo urgente ou muito importante. Ela não virou uma artista nem uma autora da sua vida, mas, se trabalhasse como uma pedreira, saberia preparar uma boa massa e assentar bem os tijolos de sua vida. Com o tempo que ganhou, pode voltar a fazer exercícios e organizar melhor o seu dia. O celular fica escondido na bolsa e o motivo que a fazia procrastinar o sair de casa, que era uma extrema desmotivação com o próprio trabalho, foi elaborado. A sua Memória melhorou muito e ela não sente mais medo de correr na rua e não achar mais o caminho de casa. Ela está atenta ao mundo exterior ou, melhor ainda, está atenta ao seu próprio Mundo Interno, que ela nem sabia que existia.

domingo, 6 de março de 2016

Lula Lá e os Quarenta Ladrões

Este blog fala sobre diversos assuntos, até Psiquiatria, de vez em quando. Fiz um post pseudo machista uns dois Domingos atrás, foi um sucesso, maior número de page views e comentários. Mas não continuo provocando polêmica para gerar ibope. Hoje vou falar de Política, porque não dá para ignorar as panelas batendo. Não é meu assunto preferido neste espaço, mas vou ter que me colocar.
Jung foi (e é) chamado de antissemita por muito tempo. Seja por ter discordado de Freud, que lhe valeu a expulsão das hostes psicanalíticas, seja pela manipulação de alguns de seus escritos, ou por ter presidido uma instituição psicológica em tempos de Nazismo, Jung teve vários seguidores e amigo de origem judaica e no final da vida ficou fatigado de rebater a acusação e deixava cada um tirar as próprias conclusões.
O que ele deixou de dizer em sua defesa foi o seu papel secreto e interessante de “analista” de Hitler para o Serviço Secreto inglês. A psicopatia, a identificação delirante com a sua figura messiânica, a incapacidade de analisar e reconhecer os próprios erros, todos esses traços que levaram o Nazismo à derrocada foram apontados e traçados por Jung, que ajudava os aliados a entender e manipular a psique nazista. E tem gente que até hoje bate na tecla de que o psiquiatra suíço era simpatizante do Nazismo.
Lula não é Hitler, mas compartilha de alguns de seus erros. Sobretudo o de se identificar demais com o personagem político criado por ele ou para ele. Lula virou um arquétipo. No processo, incorporou virtudes messiânicas. Ele é o defensor dos pobres, o Robin Hood que tira dos ricos e dá, não para os pobres, mas para um Estado gigantesco e, cada vez mais, corrupto e corruptor. O roubo é santificado pela intenção de proteger os desprotegidos. Lula avaliou mal as suas possibilidades e a força de sua vontade. Ele decretou que haveria crescimento, que a fome seria zero, que a crise mundial era uma marolinha. Ele parecia dobrar a Realidade à sua vontade. Ele poderia até eleger um poste chamado Dilma Roussef que nada conseguiria derrubá-lo. Seus inimigos diziam que ele era feito de teflon, pois nada grudava nele. Como outros caudilhos, achou que seria eterno.
A guerra que se trava agora não é sobre ideias, nem projetos para nosso país. A guerra é sobre símbolos. Quem domina os símbolos e consegue gerar visões a partir deles, domina também corações e mentes. É por isso que tem tanta gente falando groselha nessa luta pelo domínio simbólico. Parece uma guerra de retardados. Lula é o defensor dos pobres e está sendo perseguido pelos coxinhas que não perdoam seu sucesso na vida. O PT é um covil de ladrões e uma Organização Criminosa que pretende se apropriar do Estado. E todo petista é ladrão (tenho um amigo petista que brinca sentir saudade quando era chamado de comuna e baderneiro. Era melhor que ladrão). Nota do autor: uma minoria de petistas cometeram atos ilícitos. E discordar do PT não significa ser um coxinha alienado.
Vou colocar meu próprio mito na brincadeira. O ciclo petista se esgotou, política, ideológica e, sobretudo, economicamente. O melhor para o petismo teria sido perder a eleição para o Aécio, que estaria agora tentando descascar o gigantesco abacaxi plantado por Dilma e Mantega. Agora Dilma vive as pragas do Egito caindo na sua cabeça. Zica Vírus, Dengue, Recessão, Impeachment, Inflação, Eduardo Cunha, Desarticulação Política, Caos Econômico, Bonecos Pixulecos, Operação Lavajato, são tantas pragas que dava para ter muita inveja do Faraó Egípcio, que tinha que lidar “só” com dez pragas bíblicas. Deve ser por isso que “Os Dez Mandamentos” virou sucesso como novela e filme. Os bispos da Record tiveram a sacada. As pragas sempre simbolizaram para mim o que acontece com um Ego apegado às suas pseudo verdades, recusando o confronto com o Real. Se alguém nega o Real acaba sendo atropelado por ele. Sejam faraós ou governantes.
Lula tenta ressuscitar a sua força messiânica. Vai viajar pelo país bradando ser a vítima das elites. Marx dizia que a história se repete como farsa ou como tragédia. Muita gente tenta se agarrar na farsa. Mas o povo que acreditou na fábula que todos ascenderiam para o paraíso do consumo, agora se bate na tragédia dos preços disparando nas gôndolas do supermercado. Esse é um símbolo difícil de disfarçar.