terça-feira, 11 de maio de 2010

Dúvida, Insegurança, Hesitação

Há alguns meses atendi uma moça com um quadro de manejo extremamente difícil: após um longo período de Depressão, que chegou a causar a sua demissão, apresentava um quadro de Fobia a praticamente todos os estímulos externos. Tinha medo de sair de casa, medo do tratamento, medo de ler notícias trágicas, portanto tomava distância do noticiário, de revistas e de sua participação no mundo. Óbvio que este medo também se estendia aos medicamentos que poderiam aliviá-lo, com reações extremas a qualquer mudança de dose. Outra característica, talvez a mais sofrida, era a sua incapacidade de tomar as decisões mais simples, ficando sempre presa entre alternativas cuja decisão não tomaria mais de alguns segundos quando ela estava "normal". Após uma desadaptação já esperada aos medicamentos tentados, mesmo com a orientação sobre a natureza traiçoeira de seus sintomas fóbicos, ela acabou desistindo do tratamento. Espero que tenha encontrado alívio em outro serviço, mas não tenho tanta certeza sobre isso. Não é a primeira vez que um tratamento se interrompe assim, embora seja sempre doloroso. A parte mais frustrante é perceber que a doença cria uma espécie de círculo do medo em torno do paciente que, como um bicho ferido, morde a mão de quem tenta se aproximar e ajudar.Em alguns casos, parece que a pessoa fica dependente da angústia e do medo, como alguém que assiste muitos filmes de terror porque "é gostoso ter medo". Existe uma região de nosso Sistema Nervoso implicada em nossa capacidade de tomar iniciativas e explorar o ambiente. Outra região próxima (ambas próximas de estruturas subcorticais chamadas Gânglios da Base) cuida do processamento de informações menos importantes, funcionando como um radar para situações não usuais. É como um sistema de alarme. Muitas situações em nossa vida deixam esse sistema de alarme em atividade excessiva, gerando uma dificuldade de diferenciar situações de perigo real e imaginário. Quando esse sistema se desbalança, temos pessoas permanentemente assustadas, angustiadas, esperando que algo de ruim aconteça imediatamente. Como a minha ex paciente, não se consegue mais distinguir a mão que afaga da que fere e sai furtiva, como dizia Frejat. O trabalho de recuperação desses microtraumas e medos reverberantes passa por medicamentos, sim, e com a conquista da participação do paciente para dia após dia recuperar a sua confiança em si e na vida. Isso passa, sempre, pelo enfrentamento desses medos e dessa falta de confiança. Esse pedaço, obviamente, não é fácil. Muitas vezes, portanto, as dúvidas insolúveis, a insegurança paralisante e a hesitação para tomar as menores decisões são sinais de esgotamento e desbalanço dessas regiões do Cérebro e tem tratamento, embora muitas vezes longos e com resultados iniciais desanimadores. Cabe ao médico orientar bem o paciente nessa jornada, para que o mesmo não sucumba ao desânimo. Assim podemos colher resultados cada vez mais animadores em nossa prática.

Um comentário:

  1. Com certeza vale à pena a paciência ....
    Quantas vezes me senti profundamente desamparada ....
    Mas seja qual for a FÉ ou qq outro tipo de Apoio que o paciente tiver , vai ajudar nos momentos de desespero.
    No meu caso sempre apelei ao Espírito Santo .
    Ou muitas vezes ao grande filósofo Nietsch(?) : " Tudo que nāo me mata , me torna mais forte".
    Certamente um profissional competente e íntegro é imprescindível para o tratamento e acolhimento do paciente.

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