domingo, 8 de fevereiro de 2015

Stay Hungry, Stay Foolish

Recapitulando os dois últimos posts desse mal teclado blog, o assunto foi o discurso de Steve Jobs em Stanford. Já fiz meus comentários sobre o expositor e o exposto e, sem propaganda indevida, sugiro ao leitor ou leitora incautos que adentraram esse blog agora, propositalmente ou não, que deem uma passada de olhos nos dois últimos textos. Por que o autor dessas linhas dominicais gosta tanto desse discurso? Tenho a impressão que nessa apresentação curta, Steve Jobs dividiu em três momentos, ou fases, de nossa odisséia humana, mesmo sem ter tido a intenção de fazê-lo. Eu dividiria essas fases em três arquétipos principais: A Ferida, A Jornada Noturna e o Significado.
A primeira pequena história é sobre a epopeia da Infância, que desde tio Sigmund sabemos, um período desagradável de nossa vida. Steve Jobs descreve impassível a brincadeira do destino com o seu nascimento; foi recusado por sua mãe biológica, que o deu para adoção e pelo primeiro casal da lista, que na última hora preferiu trocá-lo por uma menina em bom estado. Terminou aos cuidados de um casal muito simples e amoroso que fez muito sacrifício para criá-lo. E não deve ter sido muito fácil, mesmo.
Steve Jobs nunca fez as coisas que idealizou. Sempre colocou gente talentosa e disponível a trabalho semi escravo para materializar os seus projetos. A sua juventude coincide com a fundação da Apple, a luta para sua sobrevivência como companhia e a criação de um destino heroico, como Édipo, que foi abandonado por seu pai para ser criado por pastores e pessoas muito simples e procurou suplantar a sua dor com uma inteligência muito superior. Édipo, digo, Jobs, suplantou as dores da passagem de infância, adolescência e pós adolescência tornando-se um milionário dono de uma empresa de computadores e visando, antes de tudo, mudar o mundo. Para isso, usou (e abusou) de uma Inteligência e Visão bem adiante de seu tempo. E o mundo mudou. Bastante, aliás. A sua trajetória de Herói Ferido culminou com o tema de nosso último post, a Tijolada, quando foi demitido de sua própria empresa e afastado de seu comando. Atordoado, passou alguns anos longe de seu bebê, a Apple, procurando por um caminho para voltar para o jogo. Ganhou muito dinheiro, continuou tentando mudar o mundo, mas passou esses anos andando no escuro, numa Jornada Noturna, sem saber o que procurava e para onde estava indo. Só sabia que precisava seguir andando, passo após passo, na direção que a sua Intuição mandava. Jung passou por uma profunda Depressão quando tomou a sua tijolada, sendo expulso da Psiquiatria por Bleuler e da Psicanálise por Freud. Passou alguns anos estudando textos ininteligíveis de Alquimia e vários outros livros empoeirados, até começar a entender o que estava descobrindo e legando em sua imensa obra. Foi a sua Jornada Noturna.
Recapitulamos então: A Ferida, A Tijolada, A Jornada Noturna. Por fim, a última jornada, a Morte.
Steve Jobs falou sobre a Morte em perspectiva. Na época, tinha recebido o diagnóstico recente de um tipo de Câncer raro de Pâncreas. Não era de um tipo particularmente letal de Câncer de Pâncreas, que costumam ser muito agressivos e letais. Na época ele se sentia curado. Infelizmente, a doença recidivou alguns anos depois em seu Fígado e a evolução da doença levou à sua morte, como sabemos.
Jobs falou da morte como uma grande invenção da natureza, pois ela permite que o novo suceda o velho e que as ideias avancem, sem os impedimentos dos poderosos que, como qualquer outro ser humano, acabam morrendo. A Morte permite a Renovação de nosso DNA e de nossa Psique Humana.
Jobs alertou que não havia como se revestir de autoimportância já que, diante da morte, já estamos todos nús. Não há também motivo para viver uma vida mentirosa, já que temos um tempo limitado para seguir viagem.
Gosto muito da descrição de Dumbledore para Harry Potter, que havia sido morto por Lord Voldemort e o local de passagem era uma estação londrina de trem. Essa cena é do último livro e filme da saga. Harry perguntou ao mestre: como era morrer, afinal? Havia algo que pudesse ser feito, ou alguma tarefa a se cumprir? Dumbledore, o Velho Sábio, falou para Harry que a Morte era simplesmente, seguir caminho, seguir o trem sem olhar para trás.
Steve Jobs terminou seu discurso citando uma frase de uma revista hippie de sua época “Stay hungry, stay foolish”, em tradução livre: “Continue faminto, continue sem saber”. Tomara que essa seja a minha estação de trem, quando vou encontrar o Velho Mestre, que vai me aconselhar a continuar aprendendo, e seguir viagem sem me levar muito a sério. Esse é um bom Significado para a Morte.

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