segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Sintonia Fina Emocional

Uma palavra mágica hoje nas terapias comportamentais é Regulação Emocional, e isso tem bons motivos. A primeira vantagem do termo é substituir a fantasia de Controle. Muita gente chega em terapia com a queixa: “Eu não consigo me controlar”. Isso deriva de décadas de observações do tipo: “Controle-se; Calma!; Engole o choro”. Os Afetos e as Emoções são animais ariscos, e quando alguém tenta controlá-los ou engoli-los, os resultados não costumam ser bons. E olha que tem uma grande parcela da humanidade tentando. Tem um ditado oriental que diz: “Você quer controlar o seu rebanho? Dê um pasto grande para ele”. Esse é um ótimo ditado para nossas Emoções e Sentimentos: eles dão menos coices se encontram um espaço interno de desenvolvimento. Um espaço para serem observados, cuidados, de preferência alimentados, para que não sejam animais no cativeiro. Nossa cultura darwiniana pode muitas vezes entender sentimentos como fraquezas; a funcionária “espanou”, o gerente “surtou”, fulano “não dá conta”. Sentimentos são pontos fracos a serem controlados, e tome ansiolíticos e indutores de sono para aguentar o tranco.
Outro aspecto do lidar com os afetos é a cegueira emocional. Muitos chefes focados apenas em resultados estão perdendo seus empregos, não porque as empresas se incomodem tanto assim com os maus tratos, mas antes pelo aumento de custos de processos de assédio moral que estão começando a receber. E os caras tem razão de reclamar quando demitidos: na hora da cobrança e da pressão, o que vale são os números, na hora da demissão, você deveria ter sido mais humano com as pessoas? Não é incomum que chefes não se lembrem ou não consigam notar a sua própria rispidez, ou ter gritado durante uma reunião. A cegueira emocional não permite perceber as alterações no seu próprio estado de humor ou o impacto das palavras nos olhos das pessoas. A cultura do “Apenas faça!”gera prejuízos humanos, recalls e contabilidade criativa, o que já levou empresas grandes à quebradeira. Investir em Atenção e Regulação Emocional gera lucro pessoal e coletivo. Mas como regular afetos?
O primeiro passo já foi mencionado: um bom jeito de regular afetos é percebendo-os em mim e no outro. Dar espaço não significa fazer reuniões em que todo mundo dê gritos primais ou esmurre travesseiros, nem chore gritando pela mamãe. Dar espaço é dar validação aos sentimentos. Tem uma cena no filme da Pixar já tão mencionado nesse blog, Divertida Mente, em que a Tristeza se aproxima de Bing Bong, o amigo imaginário da menina Riley. Ele começa a lembrar de como era divertido ser o amiguinho daquela menina alegre e amada. A Tristeza, para desespero da chatinha Alegria, vai dando validação para os sentimentos de luto e saudade da época em que Bing Bong era uma figura central na Psique de Riley. Bing Bong chora lágrimas de balas e caramelos. Após manifestar e ter seu choro validado, ele “enxuga” as lágrimas e volta para a jornada. A Alegria pergunta para a Tristeza: “Como você fez isso?”. A dona Tristeza responde: “Eu só deixei ele falar”.
Vivemos numa ditadura da Alegria que torna a modulação de afetos uma tarefa e tanto: as mães querem que a infância seja um paraíso de brincadeiras e boas lembranças, evitando o grande vilão que espreita todas as cabeças maternas, e que não está no Divertida Mente: o espectro do Trauma. Nenhuma criança pode sofrer traumas, a infância tem que ser um oásis de alegrias e divertimento. Isso gera outra consequência futura, que é muita gente não querer virar gente grande por medo da terrível responsabilidade. Ou dos trancos que a vida dá em todo mundo. Se eu não crescer, não sofrerei traumas. Esse é o trauma por medo do trauma.
Na vida corporativa, temos outro fantasma, a Motivação: funcionários tristes ou insatisfeitos ganham a pecha de desmotivados, ou, pior, criadores de problemas. Não dão conta. Em tempos de degola de empregos, como os atuais, isso pode fazer muita diferença. Nos feedbacks, a palavra de ordem: “Você precisa se controlar”.
Regular emoções é antes de tudo, lidar com elas.Envolve identificá-las, manifestá-las, elaborá-las. Vamos precisar disso em família, no trabalho, nas relações. Como tudo o que propomos, é mais fácil falar do que fazer. Mas para fazer é preciso praticar. A partir de aqui e agora.

2 comentários:

  1. caramba, Dr., um texto melhor que o outro..obrigado por posta-los...de fato, essa é uma ficha que está começando a cair para mim agora: a importância do reconhecimento e do acolhimento daquilo que desejo expurgar.

    abs

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  2. É a ditadura do "tudo lindo e maravilhoso". Com se a vida fosse o facebook. Mas como ouvi outro dia, o filósofo Cortela dizer: os jovens estão chegando ao trabalho bem-preparados mas mal-educados. Talvez porque foram criados para não terem traumas e conflitos.
    bjos,
    Lucia

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