terça-feira, 15 de novembro de 2016

O Gorila de Laquê

Foi nos anos setenta que Paul MacLean descreveu a teoria do Cérebro Trino. Ele repetiria as fases da Evolução: seria como camadas que foram se sobrepondo e crescendo uma encima da outra. A camada de baixo seria um Cérebro Reptiliano, responsável pelo comportamento reflexo e os instintos mais básicos de sobrevivência. Mais acima tem o Cérebro de Paleomamífero, responsável por nossas reações emocionais mais primitivas, como o Medo, a Raiva, a Ferocidade para matar a presa, trucidar o inimigo, defender o próprio território. A terceira camada, a última que envolve as outras duas como a cobertura de um sundae é o Neocortex, o Cérebro Racional, capaz de moderar a resposta emocional, processar sentimentos mais complexos, planejar, executar e avaliar o resultado de determinado ato ou comportamento. Pode-se dizer que a história humana traduz uma luta permanente para harmonizar esses três bichos que habitam e lutam pela primazia de nosso comportamento e emoções.
Os hominídeos primitivos já carregavam os seus doentes, não abandonavam os velhos e mais fracos e homenageavam seus mortos. Preferencialmente evitavam devorar as crias de seus inimigos. Sentimentos mais complexos de compaixão, respeito hierárquico e cuidado com o grupo permitiram aos pouco promissores hominídeos sobreviverem em um mundo cheio de predadores maiores, mais fortes e mais rápidos que eles, até que a criação de ferramentas e o domínio da agricultura permitiu ao Homo sapiens dominar o planeta. A capacidade de sobrevivência como grupo foi determinante nessa jornada evolutiva.
Lembro de uma cena de um documentário B, desses que se seguiram ao sucesso do “Quem somos Nós?”, lá pelos meados da década passada, onde os realizadores perguntavam para pessoas com diferentes crenças espirituais para onde estava indo nosso mundo e a vida inteligente desse planeta. No post anterior, lembrei da capacidade adquirida há sessenta anos do homem aniquilar a vida nesse planeta. Para onde estamos indo? Uma senhora que era uma espécie de guia espiritual respondeu fazendo um movimento com suas mãos, que faziam uma curva para cima e se encontravam, para depois se afastarem para cima, como um caminho que se afunila e se fecha para depois se abrir como uma flor. O entrevistador perguntou o que aquilo significava, ela respondeu que em vários setores há um afunilamento, como se o mundo estivesse caminhando para um beco sem saída; toda a angústia, a sensação de falta de sentido e de infelicidade da vida moderna confluía para aquele ponto. Mas a velha sábia também enxergava um movimento simultâneo de abertura para uma realidade mais ampla e para um salto coletivo de Consciência, onde a selvageria e a tormenta interna do homem moderno iria finalmente se transformar em outro padrão.
A análise mais interessante que ouvi sobre a vitória do Paleo primata Donald Trump, eleito para ser o homem mais poderoso do planeta, coloca que aquela figura ridícula soube usar como ninguém as Redes Sociais na construção de sua vitória. Foi uma campanha baseada num instrumento muito comum da vida internauta, que é a Trollagem, um termo derivado dos monstros da mitologia celta e de Tolkien no “Senhor dos Anéis” que são os Trolls, monstros deformados que destroem tudo o que passa na sua frente. Trump trollou a tudo e a todos, disparando insultos contra minorias, imigrantes, mulheres e chineses. Foi o segundo grande movimento de retrocesso contra o mundo globalizad: antes disso o povo inglês também votou de forma apertada pelo Brexit, a saída da Inglaterra da Comunidade Européia. Trump promete levantar um muro para proteger os americanos das invasões bárbaras. Ele se valeu dos instintos mais básicos de nosso Cérebro Reptiliano e Paleoprimata: territorialidade, xenofobia, ferocidade, dominância. A trollagem exclui o diálogo e não permite nenhuma forma de debate.
Lembrei da velha xamã mostrando o movimento de estrangulamento seguido de uma abertura. Foi a única coisa que me fez sorrir nesse céu de tempestade.

Um comentário:

  1. o título foi muito feliz...eu li essa descrição do cérebro no livro do Dr. David Schreiber...

    vamos aguardar...tenho a impressão de que a retórica de campanha é bem mais sinistra do que a realidade permite :)

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