sábado, 7 de janeiro de 2017

Diariamente

Freud dividiu a Psique humana em três grandes módulos de funcionamento: Ego, Superego e Id. Vou começar pelo último.
O Id seria hoje nosso Subcortex, nosso Cérebro mais primitivo que garante a sobrevivência e a satisfação de nossas pulsões básicas: comer, beber, território, abrigo, acasalamento. Qualquer coisa que ameace a satisfação dessas necessidades pode gerar desequilíbrio, seja em sintomas, em doenças ou explosões coletivas de selvageria. Vivemos de certa forma a videogamização do Id. Nas telas dos celulares, tablets e tvs temos a liberação das pulsões primitivas, como violência, luta por territórios, pornografia e todas as epidemias de Id liberado que tornam realidade e mundo virtual cada vez mais semelhantes e confusos na cabeça de pessoas mais vulneráveis.
Freud descreveu também outro mecanismo importante para lidar com os riscos, que é a Negação. Só através da Negação conseguimos esquecer ou excluir da Consciência que sair de casa pode ser um risco para a vida: podemos sofrer um acidente, um sequestro relâmpago ou sermos alvos de um atirador com uma pistola automática que acordou de mau humor. A Negação permite que deixemos a percepção dos riscos fora do campo de Consciência, para o Ego tomar conta das tarefas do dia.
O Superego, por sua vez, é o censor, o chefe do setor de Controle que impede a maioria de nós de matar o chefe, empurrar o adversário pela janela ou tentar aproximação sexual arrastando as fêmeas para as cavernas. Ou para estupros coletivos.
Nosso tempo de hipermídia criou o mundo do Id, sobretudo as redes sociais: cada um acha que pode manifestar seus desejos e fantasias sem a mediação do Superego: pode-se insultar pessoas, denegrir imagens e maldizer seres humanos que vão perdendo exatamente a sua característica humana: viram personagens de Game of Thrones ou alvos de videogames como GTA, onde o jogador pode atropelar mendigos, espancar mulheres ou matar policiais sem nenhum tipo de controle ou consequência.
Nosso ano começou com um homem matando a família da ex, a ex , o seu filho e a si próprio na noite de Reveillon. Massacres em presídios, com homens jogando futebol com a cabeça dos inimigos decapitados. Um militar americano atirou em pessoas desconhecidas no Aeroporto da Flórida, deixando mortos e feridos nas esteiras de bagagens.
Passamos por tudo isso com nossos velhos sistemas de Negação ativados. Bandido bom é bandido morto, malucos saem atirando por aí e não tenho nada com isso. A melhor de todas as negações é imaginar que isso tudo fica preso dentro das telas de tv e computador, minha vida não tem nada com essas cenas.
A Negação produz a apatia com que constatamos o terror e seguimos com a vida, imaginando que esses seres apartados da sociedade, como terroristas e presidiários, precisem ser eliminados mesmo para não atrapalhar nossos sonhos de consumo.
Estamos bombardeados e hiperestimulados em nossos neurônios primitivos. Está na hora de reagir contra isso. Orientar os mais sugestionáveis e vulneráveis, como crianças e adolescentes, sobre o risco e o veneno dessas imagens e dos estímulos. Colocar o bom e velho Ego no comando, escolhendo o que ver, o que comer e beber, como lidar e evitar a embriaguez das imagens violentas. E, sobretudo, não falar para as crianças que as pessoas decapitadas em presídios tinham mais é que morrer mesmo. Essa violência não vai ficar presa lá dentro. Como uma epidemia, as catarses do Id vão sair de lá e atacar a todos.
É importante criar uma cultura de paz, dentro de casa, no trabalho, no trânsito, na mesa, no bar. A cultura da violência aliena as pessoas da própria humanidade. Faz pessoas sem antecedentes cometerem crimes nauseantes e depois dizer: não sei o que deu em mim.
Sofremos mais com a família de Campinas chacinada do que com os presidiários decapitados. Talvez seja uma boa hora para desligar a Negação e perceber que ambos fazem parte da mesma epidemia de ódio. E o ódio é contagioso. A vacina é o respeito. E precisa de muitas doses, diariamente.

6 comentários:

  1. Nossa !! Dr. Spinelli, emocionante .!!! Bjs

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  2. Dr Marco desculpe estar usando essa emocionante história pra fazer uma pergunta mas se cheguei até aqui....
    Faz uns anos publicou uma matéria sobre a Anvisa e atuação com anfetaminas. NA época falava do milagroso flor da índia que prenderam quem vendia, etc...Pois como você mesmo citou um dia voltaria...Bingo. Me trato de ansiedade e síndrome do pânico a mais de 10 anos. Basicamente estável com uso contínuo de fluoxetina 40mg dia e frontal 1mg dia. Como também falava do santo Graal de como não engordar numa situação dessa... Obviamente que aos 25 anos com 83 kg fui a 106 kg. Aos 37 pensando em chegar aos 60 anos fechei a boca e consegui baixar a 91. Em 2016 por um certo relaxo fui a 97 e disse pare! Exercícios não faço, fechar a boca não estava adiantando...Achei o dito cujo com outro nome. Resultado, 60 dias e já estou com 89. Não vicia e os resultados são impressionantes mas é ilegal é óbvio que possui na mistura algum veneninho com cara de anfetamina. Mas, tirando a irritabilidade e insônia a energia é impressionante. Perde peso como perder moedas em caça níquel...Pensa ser perigoso? O que noto são batimentos cardíacos a 105 em repouso como mais um dos sintomas mas me sinto bem. Deixo claro que não estou lhe comprometendo em pedir uma indicação, mas sim saber sua opinião anos depois até por talvez ter tido a oportunidade de saber o que causa sucesso nessa fórmula.

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    1. Cara anônima: não posso dar orientação médica pela internet, como dita o Conselho Regional de Medicina. Nunca recomendei esse medicamento, apenas citei a sua existência e a provável associação de algum estimulante na fórmula, pelos seus efeitos que vc está descrevendo. Recomendo que vc faça uso cuidadoso e passe por uma avaliação de um Endocrinologista ou um Clínico Geral para fazer o seu seguimento clínico e metabólico, com um olhar para a parte cardiológica também. Seria ótimo complementar com dieta e exercícios, para qdo vc retirar a medicação. Boa sorte.

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  3. Excelente análise do que estamos vivendo atualmente.....
    bjos,
    Lucia Andrade

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