domingo, 12 de janeiro de 2014

Cristo de Saias

Então cá estamos, eu, o Blog e os leitores, em 2014. Poupei a todos de ensaios junguianos sobre o Natal ou do texto do Borges na virada do ano. Apenas um descanso, em época de grande cansaço que é a reta final do ano.
Não falei do Mito da Natividade, um dos meus preferidos. Nem mencionei que essa época é de grande tensão psíquica. Os terapeutas participam desse momento de tensão, muitas vezes compartilhando o sofrimento. O final do ano é uma travessia, como todas as épocas de transição em nossa vida, e algumas pessoas não conseguem cumpri-la.
Um paciente com uma sólida formação cristã e, particularmente, católica, estava falando sobre candidatos à canonização. Mencionou um ídolo seu, o papa João XXIII e a missionária Dorothy Stang, morta por um matador que lhe pediu desculpas antes de executá-la. Ela mostrou para ele, diante da mira de sua arma, a sua Bíblia amassarocada e respondeu, antes dos tiros, que aquela era a única arma que tinha na vida.
Essa mulher veio aos rincões de nosso injusto país para defender os fracos, os pobres que são como podres, já diria o poeta. A sua arma era a Bíblia e a crença de que fazer o certo, mesmo naquelas paragens onde uma vida custa barato, valia a pena.
Vivemos em um tempo fortemente dominado pelo EU, um EU gigantesco em todas as mídias, em todas as esquinas. Alguns pregadores chegam a mencionar um Jesus que venha trazer prosperidade e capacidade de consumo. Fico ainda hoje, muitos anos depois da morte de Dorothy Stang, marejado com a cena da senhora magricela, num país tão longe do seu, estendendo a Bíblia para o homem que iria tirar a sua vida.
Dei uma entrevista há poucos meses que já mencionei nesse blog, sobre os mitos e as Trindades. Mencionei o personagem principal da trilogia “Matrix”, Neo. Havia tanta Mitologia e tanto Budismo nesses três filmes, mas, no final, o herói consegue derrotar o vilão, Smith, um programa maligno com capacidade infinita de multiplicação e alienação da raça humana, entregando a sua vida para a Matrix. Smith não consegue prever, nem entender, que alguém escolha morrer para salvar a todos. Ele acredita no Individualismo absoluto, e não está sozinho. Neo entregou a sua vida como um herói Crístico.
Não falei de Natal nem de Ano Novo desta vez. Mas começo o ano falando que aquela senhora, morta no interior do Pará, encarnou como ninguém a Consciência Crística. Concordo com o que o homem falou em sua sessão: ela merecia virar santa sem escalas e sem burocracia.

2 comentários:

  1. Spinelli,

    Muito lindo o seu texto!!

    Concordo plenamente com o seu paciente:
    Dorothy Stang deveria ser canonizada.
    Para nós estas pessoas já são santas.

    Um abraço,
    Lucia

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  2. Que bom q vc voltou..Feliz Ano Novo! Kuka

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