domingo, 1 de junho de 2014

Psicologia Positiva

Há alguns anos li uma entrevista na Veja de uma psicóloga que fazia uma reflexão sobre a terrificante experiência de passar pelo tratamento de um Câncer de Mama, incluindo Radio e Quimioterapia. Dentre as inúmeras dificuldades, ela se queixou da tirania do Pensamento Positivo. Não bastava dores, efeitos colaterais e o medo da doença, ela se via bombardeada pela contínua propaganda que, se mantivesse o Pensamento Positivo, tudo daria certo. Podemos concluir que, se as coisas dessem errado, seria obviamente por uma deficiência de Positividade de sua parte. A vantagem de ter espírito crítico e vivência clínica é que ela sabia que haveria dias e momentos de esperança e de angústia, de bons e de maus pensamentos, e que o tal do Pensamento Positivo não impediria complicações e efeitos colaterais.
Uma paciente de 30 anos se desesperava pelo fato de seu irmão caçula fracassar em concursos e entrevistas, quando sempre se apresenta com a mentalidade do “já ganhei”. O moleque entra “mentalizado” em seus pensamentos positivos, com uma fé inabalável em seu sucesso, o que resulta em repetidos fracassos. Ela também já ouviu falar nas virtudes da mentalização positiva, mas estudar para a prova e se preparar para a entrevista costuma dar mais resultados.
Há um movimento bastante consistente e em crescimento na Psicologia, autodenominada Psicologia Positiva. Acho o nome um pouco perigoso, porque vai ser facilmente confundido com o movimento pelo Pensamento Positivo. Elas podem parecer a mesma coisa, mas não são. Para a pessoa que está atravessando a difícil jornada de um tratamento para uma doença grave, ou para um jovem tentando entrar no mercado de trabalho, talvez mais importante do que ter um pensamento positivo com relação aos resultados de sua empreitada, seja bem melhor ter uma atitude paciente e amorosa consigo mesmo e com as pessoas envolvidas no processo. Li um livro de um médico que passou por um tratamento para doença Oncológica que desenvolveu uma atitude amorosa até para o aparelho de Radioterapia, que ele via como um canhão benigno, atacando as células inimigas. Mais do que um pensamento positivo, ele descobriu que uma atitude amorosa contava tanto em seu processo de cura como o de seus pacientes. O nome do livro, para quem se interessar, é “Memória das Células”.
Nossa evolução como espécie teve alguns passos fundamentais. Um deles foi descer das árvores e andar sobre dois pés, o bipedalismo, o que possibilitou o uso das mãos e o uso de instrumentos, com imensas vantagens evolutivas. Isso, entretanto, gerou dificuldades para o parto dos primeiros hominídeos, já que uma cabeça maior tinha que passar por um canal de parto menor. Os bebês humanos precisam de muito tempo de maturação, necessitando de alguns anos de cuidados. Para isso, foi necessário um vínculo mais forte e profundo com as mães e o estabelecimento de alianças entre os machos e as fêmeas para defender a sobrevivência de seu bando. Amor, cuidado e tolerância foi a marca distintiva do que nos torna humanos e nos salvou como espécie.
Como já foi colocado em posts anteriores, somos muito estimulados a viver numa sociedade darwiniana em que os mais aptos prosperam, os não tão aptos são marginalizados. Competir e vencer são marcas de nosso passado evolutivo, onde conquistar territórios fazia muita diferença para um grupo viver ou perecer. É uma bobagem fazer as pessoas viverem nessa selva Paleolítica. A Psicologia Positiva vem em boa hora se estimular a criação de alianças e zonas de comunicação entre nós, descendentes do Homo sapiens. Vivemos hoje oprimidos entre o medo de sermos atacados por nossos semelhantes e outros predadores e a necessidade de construção de alianças e de uma cultura de não agressão. Não vai ser nada fácil, com tanta ênfase e lucro da Cultura do Eu, que os sentimentos positivos prevaleçam. Podemos esperar muitas lágrimas no percurso.

Nenhum comentário:

Postar um comentário