domingo, 14 de setembro de 2014

O Sorriso (Interior) da Monalisa

Tem um exercício de meditação taoista em que os órgãos são visualizados pelo meditador, que envia um sorriso para cada área de seu corpo. Um sorriso para o Fígado, outro para o Intestino e por que não, um sorriso para as partes do corpo que não gostamos. Parece uma coisa boba e sem fundamento, não é? Pois há vários estudos demonstrando que o sorriso, mesmo esboçado, mesmo de Mona Lisa, manda uma mensagem para o Córtex Cerebral e áreas ligadas às emoções que produzem sensações de relaxamento e tranquilidade. Não são só os nossos pensamentos que se manifestam no corpo, nosso corpo que interfere em nossos pensamentos. Parece muito óbvio, mas não é. Quando eu dava aula para o quinto ano de Medicina, dizia para eles que, mesmo que não se sentissem tranquilos diante dos pacientes psiquiátricos, que fingissem tranquilidade. Na época isso parecia uma trapaça, hoje eu percebo que estava dando a orientação correta. Ter uma atitude serena, mesmo de imitação, realmente deixa a mente mais tranquila.
Sempre costumei dizer que as pessoas vem para o consultório com um chachá invisível, e que este crachá é sempre falso. Um se apresenta: “Eu sou uma aberração”; a outra “Eu sou o Pânico”; um terceiro pode se apresentar “Eu sou o maioral, o fodão”. Jung chamou esta máscara social de Persona. Recebemos de nosso ambiente uma imagem do que as pessoas imaginam que somos. Com o passar dos anos, essa imagem pode ser reforçada pela vida. A menina que não é tão bonita quanto as irmãs pode desenvolver uma Persona de intelectual, ou virar uma grande empresária para demonstrar que é a mais aplicada, a mais focada, a mais bem sucedida. Isso pode custar o descuido com a própria aparência ou uma bela Depressão quando se apercebe que todo esse sucesso terminou num quarto vazio, cheio de papéis de chocolates e lenços assoados. O fato é que uma das tarefas das terapias é lançar um olhar nesta tal de Persona e ir subtraindo, pouco a pouco, seu poder. De preferência, trazer um pouco da emoção que se esconde debaixo da máscara. A Máscara costuma ser um lugar solitário. Tirá-la do rosto, quase sempre, dói, porque parece que está aderida à pele. Sem essa proteção tem muita gente que se sente nua. Talvez por isso que é tão difícil para os médicos retirarem seu jaleco e passarem a ser cuidados por outra pessoa, por exemplo.
Na semana passada estava de férias, e via em New York uma nova forma de pedintes: pessoas nem tão mal vestidas, sentadas na calçada, com um papelão de caixa dizendo: “Sou um sem teto e preciso de ajuda”. O mais impressionante é a expressão de tristeza trágica, uma verdadeira máscara de tristeza que ocupa o rosto dessas pessoas, sim, mais de uma pessoa. Havia pelo menos três pessoas diferentes fazendo essa estranha perfomance. Nessa época de Reality Show, cheguei a pensar que aquilo era uma espécie de intervenção, uma instalação de Arte Conceitual, como havia aquelas vacas coloridas espalhadas pela Paulicéia, a Cow Parade, há pouco tempo. Uma pegadinha, quem sabe. Por que me causou tanta estranheza, nossos mendigos são mais criativos que os mendigos de Primeiro Mundo? Não, não foi isso. O que me causou estranheza foi a máscara de tristeza e seu efeito anti empatia. Talvez por isso eu achei que fosse trote. Aquela tristeza não me gerava compaixão, eu que sou brazuca, imagina os ianques, que vivem naquele “Help yourself or die” ( em tradução livre, “Se vira nos trinta ou morra”). Quase falei sobre a meditação taoista, e o poder de rir para si mesmo e para quem passa na calçada. Garanto que seria um projeto de marketing muito melhor, gerando muito mais moedas. Essa será a campanha da semana, para os visitantes desse blog: pratique o sorriso interior (o exterior também é aconselhável).

Um comentário:

  1. Super legal o seu texto. Gostei muito desta discussão da persona.
    Acho que vale mais alguns posts.

    Abços,
    Lúcia Andrade

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