segunda-feira, 26 de junho de 2017

O Som e a Cura

Não foi muito lido o post em que eu descrevo as formas de Reação ao Estresse e como a programação interna determina como vai ser o desempenho diante da situação difícil. A reação Fight or Flight, ou Bater ou Correr e o Congelamento, que são as reações mais comuns, ou a reação de Desafio, onde o sujeito se agiganta diante do medo. Usei exemplos de futebol, como o timeco (des)montado por Rogério Ceni, que se congela quando toma gol. Não vou repetir o erro e falar de futebol de novo. Acho que vou fazer um blog só para isso.
A Reação de Desafio se manifesta quando uma pessoa se enfurece e se expande diante de uma dificuldade, ao contrário da reação natural, que é o medo e o encolhimento. No laboratório, os pesquisadores chamam a Reação de Desamparo Aprendido, quando um camundongo desiste de enfrentar uma situação adversa e se entrega para um predador ou para de nadar. Ratinhos mais valentes e medicados com alguns antidepressivos se mantém ativos por mais tempo.
Está chegando uma nova indústria farmacêutica no Brasil, e ela trouxe como cartão de visita um aplicativo chamado Parkinsounds, voltado para a DP, Doença de Parkinson. Essa doença degenerativa compromete algumas capacidades neurais, mas seu principal achado é a dificuldade motora, com tremores, lentificação e perda da capacidade de andar e se movimentar adequadamente. O aplicativo foi concebido para usar as músicas que o paciente gosta e adaptar o seu ritmo para acompanhar outro ritmo, o da marcha do doente. Enquanto ele faz seu trabalho de fisioterapia, seus passos tentam acompanhar o ritmo da música, como um marca passo musical e interno reorientando os movimentos. As melhoras depois de alguns meses são impressionantes. A música recria a musicalidade dos movimentos.
Li uma matéria sobre Michael Phelps, o maior medalhista olímpico e maior nadador de todos os tempos, e alguém perguntou o que tocava em seus fones de ouvido antes da prova. Ele respondeu que era uma música forte e pauleira, mas hoje eu me pergunto se ele também não encontrou um aplicativo onde a música ditava o ritmo de suas braçadas, criando um monstro dentro da piscina, que se expande e se agiganta diante do medo. Ou que ele aprendeu a colocar a música nas braçadas, ficando invencível.
Vivemos uma época de hiperestímulo, e um desses estímulos é o de prevalecer numa selva darwiniana de competições invisíveis. O medo de ficar para trás, ficar obsoleto ou, em última análise, ficar inteiramente só em meio à balbúrdia das pressões do Mercado cria também uma multidão de camundongos humanos congelados em seus pensamentos, até chegar ao estado de desamparo clínico, que chamamos de Depressão. Como no caso desse aplicativo Parkinsounds, posso imaginar que ele possa ser o início do fim da era medicamentosa em Neurociência. Em algumas décadas, os psiquiatras poderão ser substituídos por aplicativos que vão produzir ondas de pulso em áreas afetadas pela Depressão e Ansiedade, para restaurar a função perdida ou simplesmente recuperar a neurotransmissão após um dia difícil no trabalho. Em vez de temer que a Psiquiatria vire uma empresa de taxi em meio aos carros do Uber, gosto de imaginar que as doenças que são tratadas no dia a dia são na verdade doenças de áreas desativadas ou pouco ativadas no Cérebro que provocam nas pessoas dores psíquicas profundas. As técnicas meditativas são um aplicativo milenar, disponível para todos, para mandar ondas de estímulo para todas as áreas pouco ativas do Cérebro. Manda pulsos de serenidade e a sensação de expansão do que está contraído pelo medo. E é gratuito.
As doenças mentais podem se manifestar quando o Cérebro perde seu estímulo e sua Música. Um bom terapeuta busca recuperar as harmonias perdidas, e isso não vai poder ser substituído por um smartphone.

2 comentários:

  1. essa tema da diferença nas reações às situações de stress é excelente e fundamental, Dr. Obrigado por escrever mais de um post sobre isso.

    Me referindo ao stress crônico (sobre o agudo, nao tenho o que dizer): eu estou aprendendo a trazer o ritmo fantasioso que minha cabeã cria mais perto do que ritmo que a realidade realmente tem...acredito que isso me economizará muio omeprazol...

    boa semana, Dr.

    ResponderExcluir