sexta-feira, 11 de junho de 2010

O Sonho de Jung

Tudo bem, queridos leitores (ou leitora, no caso) logo vou postar textos definitivos sobre psique e futebol, em tempos de Copa do Mundo. Mas hoje vou responder a uma pergunta de minha seguidora, que colocou a seguinte frase de Carl Jung : " Os sonhos são manifestações não falsificadas da atividade criativa do Inconsciente ". Ela pede para esse que vos tecla comentar a frase e de quebra falar sobre sonhos e suas interpretações. É assunto para um ano de blog, mas vou tentar abordá-lo de forma nada sonolenta.
Vou começar sobre essa frase, que ninguém dá nada por ela, mas contém algumas elaborações teóricas de tirar o fôlego. Vou me concentrar na primeira parte da frase: " Os sonhos são manifestações NÃO FALSIFICADAS ..."; Este tiro tem destino, o alvo é a concepção freudiana das manifestações e interpretações de um sonho. Para a Psicanálise clássica, o sonho pode ser "lido" a partir de dois conteúdos: Manifesto e Latente. O sonho demonstra uma cena, por exemplo, Jung entrando em uma câmara secreta, cheia de ossos e sarcófagos antigos. Ele conta esse sonho para Freud, que o interpreta como o desejo inconsciente de Jung de matá-lo, simbolicamente falando. Vamos tentar entender o salto interpretativo: Jung era discípulo querido e menino de ouro do freudismo emergente no princípio do século XX. Tio Sigmund era o patriarca, o condutor desse movimento que mudou a forma de entendermos o homem e o mundo.O conteúdo manifesto é do jovem Carl descendo às catacumbas, em busca de algo perdido. O conteúdo latente, que Freud associou aos túmulos e cadáveres, seria o desejo inconsciente de morte do Pai e tomada do poder fálico paterno pelo filho. O sonho teria então um texto e um subtexto. Seria, a grosso modo, como se o sonho ocultasse o desejo inconfessável através de suas imagens. Jung ficou muito contrariado, para não usar outro termo, com essa interpretação. Para ele, devemos nos ater ao conteúdo manifesto sem acharmos que o mesmo oculta sempre ódios e cobiças inconfessáveis. Devemos confiar no que o sonho está demonstrando diretamente. Depois de um século desta pendenga, podemos dizer que Jung estava correto nessa conversa: o sonho provavelmente estava falando do que seria o caminho do pensamento junguiano nas décadas seguintes, quando o psiquiatra suiço realmente vasculhou os fundamentos arquetípicos da alma humana, o que incluiu escavar velhos textos e saberes que estavam enterrados no esquecimento da História. Um freudiano poderia contrargumentar que Freud tinha razão, pois Jung "matou-o" simbolicamente nos anos seguintes, tornando-se crítico e dissidente do movimento psicanalítico após rompimento doloroso com Freud. Podemos admití-lo, também, por que não? Mas no que tange a esse sonho, os junguianos vão continuar batendo o pé que o conteúdo está aí e devemos confiar nele. Isso que ele quer dizer com "manifestações não falsificadas". Descer às catacumbas, como apareceu no sonho, significava uma tendência que já se manifestava em Jung, quando passou a estudar Mitologias e Religiões comparadas para entender a formação da Psique Humana. Não era uma coleção de impulsos assassinos se manifestando de forma rebuscada. Para a interpretação de um sonho, devemos considerar o conteúdo manifesto como limite do que vamos interpretar, como uma mensagem da psique que chamamos de Inconsciente.
A segunda parte da frase, em que Jung fala sobre um Inconsciente Criativo eu comento no próximo blog. Até lá.

Um comentário:

  1. Adorei a abordagem sobre a primeira parte da frase. Foi clara o suficiente para que eu entendesse. Vou aguardar pela segunda parte. Sua seguidora agradece !

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