sexta-feira, 23 de julho de 2010

O Falso Eu

Posso confessar nesse blog sem muito pudor que sempre gostei de alimentar a fantasia de que era o melhor psiquiatra do mundo. A fantasia ia muito bem, obrigado, até eu tomar contato com o livro de Mark Epstein, psiquiatra budista americano: "Partir-se sem quebrar". Percebi, ao ler esse livro que esse humilde teclador é, na melhor das hipóteses, o número dois. Abro mão do título imaginário e algo narcísico sem nenhuma dor na consciência.Como é bom ler o seu texto, com essa serenidade que dá ao leitor a sensação de ver tudo de um patamar mais elevado e calmo. Ontem eu estava lendo um trecho de seu último livro, "Aberto ao Desejo" e um trecho me mereceu destaque: Mark estava em um retiro budista e o Rimpoche (um título de mestre budista, como doutor, por exemplo) divagou sobre a relação dos ocidentais com seus filhos. Segundo esse Lama, era de se estranhar que no Ocidente, os pais fossem tão preocupados e atenciosos com seus filhos, chegou a observar que davam uma atenção muito mais intensa aos mesmo do que os pais tibetanos e, no entanto, os filhos pareciam sempre ressentidos de seus pais. Mark assoprou para o staff do mestre que, caso ninguém se habilitasse ele se dispunha a se reunir com o Rimpoche e explicar para ele essa aparente contradição. Após a palestra e outras atividades ele foi chamado a conversar com o sábio e lhe deu uma explicação muito bonita: os pais no Ocidente não acreditam que o seu papel é ajudar a frutificar uma semente que já vem pronta. Imaginam que devam ter planos e expectativas a respeito de si mesmos e a respeito do que deva ser o futuro de seus filhos. Para atender à essas expectativas os filhos criam uma espécie de Falso Eu, tentando ser bons, felizes, criativos, bons alunos e bem sucedidos em suas atividades, para alegria dos papis e mamis gritando na arquibancada. Esse Falso Eu, que os junguianos chamam de Persona, consome muita energia e algum cansaço dos filhos que em algum momento vão querer jogar fora a máscara. O Rimpoche entendeu: "Eles sentem uma pressão". Exatamente. Eles sentem uma pressão. Seja assim, faça assado, suba, desça, consiga. Cansa só de ouvir. Seja tudo o que o papai queria ser, meu bem.
Fiquei encantado como essa explicação singela quase que resumiu o que batalhamos todo dia nos consultórios e nos divãs: encontrar o verdadeiro Eu soterrado em tantas camadas de expectativas. O inferno são as expectativas.

Um comentário:

  1. Eu que o diga ... já comecei a fazer alguns pequenos exercícios para minha "libertação". Rute

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