domingo, 7 de maio de 2017

Quietude de Coração

Alguns Domingos é bem difícil cavar uma pauta para esse Blog, e aí me acorrem fantasias terríveis, como depois de seiscentos posts está mais do que na hora de parar com isso e decretar no mínimo uma pausa para essas postagens. Ou acabar com elas e começar outra coisa. Um blog que seja um blog, por exemplo, com um texto curto e dois parágrafos, no máximo três. Os textos saem longos, parecem uma coluna ou um ensaio, agora que vivemos o fim da mídia impressa e a inoperância dos ensaios. O meu mau humor vai melhorando quando o tema começa a aparecer, gradualmente, até começar a tomar forma.
Dessa vez fui atrás dos vídeos da Monja Cohen, que responde às questões que as pessoas lhe enviam. Numa delas ela fala sobre Aquietar a Mente. No vídeo, ela menciona uma coisa muito curiosa, que, ao adentrar um silêncio cada vez mais profundo com a prática do zazen, (uma meditação zen budista que é a sua formação), ela começa a distinguir sons específicos que derivam desse silêncio. Como se o mergulho nessas camadas mais profundas de vazio trouxessem uma sonoridade própria. Uma outra experiência sensorial.
O silêncio não é nada popular em nossa cultura. Eu moro num condomínio fechado, e, como tal, muita gente vem fazer churrasco por aqui, em busca de alguma tranquilidade. Estranhamente, essa tranquilidade é invadida por aparelhos de som com os mais variados gostos musicais. De rock anos 70 e 80 até pagodes ou, ai meu Deus, esse sertanejo cheio de ai ais e ui uis que teima em não sair da moda. Assim você mata o papai, grita o cantor no som perto da piscina. Mata mesmo. De desgosto. Pronto. Estou ficando rabugento de novo.
Aquietar a mente significa desprender a atenção do som e dos pensamentos, rabugentos ou não. Apaziguar o incômodo e a estrutura “Se...Então” que existe dentro de todos os pensamentos. “Se” o churrasco acabar e o som for desligado, “Então” estarei em condições de apaziguar os pensamentos. Se o vizinho parar de gritar “é Campeão!” para o Corinthians, então vou poder aquietar meus pensamentos.
A Mente não consegue apaziguar a si própria. Tentar parar os pensamentos acabam tornando-os mais circulares e mais insistentes. Aquietar a Mente tem para mim um especial apelo, porque significar usar o Sentimento de Quietude por sobre o blá blá blá do Pensamento, que insiste em classificar, rotular, analisar e, por vezes, se exasperar por mais uma música pseudo sertaneja bombando nas caixas de som do vizinho.
O aquietar da Mente inclui parar de brigar com os sons e deixar que eles se propaguem, sem interferência ou resistência. No Novo Testamento, Jesus descreve exatamente isso quando manda oferecer a outra face após uma bofetada, ou dar a capa se já levaram a túnica. Sempre achei, e ainda acho, que essa fosse o manifesto de uma das atitudes humanas mais difíceis de desenvolver, que é o Não Revide. Somos condicionados a sempre revidar, sempre tentar dar um empurrão de volta em quem está incomodando. Um líder magrelo, banguela e seminú derrubou o Império Britânico com o Não Revide, o Mahatma Gandhi. Donald Trump silenciou a sua queda vertiginosa de popularidade bombardeando a Síria após uso de armas químicas pelo inacreditável Bashar Al – Assad. O revide gerou a sensação de segurança, deu ao Cabeça de Laquê uma aura de macheza. O Olho por Olho faz mais sucesso que o Não Revide.
Dar a outra face talvez seja a descrição para esse aquietar da Monkey Mind, nossa Mente de Macaco pulando de galho em galho e de susto em susto para uma sensação mais ampla de espaço e de oxigenação. Não é à toa que as técnicas meditativas se apoiem tanto na respiração, na percepção de entrada mais ampla de ar nos Pulmões, que é exatamente o contrário da respiração curta da Mente de Macaco, sempre à espreita de riscos ou de ataques que podem vir do nada, como um islamita amarrado numa bomba para vingar o ataque de Trump.
Aquietar a Mente, ou Dar a Outra Face, significa uma abertura para o devir, para o que vem pela frente, que pode ser um passarinho cantando ou o som do churrascão aqui do lado, ao som de “Vai Corinthians!” (Aliás, uma dúvida cruel: como o time mais popular do estado pode ter um nome tão difícil de pronunciar pela maior parte de sua torcida?). Viu? A Mente continua pulando de galho em galho. Vamos voltar para aquietá-la. O melhor instrumento para isso é o Coração.

2 comentários:

  1. poxa, Dr. que legal...depois de Mark Epstein, agora temos Monja Cohen no blog....que orgulho de ser seu paciente (não estou sendo ironico..)

    Sobre Aquietar a Mente: demora um tempão pra aprendermos que é justamente não querendo aquietá-la que ela aquieta-se..eu ainda estou no processo...com muito zazen....

    Sobre o Corintia: a gente fala corintia....:)

    ResponderExcluir
  2. O dono da Mente de Macaco filosofou tão bem no início sobre o imenso valor em conseguir esvaziar a mente, e terminou no FUTEBOL, melhor exemplo de igualdade da raça humana, diga-se de passagem, masculina, "xingando" o time alheio por ter sido Campeão, sendo o Autor do Blog, um São Paulino típico, esmagado pela classe DOMINANTE, não só em SP, mas em todo o nosso Imenso Páis, que é a Classe Social dos MANO !!!! rsrsrsrsrs...
    Baseaando-se justicadamente no seu texto, nós todos temos um longo caminho na difícil prática
    de aquietar-se...
    ... à propósito esta Monja Cohen esteve em minha cidade, onde há um grupo bastante grande de praticantes de seu Modus Vivendus, e eu estive em uma de suas palestras, e o que mais me tocou foi sua presença intensamente calma e equilibrada, rodeada de simplicidade e poder de convencimento...
    É...como Jesus, o que mais toca o Ser Humano é o seu próprio EXEMPLO, Não somente as palavras.

    ResponderExcluir