domingo, 6 de setembro de 2015

Divertidamente, ou Quase

O filme "Divertida Mente"já deu um post nesse blog, bastante visto e comentado. E ainda tem gente que pensa que os desenhos da Pixar são para crianças. O filme se passa dentro do Cérebro de uma pré adolescente, Riley, que atravessa uma dura transformação em sua vida, interior e exterior. Dentro da Sala de Controle do seu Cérebro existem cinco personagens: Alegria, Tristeza, Medo, Raiva e Nojo, que eu preferiria chamar de Tédio, ou de Bode. Iniciar a adolescência exige uma grande modificação na bioquímica de nosso Cérebro, transformando aquelas crianças animadas e encantadas naqueles seres permanentemente mal humorados e bodeados com tudo. Provavelmente uma mudança profunda na Neurotransmissão, com diminuição de Dopamina. Tudo vira um imenso tédio. Riley está só começando essa fase. No final do filme, tudo parece bem, e a líder da gangue, a Alegria, percebe que há um novo botão no painel, chamado "Puberdade". Será que teremos a sequência do D"ivertida Mente na incrível jornada da puberdade de Riley? Tomara. "
A Sala de Controle mostra o desequilíbrio entre o Positivo e o Negativo nas várias camadas de nossa Psique. Medo, Raiva, Tristeza e Nojo são todas processadas em nosso Cérebro Emocional, particularmente em uma estrutura do tamanho de uma ervilha, chamada Amígdala (não confundir com as Amígdalas da Garganta, que vendem muito antibiótico quando infeccionam). Pois a pequena Amígdala pode causar muita confusão para todos, como o filme mostra, sobretudo quando Alegria e Tristeza são ejetadas para fora da Sala de Controle. Riley, como uma boa pré adolescente, passa a ser comandada pelos remanescentes, Medo, Raiva e Nojo, ou Tédio. Isso parece familiar? Um ser percorrido por explosões de raiva, que se esforça muito para esconder seu medo de tudo, e que acha tudo absolutamente um porre, o tempo todo? Me parece uma boa descrição do humor na difícil transição da infância para a idade adulta, que muitos não conseguem completar.
A Alegria, por sua vez, tenta o tempo todo organizar aquela bagunça e proteger a menina dos traumas da transição. A Alegria é chata, controladora e obsessiva em tentar controlar os outros sentimentos ditos "negativos". A Alegria parece com a mãe de Riley e isso não é por acaso. A Alegria é o nosso Córtex Pré Frontal, e suas funções são muito formatadas, ou não, pelas mães. Uma das "Leis de Spinelli", acho que a 34 (os números são aleatórios) diz que "O primeiro Pai é a Mãe". Quem vai conter as explosões de Raiva, acolher a Tristeza, apaziguar o Medo e tolerar o Bode vai ser a mãe, ou quem desempenhar a função gigantesca. A mãe é quem vai estruturar o Córtex Pré Frontal, e se a tarefa não for bem realizada, vai determinar o futuro psiquiátrico da pessoa.
No final do filme, a Alegria vai conseguir um salto junguiano de perceber o valor dos outros sentimentos, sobretudo da Tristeza, no Todo da psique. Incorporar as emoções e os afetos ditos "negativos"não criam a fraqueza, mas a verdadeira força. Muita gente acha essa ideia incompreensível.
Tem uma história que eu acho encantadora em um livro de Bert Hellinger. Ele usa muitas parábolas para captar a essência da Psique, que está sempre no Paradoxo, e o Paradoxo não pode caber dentro de escalas de avaliação ou equações lineares. Na pequena história, Jesus se debruça sobre um aleijado e se compadece de seu sofrimento. Pergunta para ele se não prefere receber uma de suas curas milagrosas e ficar livre de seu aleijão. O homem se vira para o rabi e gentilmente recusa essa ajuda. Jesus se volta a seus apóstolos e diz que "Em Verdade vos digo que há mais entre esse homem e Deus do que todos nós". Viu? Um paradoxo. O paradoxo da aceitação total e incondicional da totalidade da experiência da vida, que inclue toda a experiência da vida, que inclue Alegria, Tristeza, Dor , Gozo, Luz e Sombra. A aceitação, sobretudo, de nosso Aleijão.
Jung acreditava que a doença estava na unilateralidade, em acreditar apenas no Bem, tentando extirpar o Mal, como na tentativa obsessiva da Alegria tentando apagar todas as lembranças de Tristeza de Riley para construir uma Infância maravilhosa e sem dor, o que, sabemos, não é possível nem compatível com a vida. O aleijado da parábola, entretanto, fala de um degrau mais profundo de integração, que é a aceitação radical de nossa limitação e nosso destino. Isso não é para amadores.

3 comentários:

  1. Mestre, mas todos esses sentimentos como mostrado no filme, na realidade trabalham em sintonia e harmonia, "discutindo" os próximos passos na Sala de Controle, ou sempre tem um líder que comanda as ações ?
    No filme a Alegria era a líder, mas sabia ouvir e negociar, que bom para Riley.
    Mas e quando um dos outros manda no pedaço?

    Abraços.

    Edison

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