domingo, 4 de agosto de 2013

Bruta Flor do Querer

Quando teve início a grande crise mundial, que Lula falou que no Brasil no mundo seria um tsunami, mas no Brasil “não passaria de uma marolinha”, eu li um texto, se não me engano, do Calligaris, em que ele dizia que aquela catástrofe econômica era derivada de nossa civilização “O Segredo”, onde os livros de autoajuda propunham, em alguns casos, literalmente, que o Universo seria uma espécie de Gênio da Lâmpada pronto a materializar todos os nossos desejos, desde que mantenhamos a nossa mentalização. Isso aplicado ao mercado financeiro, ou à expansão enlouquecida do crédito, levou a economia americana e, por tabela, do mundo, a nocaute. Os realistas de todas as origens concluem que, infelizmente, querer não é poder.
As rodas pesadas do hipercapitalismo são movidas às custas dessa fantasia coletiva que, se o desejo for canalizado e os esforços mantidos, poderemos ter acesso quase ilimitado aos nossos sonhos. Já está chegando em nossa cultura tipiniquim a divisão entre loosers, os perdedores e os winners, os vencedores, os campeões. A divisão se dá em termos de capacidade de consumo e de poder de compra. As fantasias podem desmoronar como o império de Eike Batista, na hora em que as pessoas percebem a diferença entre Realidade e Simulacro, entre Forma e Conteúdo. Da noite para o dia o antigo Winner passa a ser um Looser, quando cai a sua máscara.
Muitas religiões e escolas místicas alertam para os perigos da ganância, do desejo desenfreado que quebrou várias vezes muita gente e causou a morte e a ruína de outras tantas. Saber conter, ou limitar as ambições enlouquecidas é quase sempre a moral da história, da tragédia grega aos épicos shakeaspeareanos. A grande questão, que aparece sempre nos divãs e na vida é que o desejo, por mais que deva ser conduzido em nossa vida com calma e sabedoria, é completamente imprescindível à mesma. Não dá para fugir de nossos desejos ou esmagá-los em falsas modéstias. Como diriam os Titãs, a gente quer inteiro, não pela metade.
Al Pacino, inesquecível como diabão no “Advogado do Diabo” gritava no diálogo final que Deus é um sádico, pois dá aos homens o Desejo e a Interdição (não foram essas as palavras, mas era essa a ideia). O Desejo e a proibição do Desejo são a nossa dor e a nossa delícia. Desejamos e temos medo da frustração, então ficamos cada vez mais realistas e cada vez mais tristes. O que eu proponho, inclusive em termos terapêuticos, é que temos direito, sim, a estabelecer nossos campos de desejo, e que realizá-los não é nem pecado nem o triunfo da psicanálise, mas é a base de muito de nossa existência. Criar um campo de desejo e de sonho, trabalhar esse campo de desejo e tentar trazer para o Real o que só existe no Invisível é tarefa para um bom tempo de luta, de erro e de aprimoramento. Não adianta mentalizar ou usar a “Lei da Atração” sem esse processo de aprendizado e busca. Mas não dá para viver sem esses campos de desejo. Nem na terapia nem na vida fora dos divãs.

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