sábado, 10 de agosto de 2013

Synchronicity

Jung me ajudou a impressionar uma garota apenas uma vez em minha vida. Estávamos no banco de tráz de um carro e começou a tocar um sucesso do Police, no que eu acho que foi o maior álbum dos anos 80, “Synchronicity”. Estava tocando justamente a música que dava nome ao disco, onde Sting descrevia um monte de cenas, fatos e imagens sem relação entre si e terminava com a palavra Synchonicity, ou Sincronicidade, um conceito formulado por Carl Gustav Jung. Lógico que ninguém no carro tinha a menor ideia do que significava aquela letra, então eu expliquei, com toda a banca de um jovem estudante de Medicina que estava devorando todos os livros de Jung que houvessem pela frente, que Sting estava falando na conexão invisível que existe entre todos nós, o que Jung chamou de Inconsciente Coletivo. Não sei se a loira (sem trocadilho ou demérito às loiras, por favor) entendeu a explicação, mas ela entreabriu os lábios como se estivesse diante do cara mais cabeça que já tinha visto, e eu me dei bem naquela noite. Obrigado, Carl Gustav. Acho que hoje em dia a menina teria olhado para mim com aquela cara de :”Você é doente, Nerd?”. Mas nos anos oitenta ainda dava para impressionar as meninas com esses papos cabeça.
Outro dia estava vendo um programa, ou, melhor dizendo, homens nunca estão vendo um programa. Estão zapeando vários programas simultaneamente, pegando os pedaços de filmes, piadas, comerciais e esportes que nunca chegamos a ver inteiros. Então eu estava zapeando quando parei num programa de Talk Show em que um pequeno grupo de mulheres tentam encaixar um papo cabeça sobre atualidades. Os anos se passaram e minha paciência para papo cabeça também passou, mas me detive em um senhor que descreveu uma sessão de análise em que uma pessoa chorava uma perda, provavelmente uma morte e a incerteza se haveria algo depois de nossa vida biológica. Parei de zapear. Aquilo parece conversa de um junguiano. Ele continuou contando o caso: a conversa se desenrolava sem o terapeuta ter coragem de abrir a boca quando pousou em sua janela um belo pássaro, que ficou parado olhando para eles em longos segundos. Uma intensa sensação de paz tomou conta do ambiente, até o pássaro sair voando. A paciente olhava para a janela, em lágrimas, como se tivesse recebido a visita da pessoa amada que havia morrido. Sabe o que é Sincronicidade? É isso. Um evento que não tem nada a ver com o que está acontecendo, como um pássaro pousando na janela de uma sala de terapia, que enche de significado o que está acontecendo lá dentro. Um psicanalista diria que a pessoa estava procurando, em seu desespero, por algo que desse significado a morte de um ente querido e se agarrou à uma ave na janela para acreditar que a vida e a morte tem algum sentido. Quem já experimentou uma coincidência significativa e a sensação de maravilha, de sentido profundo que ela carrega, já conheceu uma Sincronicidade. Einstein morreu sem saber se o Universo é, ou não, um lugar amigável. Faltou o pássaro em sua janela, para dar essa sensação de que as coisas estão conectadas em algum nível profundo e invisível. Um físico mais jovem, David Bohm, chamou essa ordem de “Ordem Implícita”, justamente por essa característica mágica, fora de nosso campo de percepção, que conecta fatos e vivências dentro de campos de sentido.
A menina hoje diria, no banco de traz daquele Passat verde: “Além de Nerd, é místico.” Pois é. Além de Nerd, junguiano.

2 comentários:

  1. Fantástico, Doctor !

    Primeiro pelo texto, eu já tive essas sensações e são muito confortantes e conectadas. Eu penso que são reais, dane-se o resto.

    Em segundo lugar, pela menina no banco de trás do carro (fazendo o quê?) e ainda por cima um Passat verde!!!
    Eu tb tive um... Qual a placa ? :)

    Abraços verdes.

    Edison

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  2. Sincronicidade foi eu abrir esse texto nessa madrugada de insônia. Muito grata. Agora posso dormir em paz. Beijos. Dafne.

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