sábado, 24 de agosto de 2013

O Quilão

Quem me conhece sabe que sou grande apreciador de Restaurantes Por Quilo. Tenho a impressão, influenciado pela Medicina Chinesa( que eu sapeio de vez em quando), que nos buffets por quilo podemos construir um equilíbrio entre cores e sabores, bem ao gosto da Medicina Taoísta. Salgado, Doce, Amargo, Apimentado e Azedo são tipos de estímulo que nossa língua percebe em diferentes regiões gustativas. Nossa alimentação ocidental tem uma grande ênfase no Salgado e no Doce. O resto entra como tempero ou como bebida, mas passamos do Salgado da refeição para o Doce da sobremesa. Excessos de doces e farináceos estão na base de nossa atual epidemia de Obesidade, mas esse é outro assunto. Os restaurantes por quilo tem espaços para saladas, legumes e pratos quentes. Dá para equilibrar gostos, cores e grupos alimentares, o que favorece a saciedade. Para quem duvida, eu proponho um teste bem simples: quando bater aquela fome fora de hora, tente atingir a saciedade comendo só doces, ou, em outro momento, faça um lanche com equilíbrio de sabores. Nos meus consultórios eu faço pequenos lanches, nessas horas, com grãos, como amêndoas e nozes, chocolates amargos com alto teor de cacau, maçãs azedas ou damascos, além de um chá forte ou picante. Os gostos estão aí: o salgado dos grãos, o picante no chá, doce e amargo no chocolate escuro, o azedo na fruta. Tenho a impressão que o Cérebro recebe uma informação sensorial mais rica e entende que não vai faltar comida. Isso desliga o alarme da fome. O doce, pelo contrário, parece estimular o Cérebro a querer mais, mais, mais. Quem já devorou caixas de bombons e teve que encarar a ressaca moral do dia seguinte sabe do que estou falando.
A parte ruim dos restaurantes por quilo são as filas, sobretudo, alguns tipos que ficam na fila. Eu costumo imaginar que uma forma de Danação ou Purgatório, para este pecador aqui, seria uma eternidade na fila do Restaurante por Quilo. Os tipos mais difíceis são, sem dúvida, os obsessivos. Olham, observam, pegam cada folhinha de alface com uma incrível e meticulosa precisão. Os membros mais gordinhos de nossa pequena confraria parecem demorar calculando os pontos da refeição, suas calorias e estratégias alimentares. Tenho uma paciente que diz que salada deve engordar muito, pois os pratos cheios de vegetais e saladas estão geralmente nas mãos dos gorduchinhos. Outra galera que retarda a fila são os funcionários querendo esticar o almoço. Tudo eles fazem de maneira lenta, inclusive montar seus pratos. Esses eu ultrapasso, dou trancos, piso nos sapatos. Tem paciente me esperando e a pessoa pode revisar doze bifes para poder escolher um deles. Gosto mais dos “caminhoneiros” sem culpa, que fazem pratos imensos sem considerar que estão num restaurante por quilo, não no PFão da esquina. Esses derrubam batatas de suas pirâmides e colocam Estrogonofe de Camarão encima do Arroz, Feijão e Farofa. Nenhum prurido gastronômico. Existem as magrinhas que fazem pratos que são critério para diagnóstico de Anorexia. As gordinhas sexy, que fazem um prato balanceado e depois devoram o pudim de leite da sobremesa e ainda batem um picolé na fila do pagamento.
Continuando a metáfora da Danação Eterna, a fila do pagamento é outra via de expiação de pecados. Fico enternecido com as velhinhas e velhinhos que adoram puxar papos com o Caixa. Enternecido e enlouquecido, de acordo com o número de pacientes que me aguardam no consultório. Prefiro pesadores e caixas mau humorados, que não olham nos seus olhos e fazem a sua função rapidamente. Não que isso intimide as velhinhas, que perguntam da família toda e podem fazer um tratado sobre as variações de temperatura e clima. Nesta fila, reclama-se do calor, do frio, da chuva e da secura. Desesperador é quando o caixa se anima e pode passar uns três minutos narrando as peripécias de ter sido pego, em pleno Domingo, por uma frente fria anunciada em todas as mídias. Impressionante, ele exclama diante do olhar admirado de vários tiozinhos. E a fila... Empaca .
Gosto muito de ler sobre os benefícios das meditações, e posso observá-los nas filas de restaurante por quilo. Inspirar, expirar. Longamente. Senão posso, num acesso de loucura, correr para o Mac Donald’s ao lado, onde também há filas, mas as duas em uma, pagamento e formação do prato. Respira que a fila está acabando. Nessa hora, dá pau na maquininha de vale refeição e o Caixa não sabe o que fazer. A velhinha comenta que o tempo está para virar. Eu tomo uma inspiração profunda.

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