sábado, 1 de fevereiro de 2014

Hormese e Obesidade

O jovem Sidharta, que depois seria chamado de Buda, descobriu, há mais de dois mil e quinhentos anos, que o caminho do desenvolvimento espiritual precisa compor tendências opostas. Se alguém vai afinar a corda de um violão, sabe que se a mesma ficar pouco tensa, não vai conseguir produzir um som adequado. Se por outro lado, for esticada demais, também sairá um som muito agudo ou pode se romper. Descobriu assim o Caminho do Meio. A sua descoberta não serve apenas para a expansão da consciência. Descreve também uma característica profunda da Vida, que se mantém através de sistemas de equilíbrio muito delicado.
O último post deste blog trouxe mais uma vez o conceito de Hormese. A grosso modo, esse conceito descreve que os sistemas orgânicos precisam do estresse e do desconforto para funcionarem no seu melhor desempenho. A vida moderna atrapalhou muito a nossa capacidade de Hormese. Não passamos longos períodos sem comida, não temos que nos deslocar para encontrar água nem temos que estar magros para fugir de um predador.
Um peptídeo fabricado no Fígado tem sido muito estudado em pesquisas sobre desnutrição, o IGF-1, ou Somatomedina C. Esse nome significa que esse peptídeo tem a estrutura molecular semelhante à Insulina. Em pessoas submetidas á desnutrição desde a infância, nota-se que os níveis baixos de IGF-1 significam baixo peso e crescimento, maior suscetibilidade a infecções e parasitas, menor capacidade de cognição e inteligência. Crianças que nascem em áreas de desnutrição tem seu futuro quase que irremediavelmente comprometido. Os baixos níveis de IGF-1 significam que aquele organismo funciona em módulo econômico, crescendo e gastando energia de maneira limitada, para sobreviver no meio com recursos escassos.
Nos países desenvolvidos, ou nos lugares onde não existem mais bolsões de desnutrição, o IGF-1 geralmente está em níveis altos e crescentes. Isso não significa uma vantagem. Níveis de IGF-1 altos são ótimo sinal em fases de crescimento ou de ganho de massa muscular. Com o passar do tempo, eles se correlacionam com maior chance de ter doenças oncológicas e cardíacas. Um nível de IGF-1 alto hoje pode garantir o uso de muitos comprimidos na fase madura de nossa vida: pílulas para Colesterol, Hipertensão, Diabetes, Insônia, Obesidade e por aí vai a lista. Nossa alimentação e estilo de vida em muito contribuem para os altos índices de IGF-1. O conforto da vida moderna diminuiu e muito nossa capacidade adaptativa, nossa Hormese. Precisamos de fome para comer (já mencionei no último post a tendência cada vez mais estudada de elaborar dietas que alternem períodos de restrição calórica severa, de preferência jejum, com outros de alimentação normal, para ativar as capacidades metabólicas). Precisamos de exercício para dormir e reparar os tecidos. Precisamos de estresse para vivermos.
Os fatores de crescimento, como o IGF-1, como os outros sistemas orgânicos, precisam funcionar dentro de uma margem de equilíbrio. Estarão diminuídos na Anorexia Nervosa e aumentados na Obesidade e no Sobrepeso. O mesmo peptídeo pode salvar ou destruir um equilíbrio de seu organismo. Não é preciso ser nenhum gênio para saber que esse antigo mocinho hoje é um autêntico vilão em nossa Civilização Autoestima.
Na animação da Pixar,"Wall-e", a vida orgânica foi destruída na Terra e a civilização se escondeu em naves, onde cidadãos passam o tempo todo diante de telas de computador jogando games e vivendo em um mundo virtual. Eles são pessoas geralmente acima do peso e com muita, muita preguiça. Será esse o destino do Homo sapiens, quando ele conseguir viver num mundo que não o desafia?

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