domingo, 22 de janeiro de 2012

O Vampiro

Estava vendo ontem um telefilme sobre a vida de Jo Rowling, autora da saga de Harry Potter. Eu li três dos sete livros da saga, infelizmente, pois já expressei em outros posts meu apreço pela mesma. Fico muito impressionado com a descrição dos sentimentos de Harry quando atacado pelos Dementadores, monstros que tiram da pessoa a vontade de viver. Só alguém que passou por um quadro depressivo maior pode descrever aquelas sensações. O telefilme deu uma amaciada nessa passagem, não mostrando claramente o período em que a futura autora de Harry Potter ficou em um pequeno apartamento com a filha bebê, vivendo de cheques da Previdência local.
O que o filme mostrou, ou delineou, foi o relacionamento que acabou levando à fuga e ao isolamento depressivo de Jo. Ela se apaixonou por um jornalista português e, apesar de todos os sinais e alertas de suas amigas e atitudes do sujeito, foi entrando numa espiral de abusos até ter que fugir de sua casa no meio da noite depois de ter sido espancada pelo homem que parecia ser o príncipe encantado.
Já mencionei em vários posts a influência maléfica dos filmes da Disney e das comédias românticas na vida das mocinhas. A fantasia da saga e do sofrimento que vai ser coroado com o grande encontro da grande felicidade consome muitas caixas de chocolate e de Prozac aqui, na vida real. Na mesma vida real, a busca do homem encantador leva as luluzinhas para a porta do castelo do Vampiro, onde o fascínio e o encanto vai terminar no inferno da ambiguidade, a grande arma do falso príncipe. Afetivo, caliente, apaixonado, o discurso do vampiro é sempre o mesmo, de inteira paixão pela mocinha, mas algo está sempre obstruindo o amor. Até o nosso vampiro mais recente, o magrelo e pálido Edward, da saga "Crepúsculo" é inteiramente delicado e apaixonado por Bella, mas está sempre indeciso na hora de bater o penalti, se é que me entendem. O Vampiro é uma promessa que não se cumpre, mas está sempre perto de se cumprir. O contraste das horas de completa paixão e entrega, seguida de sumiços, de perdidos e de ausências injustificadas é o inferno que tortura as nossa Bellas (namorada de Edward) na vida real.
Jo Rowling foi descobrindo que aquele homem apaixonado e apaixonante era na verdade um fraco, dado a bebedeiras e sem a estrutura mínima para construir um casamento e criar uma filha. Com a ajuda de amigas, fugiu do ciclo em que era espancada e abusada pelo mesmo homem que a amava e jurava que iria se corrigir, que o seu amor era infinito e que nunca mais cometeria aqueles abusos. Romper com aquilo custou anos de solidão e depressão, que felizmente viraram os livros de Harry Potter, ele mesmo vítima de muitos abusos e abandonos com a morte de seus pais (Jo Rowling foi profundamente abalada pela morte de sua mãe, figura central de sua vida). Melhor do que ninguém, ela pôde descrever a saga de um herói que supera intuitivamente esses abandonos e abusos para construir uma vida íntegra, inteira. Talvez esteja na hora dela escrever um romance sobre uma mulher que está presa na gangorra emocional do relacionamento com um Vampiro, e de como é difícil romper com isso.

Um comentário:

  1. Sou fã número 1 dos filmes do Harry Potter, sempre me identifiquei com toda a sua história, mas nunca havia notado nas entrelinhas, o quanto conheço os "dementadores" , lendo hoje o seu blog percebi de onde vem minha identificação profunda... e não foi só nos dementadores... muito agradecida pelo texto que elucidou muitos "porques".... Claudia Mittelstaedt

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