domingo, 3 de março de 2013

Complexos

No filme “Um Método Perigoso”, um jovem psiquiatra de nome Carl Jung usa uma aparelho de medição para explorar a Psique humana. Com a ajuda de uma assistente, ele aplica um teste de ler uma série de palavras, pedindo que o examinado diga a primeira coisa que vem à sua mente. Quando o examinado “engasga” com uma palavra, demora mais para fazer a associação ou aumentava a sua frequência cardíaca diante de uma palavra comum, isso normalmente remetia a o que Jung chamou de Complexo.
Hoje essa palavra, como outras descritas pelo psiquiatra suíço, caiu no uso comum. “Ele é muito complexado”; “Ele tem complexo de Peter Pan” e assim vai. Não foi bem isso que Jung dizia a respeito do conceito. Complexo é uma ideia fortemente carregada de afeto, que exerce um efeito inconsciente em nosso comportamento. O corredor Oscar Pistorius virou uma celebridade mundial ao chegar numa final olímpica correndo com duas próteses, uma vez que teve uma má formação congênita que não desenvolveu suas pernas a partir do joelho. Esse home famoso e multipatrocinado era casado com uma modelo belíssima. Os vizinhos relatam uma relação tempestuosa, com violência verbal e física no casal, o que culminou com a morte de sua esposa, trancada no banheiro, que tomou quatro tiros do atleta e paratleta olímpico. Ele alega que foi um acidente, que atirou num suposto ladrão. A opinião pública e de várias pessoas, desconfia da versão. Mas essa tragédia, como muitas outras, é um exemplo triste da ação de um complexo. Por exemplo, um campo emocional inconsciente relacionado ao abandono. A sensação de estar sendo abandonado ou abandonada, desencadeia quase sempre uma reação de altíssimo conteúdo emocional, podendo chegar a agressão e morte. Esse é o Complexo, descrito pelo jovem Jung há cem anos. Uma palavra, uma imagem, uma lembrança podem desencadear uma reação afetiva desproporcional e fora de contexto.
O pesquisador Joseph LeDoux finalmente descobriu, ou redescobriu, o Cérebro Emocional descrito por Jung e por Freud. Uma pequena região, do tamanho de uma ervilha, chamada Amígdala, faz todo o processamento do medo e do comportamento emocional em nosso Sistema Nervoso, o que exerce uma forte e inconsciente influência em nosso comportamento.
Existe uma Memória Emocional e uma Memória Cognitiva, muitas vezes operando em paralelo em nossa psique. Por isso somos muitas vezes assaltados por reações emocionais que não conseguimos controlar. Talvez o exemplo mais extremo desse fato seja a crise de Pânico, quando o Cérebro Emocional cria uma espécie de autonomia e uma descarga adrenérgica violentíssima pode ocorrer quando a pessoa está presa no trânsito de São Paulo, por exemplo. O estímulo constante das áreas do Medo pode desencadear essas crises, que são como um grito de independência de nosso Cérebro de paleoprimata. Não é incomum que alguns paciente fiquem muito decepcionados quando eu digo que estão apresentando crises ansiosas ou crises de Pânico completamente fora de seu controle. O que é pior, a tentativa de controlar essas crises, tornam as mesmas ainda mais incontroláveis.
O trabalho de psicoterapia vai recuperar esses complexos emocionais e colocá-los em novo contexto, o que permite ao paciente elaborar e ressignificar algumas experiências ruins gravadas em sua Memória Emocional. Essa é a essência de vários métodos terapêuticos.
O engraçado é que a Neurociência, na mesma medida que tenta suplantar e desacreditar a obra gigantesca de Jung e Freud, acaba validando conceitos e observações feitas meticulosamente por esses pensadores no início do século passado. Os complexos existem e influenciam nosso Cérebro Emocional. Algumas vezes, podem fazer um homem racional destruir a própria vida e a de outra pessoa, escondida atrás da porta do banheiro.

2 comentários:

  1. Há muitos anos fã de seus textos e sua fã também, quero parabenizá-lo, hoje duplamente...

    Deus te abençoe Marco!!!!

    Beijo Dotore... com carinho e saudades .............

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  2. Os complexos ficam carimbados no nosso DNA (assim que descrevo na "minha língua")...e não há inteligência cognitiva no mundo, que consiga fazer com que o nosso cérebro emocional acredite que nossa realidade agora é outra...
    Ficamos tentando provar constantemente que AGORA somos bons nisso ou naquilo, e provar não somente para os outros mas para nós, e, o pior é que o maior descrente do que dizemos somos nós mesmos. (ainda que isso seja um pleonasmo)...
    E quando somos lembrados disso (por aqueles que conhecem bem o nosso fraco (complexo)..e o usa para nos atacar; ou, por quem sem ter a menos idéia do que faz pisa no nosso calcanhar de Aquilis (complexo)PERDEMOS A RACIONALIDADE...se NÓS estivéssemos convencidos de que superamos...não nos abalariam mais.
    O atleta, por exemplo, mostrou para o mundo o que significa a palavra superação física, mas seu emocional nunca deixou de ser flácido!!!
    Quero um cérebro sem influência dos complexos...!!!!

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