Outro dia estava citando numa sessão uma música de Chico Buarque, Terezinha. A cliente, na faixa dos trinta anos, não conhecia a música. Mandei youtubá-la. Chico Buarque deveria ser matéria obrigatória. A tal geração Y está perdendo-o de vista. O fato é que, particularmente, as músicas do Chico falam da alma feminina como ninguém. Um junguiano diria que ele faz música com a sua Anima. Terezinha fala das três fases de desenvolvimento do Animus, ou seja, da relação da mulher com o Masculino. Chico inspirou-se numa cantiga de roda: “O primeiro foi seu pai, o segundo seu irmão, o terceiro foi aquele que a Tereza deu a mão”. Chico escreveu, Betânea cantou: “O primeiro, me chegou/ Como quem vem do florista/Trouxe um bicho de pelúcia/Trouxe um broche de ametista”. Esse homem é o primeiro da cantiga de roda. O Homem Bonzinho. Ele é protetor, cuida e é o genro que toda sogra quer. Dá segurança e está sempre por lá quando a mulher precisa. Chico conclui essa estrofe assim “Me encontrou tão desarmada, que tocou meu coração/ Mas ele não me negava nada/ E assustada eu disse não”. O Homem Bonzinho tem todos os predicados, está sempre atento, demonstra o tempo todo a sua perfeição. Entediada, a mulher diz não. Continua a música : “ O segundo, me chegou/ Como quem chega do bar/ Trouxe um litro de água ardente/ Tão amarga de tragar/ Indagou o meu passado/ E cheirou a minha comida/ Vasculhou minha gaveta/ Me chamava de perdida”. Se o primeiro é um homem Pai/Mãe, o segundo é o bad boy. É o que vai fazer a mulher sofrer. É anti-Pai e a anti-Mãe. As mulheres de alcoólatras e de homens feridos em geral conhecem bem essa versão. O homem que agride, que duvida, que pune a mulher pelo que sua mamãe fez e deixou de fazer. A estrofe termina com: “Me encontrou tão desarmada/que arranhou meu coração/ Mas ele não entregava nada/ E assustada eu disse não.”
Não são poucas as mulheres que ficam presas nessas duas fases. As meninas que casam com homens-paizões, tendo chiliques por bolsas de cinco mil reais e morrendo de tédio no meio de um conforto desértico; ou as que se fixam na relação com os bad boys e vivem caçando as suas infidelidades e a absoluta falta de generosidade com a companheira; choram, deprimem, se entristecem sem perceber que estão presas apenas pela sua dependência do sofrimento. Basta dar as costas ao infinito egoísmo desse homem e seguir em frente. Mas como deixar a identidade de ser aquela-que-sofre? A quem ela irá culpar pela sua infelicidade?
Chico termina essa música belíssima com o terceiro homem de Terezinha: “O terceiro, me chegou/ Como quem chega do nada/ Ele não me trouxe nada/ Também nada perguntou/ Mal eu sei como se chama/ Mas eu sei o que ele quer/ Se deitou na minha cama/ E me chama de mulher”. O terceiro, o que vem para ser o cara, ao contrário dos outros, não tenta ifantilizar a mulher. Ela já não é mais a menina assustada, de coração arranhado. É uma mulher adulta, pronta para receber o seu homem: “Foi chegando sorrateiro/ E antes que eu dissesse não/ Se instalou feitou um posseiro/ Dentro do meu coração”.
Acho que vou distribuir a letra dessa música a todas as pacientes obsessivas amorosas, que procuram no escuro, sem saber o que estão procurando num homem. Ou deveria entregá-la aos homens que querem aprender a ser homem?
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Obrigada, por escrever hoje com essa sua anima!
ResponderExcluirChico deveria mesmo ser matéria obrigatória! Pra fazer a dois!
"...E quando o meu bem-querer sentir
Que o amor é coisa tão fugaz
Há de me abraçar com a garra
A garra, a garra, a garra dos mortais
E quando o seu bem-querer pedir
Pra você ficar um pouco mais
Há que me afagar com a calma
A calma, a calma, a calma dos casais
E quando o meu bem-querer ouvir
O meu coração bater demais
Há de me rasgar com a fúria
A fúria, a fúria, a fúria dos animais..."
Hoje, depois de ter passado literalmente por duas fases,
ResponderExcluirNão exatamente como as descritas por voçê...
Devo confessar que realmente o "terceiro" chega ou é descoberto, quando estamos adultas, sem ilusão e mais preparadas para a decepção...