sábado, 25 de agosto de 2012

Liderança e Redes Neurais


Outro dia comecei a receber torpedos enviados por engano ao meu celular. O meu número é peculiar, cheio de noves e setes e não é incomum alguém digitá-lo errado. Os tais torpedos era de uma certa moça que cumprimentava a Cléo por ter atingido as suas metas. O e-mail era assinado por uma tal Claudia. Depois de algumas felicitações e mensagens erradas interrompendo as minhas consultas, acabei mandando uma mensagem avisando que eu não deveria estar no mail list de seu celular. Não sou a Cléo, nem mesmo depois da meia noite. A moça ignorou a minha advertência. Continuei recebendo as convocações para reunião no Shopping Eldorado e outras mensagens de bom dia e de afeto caloroso de minha suposta “Líder”: desde de palavras de incentivo, do tipo “Vamos arrebentar”, até afagos do tipo “Equipe linda!”. Imediatamente perdi a minha própria subjetividade e passei a ser um cara plural, diluído na “Equipe linda!”, que eu não sabia qual era nem o que fazia. Comecei a bolar uma série de maldades escritas para a minha “Líder” afim de demovê-la de me mandar novas mensagens de incentivo. Poderia dizer que as suas técnicas motivacionais eram primárias e que, provavelmente, muitos membros da equipe, se tivessem mais de doze anos de idade, a achariam uma chata, como eu achava. Poderia me identificar como psiquiatra, o que deixa sempre as pessoas muito intimidadas, como se o psiquiatra pudesse sempre revelar as suas neuroses, suas taras e pontos fracos e avisar que mandaria uma ambulância do resgate para imobilizá-la se continuasse recebendo aquelas mensagens. Poderia optar pela paranóia, dizendo que eu iria passar as informações para as equipes concorrentes se não fosse excluído. Finalmente acabei mandando uma mensagem educada, falando que sou o Marco Antonio e não a Cléo, que estava recebendo as mensagens que ela enviava à sua equipe de forma indevida e que por favor ela retirasse o meu número de sua lista. Não houve resposta, mas Claudia dessa vez escutou os meus apelos e não recebo mais as palavras de incentivo de minha “Líder”. Às vezes sinto falta de seus elogios e incentivos, mas foi ruim enquanto durou. Esses torpedos levantam uma questão sobre a natureza da liderança e da motivação. Garanto que a Claudia tem uma equipe mais feliz e motivada do que uma líder paranóica e autoritária teria. Mas essa é a natureza da liderança?
Para a empresa, o líder é aquele cara que consegue fazer uma equipe cumprir as tarefas. Se ele vai usar métodos mais ou menos elogiáveis, não há problemas. Entregue o que tem para entregar que ninguém vai mexer uma palha contra o gerente, supervisor ou coordenador.
De vez em quando, vem algum palestrante contar uma piadas, um “causo” (ou, no jargão corporativo, um “case” de sucesso) e alguma dinâmica de grupo que fará as pessoas saírem da palestra abraçadas e cantando “Andança” (me desculpem os menores de 40. “Andança” era uma música sensacional para acampamentos – Me leva amooorrr...). No dia seguinte, volta o chicote no lombo da galera. Bater meta ou morte, e não me venha com esse papo de autoestima.
A verdadeira liderança é de uma pessoa que estabelece um trabalho transacional, negociando com o andar de cima e mantendo coeso o andar de baixo. A circulação de informação e o estabelecimento de relações de confiança são fundamentais nesse processo. Puxar o saco de quem está acima e descer o relho em quem está abaixo é a garantia de uma equipe desmotivada e doente. Uma equipe é uma estrutura em rede, quando uma parte não funciona, todo o grupo sofre. Um líder precisa ter a visão da rede e do que deve fazer para mantê-la funcionando, pois vai enfrentar sempre crises internas e externas, criando visão para achar os atalhos e encontrar os caminhos. A Claudia consegue mandar estímulos positivos, para a Cléo e para a equipe. Ela erra um pouco na mão ao escrever “Equipe linda!”, caindo no piegas e parecendo aquelas tias gordas puxando as nossas bochechas: “Como cresceu!”. Se ela tem a visão da rede e consegue criá-la, então está no caminho.

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