domingo, 7 de abril de 2013

Karma Evolutivo

Estou lendo um livro chamado “Retornando ao Silêncio” de um monge budista que emigrou para os EUA, mas lembra de muitas histórias da sua terra natal, o Japão. Uma delas era a respeito de seu mestre. Desde o início de sua aprendizagem, o Mestre dizia que ele nascera paraa ter sorte. Várias vezes durante a passagem pelo mosteiro, o homem observava que ele era uma pessoa naturalmente propensa à ser afortunado, o que lhe causava alguma inveja. Os fatos confirmaram as ideias do Mestre: o seu Templo pegou fogo, os seus monges foram embora, e sua tristeza foi se tornando cada vez mais profunda. Dizia que plantava sementes boas nessa vida para viver melhor nas próximas, acumulando mérito. A primeira vez que eu li, pensei: “Ai meu Deus, o tal do japa tinha Depressão, não tratou, o quadro se aprofundou e destruiu a vida dele”. Mesmo uma pessoa com todos os fatores de proteção para um quadro depressivo, como boa e saudável alimentação, vida não sedentária, meditação por horas ao dia, uma prática religiosa altruísta e uma rotina com muito pouco estresse, todos esses fatores de proteção e o Mestre foi destruído por um único pensamento, que cresceu como um vírus até tomar conta de toda a sua vida: a sensação de que não era uma pessoa destinada a ter sorte. Esse era o seu Karma, e esse sistema de crenças tornou-se uma programação inconsciente que ganhou vida em sua Psique. Jung chamou essa metaprogramação de Complexo: um agregado de ideias cercadas de imensa e oculta carga afetiva, que influencia a nossa vida consciente e, algumas vezes, toda a nossa vida. Quem pode saber de onde surgiu essa ideia viral: se o cara era ruim nos esportes, ou perdia os jogos, ou nunca provou da alegria de estar vivo ou viu nos olhos da mãe essa alegria.
Em nosso Genoma temos populações genéticas para todas as características. O ambiente pode ativá-las ou inibi-las. Jung descrevia uma informação inata, universal, que poderia ser ativada e acessada. Filhos de alcoólatras e abusadores podem se tornar grandes pais, mulheres maltratadas pelas mães podem virar mulheres amorosas e cuidadosas com suas filhas. Olhar para as características que desaprovamos e ativarmos outras é uma tarefa de todos nesse mundo, talvez seja esse nosso Karma evolutivo: pegar o legado que nossos mentores e ambiente nos impõe e transformá-lo em coisa melhor para quem vem depois. O que ocorre de maneira mais comum é essas dores ou sementes de dor ficarem gravadas no fundo de nossas redes neurais, causando estragos.
Mesmo um monge que pratica o bem durante a maior parte de seu tempo pode ficar envenenado por um simples ideia: “Eu não nasci para ter sorte” e esse núcleo de crença virar progressivamente autopiedade, inveja, tristeza. As velhas pragas da mente que catamos todo dia e que não param de nascer. Para mim, o otimismo consiste na prática diária de plantar boas sementes, ou ativar boas populações genéticas, para tornar a vida das pessoas melhor e menos sofrida. Jesus advertiu que “o Mal é o que sai da Boca” e tinha toda razão. As palavras, pensadas ou faladas, podem fazer muito estrago.

2 comentários:

  1. Obrigada por proporcionar tanta lucidez diante de temas espinhosos. Bjs, Priscila

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  2. De uma certa forma o filme " a origem" traz um pouco disso que vc relatou neste post ( inclusão de uma idéia que torna-se como um vírus dentro de nós). Por isso ainda acredito na máxima de que conselhos se fossem bons seriam vendidos e não dados! "Quem olha pra fora sonha, quem olha pra dentro desperta". A.M.

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