sexta-feira, 5 de abril de 2013

Flash Foward

Outro dia recebi uma questão interessante de uma leitora desse blog, que preferiu se manifestar no meu e-mail. Ela questionava o tal do Pensamento Positivo e como desenvolvê-lo sem tentar se fazer de boba. Dizia que não era assim otimista, pelo contrário, tendia sempre a ser um pouco pessimista e esperar pelo pior das pessoas e dos acontecimentos. Como desenvolver um otimismo que não seja tolo e não ignore a Realidade?
Não sei se a minha resposta foi animadora. Nosso Cérebro foi projetado pela Evolução para ser antes pessimista do que otimista; valorizar antes as experiências negativas do que as positivas. As lembranças mais facilmente fixadas em nossas redes de Memória são as cercadas de forte emoção, por isso lembramos mais das situações de risco, medo, tristeza e trauma. Uma das espetaculares intuições de Freud foi justamente correlacionar esses fragmentos de Memória traumática com a origem de comportamentos estranhos, neuróticos e medos tão profundos quanto irracionais que se originam dessas memórias profundas. Essa descoberta teve uma profunda influência em todos os tipos de Psicoterapia: recuperar essas memórias e, sobretudo, ressignificá-las (gosto muito dessa palavra) é uma tarefa que produz cura e transformação. O que Freud teria dificuldade hoje de aplicar o seu método seria para pacientes desse século que não são, apenas, prisioneiros do Passado: hoje temos pacientes completamente escravizados e paralisados pelo Futuro.
Nosso Cérebro tem a obrigação evolutiva de ser pessimista. Temos que estar preparados o tempo todo para situações de risco ou dificuldades que podem estar esperando por nós. No filme “As Aventuras de Pi”, o personagem principal sobrevive a sete meses de naufrágio, à deriva nas correntes do Pacífico, dividindo o bote salvavidas com um tigre chamado Richard Parker. Quando finalmente encontram terra firme, Richard Parker vai embora sem olhar para o homem que pescou e o manteve vivo no naufrágio, para sua grande mágoa. O que ele acaba compreendendo é que esse tigre, real ou imaginário, foi seu estado de extrema Prontidão e Atenção Plena diante das dificuldades e riscos diários à sobrevivência. Richard Parker representa esse estado mental não de otimismo nem pessimismo, mas de prontidão meticulosa diante do que a vida pode, ou não, trazer de bom ou de ruim.
Nosso Cérebro também conseguiu compreender a natureza do tempo e, portanto, conseguiu de forma mais complexa que qualquer outra forma de vida, planejar o futuro. Fui a um simpósio no ano passado em que um colega do Reino Unido relatou um achado bem diferente das descobertas de Freud: em vez de procurar pelos Flash Backs de experiências traumáticas, o seu grupo pesquisou os Flash Fowards, a antecipação de cenas terríveis que acometiam os pacientes como se estivessem num cinema gigante, assistindo um filme de terror da própria vida. Eram experiências em que os pacientes faziam o que fazemos todo dia, ficar projetando cenários de desgraça, fracasso para o futuro. Os pacientes que apresentavam esses Flashes Foward tinham uma evolução pior, necessitavam de mais medicamentos e tinham mais recaídas do que o resto do grupo em seguimento. Isso quer dizer que as pessoas que ficam projetando em sua tela mental imagens de cenas horríveis, como desemprego, doença, abandono ou, pior que tudo, não encontrar um bom namorado e ficar para titia, essas pessoas vão adoecer mais e ter respostas mais modestas ao tratamento.
Posso dizer para a leitora que perguntou sobre o Pensamento Positivo, é que acredito mais em atitudes do que pensamentos. Uma atitude de prontidão e abertura diante do futuro é o melhor pensamento positivo que posso desejar. Mas hoje em dia, não ficar projetando imagens de desgraça para o próprio futuro é um cuidado que nosso Cérebro Pessimista deveria sempre ter.

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