domingo, 28 de abril de 2013

O Homem mais Feliz do Mundo

Quando o Dalai Lama interessou-se pela Neurociência, particularmente pela ação da Meditação no Cérebro Humano, ele foi buscar nos monges tibetanos uma cobaia perfeita. Matthiew Ricard era um francês que após concluir seu doutorado no Instituto Pasteur, resolveu largar tudo e se dedicar a ser um monge tibetano. Depois de décadas de prática meditativa, ele seria o cara para o estudo, uma vez que entendia tanto o mecanismo da Meditação como o Método Científico, uma espécie de religião materialista do Ocidente.
Descobriu-se que esse homem tinha uma ativação impressionante das Áreas Pré Frontais esquerdas, quando o assunto era felicidade, prazer, compaixão. Era uma ativação até oito vezes mais intensa do que os controles que entraram no estudo. Logo o monge francês ganhou o apelido, dado pela imprensa, de “O Homem mais Feliz do Mundo”. Para um homem que praticou a renúncia em toda a sua vida, foi um apelido e uma publicidade meio incômodos, mas tudo bem. Estava documentado que o trabalho que fizera em todas as horas solitárias de meditação realmente modificava as redes neurais e a função dos neurônios. O que hoje parece óbvio demorou muito tempo para ser referendado pelo Método Científico: a nossa Mente interfere e modifica o Cérebro. Escrevi sobre isso no post do último Domingo. Podemos alimentar o Bom ou o Mau Cão que habita o nosso Cérebro. A Mente é treinada evolutivamente para a hostilidade, o pessimismo, o medo, a pressa. Qualquer editor de tablóide sabe que um crime bizarro vende muito mais jornal do que uma cura de uma pessoa que abandonou os seus pensamentos de ódio. O treinamento meditativo diminui a violência e transforma a vida de presos perigosos e violentos, outro fato documentado em estudos.
Impressionante o depoimento da mãe da dentista queimada viva em seu consultório porque não tinha dinheiro na conta para dar a seus sequestradores. Ela disse que esses quase meninos que perpetraram essa barbárie, se presos, só vão aprimorar a sua capacidade de praticar atos criminosos. O nosso sistema prisional não consegue, na maior parte dos casos, recuperar ninguém, mas antes consolidar essas pessoas como seres isolados e apartados da sociedade e contra ela eles vão se voltar, como anticorpos que se voltam contra as suas próprias células.
Somos uma nação eminentemente cristã, mas é mentira que não podemos ter familiaridade com alguma prática meditativa. Há alguns anos eu fazia umas sessões de meditação, feitas por um monge argentino (pode-se dizer que eu já gostava de um argentino antes da eleição do Papa Francisco), e ele pedia para a gente vislumbrar o Buda da Compaixão. Para mim, o Buda da Compaixão é o Sagrado Coração de Maria, ou é Jesus pendendo na cruz, pedindo perdão pelos que “não sabem o que fazem”. Não preciso buscar nenhuma outra imagem. Rezar um terço é praticar a Mente Presente. A meditação é o trabalho de se voltar para o Aqui/Agora da mudança de nossas redes neurais de medo, de hostilidade, de autodecepção. Não é preciso ser budista, nem mesmo ter qualquer crença religiosa para fazê-lo. Aliás, quem não tem nenhuma crença metafísica, isso é, da existência de qualquer coisa fora do seu reino material, pode acreditar no Método onipresente, o Método Científico, que comprova a boa ação dessa quietude em nossas redes neurais.
A felicidade não é um objetivo, mas antes, um efeito colateral. Nossa mente objetiva e finalista se perde na busca da tal da Felicidade, que se afasta sempre que tentamos agarrá-la. Essa é uma causa da distância entre os meditadores e a Civilização Ocidental: tudo aqui tem que ter um uso, uma utilidade. O nome dessa filosofia é Utilitarismo. Por essa forma de ver o mundo, rezar um terço pode ter o efeito de ativar essas áreas Pré Frontais de Alegria, ou apaziguar as Áreas Subcorticais do Medo. Isso normalmente deixa desconfortáveis os praticantes.
A Felicidade é um subproduto da prática amorosa, não um objetivo a ser alcançado. Como eu citei no texto de Jorge Luis Borges (vide o último post de 2012 ou o primeiro de 2013), “Felizes os felizes”.

2 comentários:

  1. Olá Spinelli,

    Maravilhoso o seu texto! Parabéns!
    Lúcia Andrade

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  2. Olá Spinelli,

    Por conscidência tenho uma colega de trabalho com seu sobrenome...rs.
    Descobri seu blog por estes encontros da vida, estava em busca de um tema para leitura e encontrei um texto seu do ano passado sobre Aprendizagem e repetição, resolvi lógico explorar mais as leituras e me deparei com esta bem recente, a qual concordo em gênero e grau, então passei para parabenizá-lo pelo texto muiot consciente e coeso.

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