quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Steve Jobs e a Individuação: A Morte

Ontem, sincronicamente, com essa série de posts (agora o terceiro e último) sobre o discurso de Steve Jobs na formatura de uma turma de estudantes de Stanford, fui pela primeira vez a uma cerimônia de Cremação, no Cemitério de Vila Alpina. O falecido, um tio avô querido. Nada mais pós Moderno. Tudo resolvido em dez minutos de músicas bregas, uma oração emocionada dos presentes e lá se vai o caixão. Asséptico, rápido, sem velórios, conversas de parentes que só se encontram nessas ocasiões, ou ritos longos de passagem. Não há nem uma capelinha por lá para podermos conversar com o ente querido e os anjos intercessores. Pá pum, que logo depois vinha uma galera dessas de gangues de motocicleta, com coletes e capacetes característicos, honrar um membro do grupo que deve ter caído da moto. Acendi um incenso e deixei um cantinho lá em casa para poder fazer um ritual para o tio. Essa pobreza ritual incomoda demais, sobretudo a um junguiano. Jung não cansou de falar de como a ausência de rituais de passagem empobreciam a vida psíquica e espiritual do homem ocidental.
Mas por que eu considero isso um evento sincrônico com a série de posts? O discurso de Steve Jobs tinha três pequenas histórias pessoais: o início da carreira, tateando a sua vocação até cair de cabeça nela, a primeira e definitiva tijolada que a vida dá no jovem milionário e finalmente, o primeiro encontro com a morte.
O palestrante contou de forma rápida e desapaixonada o diagnóstico que recebera recentemente (na época do discurso) de Câncer de Pâncreas, a cirurgia para diagnóstivo de seu tipo de Câncer, a perspectiva de ter a sua vida pessoal e familiar abreviadas, até que finalmente o diagnóstico de um tipo raro de doença, felizmente tratável e de bom prognóstico. Ele não se estendeu no tema nem fez digressões sobre o nosso curto tempo nesse planeta estranho. Apenas lembrou que o encontro com a possibilidade da morte destacou mais uma vez para ele a importância do tempo e de se viver a vida em estado de abertura. Citou uma enciclopédia jovem dos anos setenta, uma espécie de Google da época que encerrou as suas atividades com uma bela foto de uma estrada aberta pela frente, com um lembrete: "Stay hungry, Stay foolish", ou, numa tradução livre: "Continue com fome, continue boboca". O que isso quer dizer? Imagino que seja viver para essa estrada em aberto, que é a nossa vida, com a mesma curiosidade e deslumbramento de nossa infância.
Steve Jobs, percebendo ou não, faz uma aproximação de opostos, em junguianês, uma Coniunctio, uma união entre o arquétipo da Morte e o da Criança: como olhar e eventualmente viver a morte é uma parte inevitável de nosso caminho, então a única alternativa é fazer o caminho sempre com fome de aprender, sempre deslumbrados com a nossa própria ignorância e com os pequenos milagres que ignoramos, todo dia.
Tem um livro que eu gosto muito, cujo título é "Mente Zen, Mente de Pricipiante". Não é fácil, mas o contato com a morte pode expandir a nossa mente de principiante. Aliás, se eu fosse resumir em algumas palavras esse discurso, diria Mente de Pricipiante: siga a sua intuição, não perca a fé nos momentos difíceis e viva o caminho sempre em aberto. Sobretudo, não tente controlar as ondas. Em suas três pequenas histórias, ele separou os três grandes estágios arquetípicos de nossa vida: A Infância e os Ciclos Parentais, da Grande Mãe e do Grande Pai, a fase Heróica, do início ao fim da idade adulta, onde levamos umas tijoladas e a fase do arquétipo da Velhice e da reflexão sobre o significado da própria vida. Tudo isso em menos de quinze minutos de discurso. Ainda bem que inveja não mata.

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