sábado, 7 de julho de 2012

Aprendizado, Genialidade, Desenvolvimento

Outro dia estava assistindo na TV a cabo um documentário sobre crianças com habilidades especiais, antigamente chamadas de superdotadas. O episódio em questão abordava crianças com habilidades musicais excepcionais. Um menino, filho de mãe solteira, chinesa que imigrou para a América para fugir da opressão do sistema patriarcal chinês, passou a gravidez colocando Mozart e Beethoven para o seu bebê ouvir. O seu filho deu o seu primeiro recital ao piano aos três anos de idade. Ele nasceu com essa capacidade ou o desejo de sua mãe lhe foi tão profundamente incutido desde o berço que o baixinho não teve opção?
Um dado importante na genialidade é o que hoje é descrito como a Lei das Dez Mil Horas. Esse é o período de prática necessária para o domínio completo de alguma habilidade. Os portadores de habilidades especiais são uma espécie de Obsessivos do bem, pois voltam a atenção plena e obsessiva ao domínio de uma técnica ou de um trabalho. O tempo da prática não é um suplício, mas um grande divertimento, o que vai transformando, por exemplo no caso do garoto, que, na época do filme, tinha por volta dos seis anos de idade: cada pequeno avanço, cada nova técnica ou peça musical conquistada vira uma plataforma para se alcançar novos níveis de excelência.
Dentre todos os suplícios para um sãopaulino em ver o Corinthians ser campeão da Libertadores, um dos piores foi ouvir o Tite, que fez um trabalho excepcional mas é um pouco chato e “caga regras”, discorrendo didaticamente sobre o título conquistado com trabalho, coesão, repetição, merecimento... O sofrimento deriva do fato que: 1 Ele está absolutamente certo; 2 Ele descobriu esse método que está debaixo do nariz de todos, mas muito poucos conseguem replicá-lo. Isso pode garantir novos títulos para o Corinthians e nossos ouvidos torturados pelos gritos e rojões do “Bando de Loucos”. Mas esse é um outro assunto.
O assunto desse post é um interessante conceito nesse estudo dos portadores de habilidades especiais: além da repetição obsessiva, da excitação diante da dificuldade e da dedicação quase exclusiva ao desenvolvimento de determinado tipo de habilidade ou de inteligência, há também a “fúria do aprendizado”, uma espécie de gana quase compulsiva de se aprender e desenvolver mais e mais. O irônico é que esses mecanismos podem ser os mesmos que fazem um garoto ficar dependente de vídeo games e outro de cocaína, no caso dos gênios viram uma compulsão pelo domínio, cada vez maior de uma habilidade. Glenn Gould, um dos maiores pianistas da história, teve uma morte prematura e foi se tornando um ser cada vez mais obsessivo e excêntrico na dedicação cada vez mais obsessiva e compulsiva à sua genialidade. Essa é uma característica das crianças geniais; todo o mundo da infância lhe parece bobo, chato, sem interesse. Os mais dotados são muitas vezes classificados como imaturos afetivamente, desajustados profissionalmente, por acharem colegas e chefes meio burros, o que não gera um bom networking.
Esse assunto me interessa particularmente porque todo processo de terapia se baseia na desconstrução de modelos cognitivos e afetivos disfuncionais e na reconstrução, mediante aprendizagem, da visão de mundo e de vida das pessoas. Esse é um trabalho para ser realizado em diferentes estratos e profundidades. Com muita paciência. Como fez o Corinthians.

2 comentários:

  1. Engraçado que, ao comparar a versão da ária das variaçoes goldberg com G Gould na juventude e na maturidade, o que faz a diferença ao meu ver é justamente o afeto. Neste caso, se assim fosse, poderia ser inclusive o afeto parte de um aprendizado técnico obsessivo?
    Que bizarro!

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  2. Marco, não sabia que era "fanático" por futebol?? e mais!!! que do futebol poderia ser tirado algum exemplo para o desenvolvimento da mente humana??!! rsrsrs
    Brincadeira à parte...esse texto pode ser ligado ao que já li - e, aliás, por hoje chega, pois, apesar de notívaga, estou no limite,- da necessidade da repetição para o alcance do objetivo, da insistência, da persistência, do tentar por mais tempo a solução de um problema como disse (me perdoe me falhar nessa hora o nome de quem disse isso...será Freud?...não sei...a mente está falhando...faz tempo, aliás...é o Rivotril - rsrsrs)...guardada a devida proporção entre a persistência e a obsessão...
    Nos cursos para concursos públicos, um dos lemas é: "só não passa quem dediste"
    O conhecimento se acumula, não se perde...se não houver desistência, a bagagem, no bom sentido, se acumula e leva à realização (seja do que for, desde montar um cubo mágico...até...ser juiz de direito...)
    Que bom te achar...que bom te ler...

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