quarta-feira, 18 de julho de 2012

OK

Há alguns meses passei muito tempo preparando uma aula nesse blog, que teve como base o filme “A Origem”; essa aula foi apresentada em um curso de Terapia de Jogo de Areia, ou de Sand Play. Não gostei muito de minha apresentação mas já purguei essa sensação resumindo a aula aqui mesmo nesse blog, então não vou ficar voltando ao tema. Houve no curso uma aula muito bacana, também sobre um filme, dada por Áurea Caetano. Ela falou sobre o filme “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”. Eu vi esse filme, que é lento, uma noite em casa e não notei como era bonito até rever algumas cenas na aula.
A história é de um cara, interpretado por Jim Carrey em papel dramático (aliás, impressionante como os comediantes conseguem transmitir uma tristeza profunda quando fazem personagens tristes. Esse personagem de Jim Carrey ou Robin Williams fazendo papel de deprimido, dá para cortar a melancolia e a tristeza com uma faca, de tão densa). Esse cara vai procurar uma empresa que realiza o apagamento de alguma memória que o freguês queira eliminar. Ele quer eliminar a memória de sua namorada, Clementina, interpretada por Kate Winslet. O filme é então sobre Memórias Afetivas e como elas se encadeiam em nossa alma. Eu lembro do nome dela porque ela pede, de cara, para ele não fazer piada com o Dom Quixote, personagem de cartoon de nossa infância que passeava cantando: “Oh, querida, oh querida, oh queriiida Clementina”. Não há ninguém que eu mencione essa música (e que tenha mais de trinta anos, no mínimo) que não esboce um sorriso gostoso, lembrando de um desenho que não passa há décadas. Ela pede para não fazer a piada, o que praticamente induz o outro a lembrar da musiquinha sem cessar. Essas memórias com Clementina vão passando no filme na medida em que vão sendo apagadas. Só que durante o processo, em que o cliente está sedado e não pode pedir para aquilo parar, o casal começa a se esconder nos cantos do Inconsciente de Jim para fugir ao apagamento. As memórias são muito bonitas para serem deletadas como um programa defeituoso. Começa uma brincadeira de esconde esconde entre os funcionários da empresa e os amantes que moram nas memórias e não querem abrir mão do que foi vivido.
A cena que eu gosto de descrever é quando Jim e Clementina recebem as fitas, pois ambos procuraram a empresa para deletar o outro de suas lembranças. Uma funcionária revoltada devolve as entrevistas aos clientes. Clementina ouve a fita do seu namorado falando cobras e lagartos dela e explicando por que iria deletá-la. Confusa, ela sai de seu apartamento, terminando de vez o relacionamento. Ele pede para ela ficar no corredor, para que ele possa pensar no que dizer. Ela vira para ele e fala que aquilo não vai dar certo: ela é chata, irrascível, mau humorada. Vai acabar se enchendo dele como se enche de todos os caras. Vai acabar machucando-o como já machucara todos que se aproximavam dela. Ele olha com muita ternura e responde: “OK”. Ela olha, incrédula. Como? Ele repete: “OK”, como se dissesse: “Você é chata, irrascível, uma hora vai se encher de mim, mas OK”. Ela fica desconcertada e vamos para um happy ending meio torto, porque não vai haver um “felizes para sempre” das comédias adocicadas.
O filme descreve os mecanismos que nós, pósmodernos, temos de tentar evitar, a todo custo, o sofrimento, a frustração a rejeição real ou imaginada. O “OK” do amante é uam profunda e bela aceitação de tudo o que vem no pacote dos amores: frustração, medo, raiva, alegria, abandono e um banco de lembranças que é melhor não tentar apagar. Nessa época de pessoas muito zelosas de sua autoestima e imagem, viver o amor é tão cheio de senões e de medos.
Aquele “OK” representa a aceitação do devir, seja ele qual for. Não é para qualquer um.

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