sábado, 6 de outubro de 2012

Experiência Emocional

Eu tinha uma cliente engraçada que dizia que a sessão só era realmente boa se ela chorasse. Isso criava uma certa tensão humorística, porque quando ela finalmente chorava a gente se cumprimentava: Yes! Acabava atrapalhando o choro, mas era engraçado. Ela não sabia, mas estava absolutamente certa, embora pelo ângulo errado.
Estou lendo um paper sobre a aplicação da Neurociência à Psicoterapia. A autora, Vera Lemgruber, recuperou um termo dos anos 40, criado por um psicanalista, F. Alexander, a Experiência Emocional Corretiva. No decorrer de uma sessão terapêutica, uma reação emocional forte, como o choro, uma gargalhada, um grito, um susto, normalmente significa que algo importante foi tocado. Algo que a Defesa estava sutilmente escondendo e que, de repente, explode numa reação emocional. Outro dia eu estava assistindo aquele reality show trash, que é o Celebrity Rehab. Já falei dele em outros posts. O programa é sobre um período de reabilitação para dependência química, em um grupo de semi ou excelebridades reunidas aleatoriamente numa clínica para tentar um período de entendimento e recuperação de suas dependências. O psiquiatra que comanda o tratamento é Dr Drew, que eu adoro assistir. Ele tem a coragem, ou a falta de noção, de se expor e expor também as suas deficiências. Eu me divirto com as furadas de sua parca compreensão simbólica, o que atrapalha o seu trabalho e o trabalho da Psiquiatria com esses casos extremamente complexos. Pois Dr Drew deve ter lido sobre o assunto, pois houve uma sessão em que ele conversava com um dos pacientes sobre uma experiência traumática, em que ele lembrava de mais uma surra que seu pai tinha lhe dado. A lembrança e a compreensão do vazio que ela provocava levou-o às lágrimas. Quando essa emoção aflorou, o terapeuta quase que imediatamente encerrou a conversa. Ele queria apenas aquilo, chegar à emoção e pimba! – Nosso tempo acabou. Soltei um belo e sonoro palavrão. Não é possível que esse cara vai colocar o paciente para fora da sala enxugando as lágrimas.
Jung chamava essas Experiências Emocionais de Ab-Reação. Uma emoção forte que libera um afeto escondido debaixo de camadas e camadas de esquecimento e repressão. A expressão do afeto tem geralmente um sentido libertador (no seu sentido mais profundo: liberta-a-dor). O artigo perde o pé nesse ponto, quando sugere uma psicoterapia voltada para a produção de EECs. Já fiquei imaginando os pacientes num pau de arara, tomando choque e o terapeuta gritando: Chora! Chora, desgraçado! Menos, menos, gente. Psicoterapia não é campo de tortura. As experiências emocionais ocorrem e são acolhidas e trabalhadas, não um alvo a ser atingido. Dr Drew pisou na bola de novo. Após a experiência emocional, ele podia e devia ter acolhido as lágrimas do paciente, esperado o afeto ser expresso e ligar o que ele sentia com o seu comportamento de adição. A compreensão da dor e do mecanismo de repetição pode ajudar, e muito, na recuperação. E a experiência emocional na sessão pode ter efeito esclarecedor, chegando em níveis mais profundos de Ser.
A parte excelente desse artigo é a percepção que se aliarmos a força do Cérebro Emocional ao Racional em um processo terapêutico, os resultados serão muito, muito melhores. Isso parece a coisa mais óbvia do mundo, mas acreditem, para muita gente, não é. Podemos ouvir em qualquer conversa de boteco as pessoas dizendo que Depressão é fraqueza e Pânico é falta de força de vontade. Não são. Há uma infinita rede de medos e lembranças afetando os quadros psiquiátricos.
O terapeuta não é o senhor do Labirinto, mas procura pelos fios deixados por Ariadne.

2 comentários:

  1. Fantástico !

    Será que um dia vou conseguir equilibrar o cérebro emocional com o racional, já que voce diz eles têm bilhões de anos de diferença de idade ?

    Edison

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  2. ...sei muito bem o que significa encerrar um tratamento com lágrimas nos olhos...
    ...já senti inúmeras e inúmeras vezes esta dor brotando da Alma no final da terapia...
    ...MAS pelo que venho entendendo até os dias de hoje, é que todo este sofrimento foi necessário no meu encontro, o Encontro comigo mesma...
    E a vida torna-se NOBRE quando percebemos que o seu Terapeuta é como voçê.

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