segunda-feira, 8 de agosto de 2011

A Origem 5 Paradoxo

- Eu estava com vergonha de te perguntar isso.
- E agora você ficou sem vergonha?
- (Riso) Agora fiquei.
- Pode mandar ver, então.
Tomou fôlego, solene.
- O que significa aquele final?
- O Tótem, girando?
- No cinema, todo mundo suspira e pensa, mas que grande fdp esse filme.
- Pois é. Foi o que eu pensei.
- O que aquilo significa?
- Ora, aquilo é como um koan. Já ouviu falar de koan?
- O termo não me é estranho, mas não sei o que significa.
- (Suspiro) No Zen Budismo, o koan é uma intervençao que gera o paradoxo. Uma espécie de charada. Vai o aluno para o mestre e pergunta se o cachorro pode atingir o estado de Buda. O mestre responde dando uma latida. O que isso significa?
- (Dando de ombros) Sei lá.
- (Suspirou de novo)
- Você está impaciente comigo?
- Com você, não. Mas essa sua geração internet tem uma preguiça mental muito grande. Parece que tudo tem que estar na distância de um clique. Pense no que eu falei, meu bem. Pense.
- O aluno pergunta se o cachorro pode atingir um determinado estado.
- O estado de Buda. O estado da iluminação.
- Ok. E ele responde com um latido.
- Exato.
- Isso significa que o mestre está precisando ser medicado?
- Não vou suspirar dessa vez. Continue.
Mordeu os lábios.
- O mestre está dando uma resposta neutra. Quer dizer que a pergunta é um pouco idiota.
- Está melhorando. Mas nenhum mestre vai estimular um aprendiz a achar que suas perguntas são idiotas.
- Para que o latido, então?
- Para criar o paradoxo. Para criar um estado mental que ultrapasse as categorias de certo e errado. O latido pode ser o próprio Buda.
- Ok. Estou quase entendendo alguma coisa. Mas o que isso tem a ver com o filme?
Ajeitou-se na cadeira. O filme termina com a incerteza, certo?
- A incerteza se aquilo era um sonho ou realmente tinha acontecido.
- Exato. Deixa o espectador acostumado com happy endings em suspenso.
- Acho que sim.
- Mas não acho que a idéia é deixar o espectador frustrado, ou pensando.
- Estou ouvindo.
- A idéia, ao meu ver, é jogar o espectador para uma nova dimensão psíquica. Uma dimensão onde a realidade física e a realidade da psique se equivalem.
Balançou a cabeça, sem entender. A senhora levantou a sua mão, pedindo tempo para explicar.
- De uma forma ou de outra, todos os três sonhadores principais resgataram o que tinham para resgatar.
- Três sonhadores?
- Sim. O personagem do Di Caprio, Cobb. O herdeiro que era o alvo da Incepção, Robert Fischer. E o homem poderoso por trás de toda operação.
- O japonês?
- O japonês.
- Por favor, fale mais sobre isso.
- Cobb desce ao nível mais profundo do Inconsciente para acertar os ponteiros com a sua projeção. Olha no olho de sua esposa morta e finalmente vê que ela é uma peça de seu Inconsciente. Mal está morta, não adianta ele mantê-la viva em seu Inconsciente. Ele finalmente se despede e reconhece a culpa que levará nas costas por toda a sua vida.
- Os outros...
- Robert Fischer encontra com uma figura que representa o seu pai e finalmente ouve o que sempre quisera ouvir: seja você mesmo, seja diferente de mim, faça as coisas de seu jeito.
- E o japonês?
- O japonês, Saito, envelhece só e cheio de arrependimentos, no castelo de sua sede de poder. Ele representa nosso Ego, que acha que vai sempre controlar tudo e mexer no destino das pessoas. Saito vai precisar do amor que Cobb sente por seus filhos para sair dali. Cobb vai resgatá-lo e não fica preso, pois já se libertou de sua sede de poder, já recuperou a sua forma humana.
- Ok. Acho que estou entendendo. Mas aquilo tudo foi Real, ou não?
- Claro que foi Real. A descida ao Inconsciente e os resgates foram reais. A realidade psíquica interfere na realidade como nós a entendemos. Essa é a função da terapeuta: ajudar o sujeito em sua jornada, sem deixá-lo perdido pelo caminho.
Ficaram em silêncio por intermináveis minutos.
- E aí?
- Bom, eu vim para cá com uma dúvida e agora tenho uma dúzia de dúvidas.
- É sinal de que a conversa foi muito boa.
- (Coçando a cabeça) Acho que sim. Obrigada.

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