segunda-feira, 4 de abril de 2011

Felipão

O técnico de futebol Luís Felipe Scolari é mesmo uma figura. Ainda me lembro quando assumiu a seleção, em 2001, e enfrentava um lobby nacional para convocar Romário. A seleção estava jogando em Goiás, se não me engano, um torcedor passou e lhe deu um xingo, exigindo Romário na Copa. Felipão deu-lhe literalmente um chute na bunda, foi todo mundo para a Delegacia até a turma do deixa disso aparecer e apaziguar a situação. Esse é o Felipão.
Voltou para o Brasil já completamente consagrado, com vários títulos, uma Copa do Mundo inclusive, e vários milhões de dólares na conta. Ainda encontra forças para treinar um Palmeiras completamente esfacelado, por um terço do que ganhava no exterior e ainda tem que aguentar repórteres recém formados comparando o seu salário com o orçamento dos times que enfrenta no Paulistinha. Ainda ameaçou buscar o moleque no Inferno se algo acontecer à sua família. O mesmo bom e velho Felipão. A minha secretária do lar, Rafaela, é palmeirense roxa, sócia da Mancha Verde. Quando o Palmeiras contratou Max Pardalzinho e Adriano Michael Jackson, caímos de pau nela, com boas gargalhadas na cozinha. Outro dia o Adriano Michael Jackson meteu quatro gols numa partida. No Comercial do Piauí, ok, mas o moleque, completamente desconhecido, fez gols e voava em campo como ninguém. Tive que aturar gozação da Rafa, como são as coisas do futebol. Lembrei a ela que só o Felipão para tirar leite desse território árido que é o elenco alviverde.
É muito raro um técnico fazer um jogador jogar mais do que realmente joga. O Telê cansou de lesar os clubes que compravam jogadores do São Paulo que jogavam uma barbaridade no Morumbi, para depois se revelarem jogadores bem medianos longe do Mestre. Felipão também causa essa impressão. Ele consegue extrair o máximo dos jogadores, sobretudo dos medianos, para depois ser aquela decepção quando vão para outros clubes. Felipão trabalha os seus grupos com dois princípios que aplica sempre e que sabe que aplica, embora não dê nomes científicos para isso: o princípio da Atenção Plena e o princípio da Visão Compartilhada.
O primeiro princípio é o de ter no grupo pessoas que sempre estão no fio da navalha, sempre na ponta dos cascos física e psiquicamente. Por isso ele não levou Romário. O baixinho quebrava os seus dois princípios, sempre com a preguiça e o individualismo inconpatíveis com a família Scolari. Quando você ouve o homem espinafrando o time ou comprando briga com Valdívia e Kléber, as estrelas do parco céu palmeirense, ele está mandando um recado para todos: aqui não tem corpo mole, aqui tem que ter entrega. E alma. E atenção completa, elétrica. Ontem, finalmente, elogiou o Kléber, depois de meses de rusgas. Quando você consegue de seu grupo a Atenção Plena, não precisa de nenhum palestrante motivacional na concentração.
O outro princípio é o da Visão Compartilhada. Esse é o princípio de família que ele coloca em seus trabalhos. Na Copa de 2002 ele colocou todos os jogadores para jogar. Todos. Todos estavam compartilhando a visão do objetivo em comum e da possibilidade de alcançá-lo. Não é à toa que ele levou o limitado Portugal a uma final da Eurocopa e à duas quartas de final de Copa do Mundo. Todos acreditavam na visão que compartilhavam, de chegar pelo menos até lá, de ir cada vez mais longe.
Felipão tem a característica dos grandes líderes. Isso não se ensina em workshops de final de semana.

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