quinta-feira, 23 de junho de 2011

Muricy

Hoje vou viajar para dez dias de férias. Vou para a terra do tio Sam, então se os posts ficarem raros, é que estou enjoado em alguma montanha russa. Estarei de volta em Julho.
Despeço-me do Brasil falando de um assunto que eu adoro, que é futebol. Não vão embora, meninas. As metáforas futebolísticas servem para a nossa vida psíquica e profissional. Talvez valha a pena examinar esse mundo, de vez em quando.
Um cliente meu, gaúcho e colorado, confessou não entender a minha birra com Muricy. O cara foi tricampeão brasileiro com o São Paulo. Exatamente por isso, respondi, azedo. O São Paulo de Telê Santana sempre teve vocação internacional. Campeonato Brasileiro é para os pobres. Explico esse azedume: Muricy é obsessivo. Todas as suas qualidades e defeitos derivam desse diagnóstico inicial. O pior, é sãopaulino. Queria vencer uma Libertadores pelo São Paulo de qualquer jeito. No São Paulo, Muricy era mais obsessivo, teimoso, irritável. Sempre com a sombra edípica de Telê Santana sobre a sua cabeça. Ficava mais envolvido emocionalmente. O resultado? Perdeu todas as Libertadores que disputou pelo tricolor, sempre tomando coco de times brasileiros: Internacional, Grêmio, Fluminense e Cruzeiro. Saiu do São Paulo demitido como um cara tosco, teimoso, bom de campeonato de pontos corridos e um perdedor vocacional de copas. A minha birra foi recompensada duplamente quando Muricy afundou com o Palmeiras no ano seguinte. Dupla satisfação, Muricy e Palmeiras na mesma draga. Melhor que isso, só se fosse o Corinthians, que agora deve estar roendo as unhas por não tê-lo contratado na época.
Mas alguma coisa aconteceu com o cara. Quando chegou no Fluminense, arrumou o time em poucas rodadas. Foi campeão com a devida e irônica ajuda de seus times anteriores, São Paulo e Palmeiras, que entregaram os seus jogos para sacramentar o Sem-ter-nada do Corinthians no ano passado. No Santos, Muricy Ramalho foi ainda mais surpreendente: sereno, ponderado, arrumou a defesa, que era uma peneira antes de sua chegada. Mas isso não era novidade. Arrumar a defesa sempre foi a especialidade dele. Muricy montou um meio de campo marcador e criativo ao mesmo tempo, coisa que nunca tinha conseguido no São Paulo. Mas não me rendo completamente: Muricy continuou o mesmo obsessivo/teimoso mantendo o ridículo e esforçado Zé Love de centroavante. Tudo pela sua obsessão em não mexer na estrutura do time, mesmo mantendo o folclórico ruivo perdendo gols debaixo da trave, para desespero de meu filho, que é santista doente e chama o Muricy de gênio.
Nas semanas anteriores à final, Muricy deu uma entrevista dizendo que "não tinha loucura" em ganhar a Libertadores. Senti um arrepio na espinha. Ele tinha achado o ponto certo: o quero-ganhar-mas-posso-perder, tão difícil para encontrarmos na vida. Eu tenho uma história, tenho uma trajetória, a vitória não vai me iludir, a derrota não vai me destruir. Quando eu li aquilo, percebi que o Muricy, já na galeria dos grandes técnico da nossa história futebolística, estava pronto para ganhar a taça que perdeu quatro vezes no São Paulo. Uma mexida que ele deu na posição do Arouca, do primeiro para o segundo tempo, decidiu o jogo em um minuto. O meu filho continuou repetindo: Muricy é um gênio. Confesso que sorri com uma pequena lágrima no canto do olho.

Um comentário:

  1. A trajetória... o corre, cai, levanta, tropeça, cai novamente, levanta...e... não para de correr, de seguir, até que depois de tanto, tanto... haja o entendimento do "quero-ganhar-mas-posso-perder!!!".
    Muuuuito legal!!
    Boa viagem!!!
    A voce, e a família!!!
    Até o retorno!!
    Abraços,
    Sonia

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