quinta-feira, 16 de junho de 2011

Alegria, Alegria

Há alguns anos atrás, um paciente me relatou um sonho desses que ficam guardados numa galeria terapêutica de sonhos inesquecíveis. Ele sonhou com o seu sogro, já falecido, um homem que sempre fora muito sério. Como toda pessoa séria demais, era muito triste. O seu sogro, visitando-o em sonho, não parecia mais tão triste. Aparentava mesmo uma paz muito grande, como acontece tão frequentemente quando sonhamos com pessoas já falecidas. Parece que, em algum momento do sonho, quando estavam para se despedir, o sogro, que quase nada ou nada falara, olhou para ele e disse: "Não se esqueça da alegria". Ele parou a terapia algum tempo depois e até onde eu sei, não deixou ele mesmo de ser um homem muito sério e um pouco triste. Acho que o sonho falou mais a mim do que a ele.
Somos seres desejantes. Máquinas desejantes, segundo um autor que admiro. Pulamos de um desejo a outro, de uma insatisfação a outra. A percepção do tempo, a capacidade de entender e planejar o futuro é uma capacidade ímpar que acompanhou a evolução do Homo sapiens. Não é à toa que o cérebro desse hominídeo é o maior da espécie, com um Lobo Frontal avantajado. Andar em dois pés e usar as mãos ajudaram esse Cérebro a se desenvolver. Entretanto, o fato de antever o futuro e manejar o próprio alimento, as estações do ano, os instrumentos manuais, não tornaram o Homem mais feliz. Antes, viramos uma espécie de prisioneiros do Futuro. Outro dia ouvi um comentário no rádio, onde um comentarista proferiu a supersimplificação de que a diferença entre Psicoterapia e Coaching é que a primeira promove uma viagem ao passado, enquanto o Coaching pensa e prepara mais o futuro. Talvez a melhor terapia seja aquela que ajude o Sujeito a ser dono de seu tempo Presente, sem olhar o Passado com amargura nem o Futuro com angústia. Em vez de questões do tipo: "Onde você se enxerga daqui a cinco anos?", talvez seja melhor levar o seu filho para o estádio que ele vai lembrar disso daqui a vinte anos.
De tanto preocupados com o futuro, com a carreira, com os sonhos de consumo, subtraímos de nossa vida a sensação da alegria, que aparecia no sonho de meu expaciente. Alegria das coisas realizadas, dos objetivos conquistados, do trabalho honesto que nem sempre rende tanto como outros trabalhos, não tão honestos, mas que tornam nosso travesseiro leve. Talvez fosse essa a alegria que o sogro tentava transmitir a seu genro, perdido nas angústias que diminuem nossos dias e nos afastam dessas microalegrias que acontecem toda hora.
A Psicoterapia não é uma escavação arqueológica, assim como o Coaching não é exercício de futurismo. Talvez sejam apenas formas de ajuda, de construção de pensamentos e estrutura para uma vida. Essa construção pode ser muito dura, e quase sempre é, porque somos Homos sapiens e ficamos caraminholando o que será do amanhã. Mas dá para, de vez em quando, só de vez em quando, olhar para todo o caminho percorrido e sorrir para ele. Com a mais profunda das alegrias.

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