quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Fantasma na Máquina

Ontem a Folha Equilíbrio trouxe uma matéria sobre a Psicanálise, com metade do caderno composta por psicanalistas defendendo o método e a outra metade dizendo que a Psicanálise já era, é uma religião, a Neurociência que é legal, etc, etc, etc. Um artigo de Suzana Herculano Houzel, uma autora que eu costumo curtir e uma pesquisadora bacana, descartou completamente a tal da Neuropsicanálise. Disse que a Psicanálise não precisa da Neurociência e vice versa. Pior ainda, colocou de novo a psicoterapia como instrumento para o autoconhecimento, sem finalidade ou vínculo terapêutico. Para completar a ironia, ao seu lado na mesma página, há o relato de uma jovem advogada, que após um processo de quatro anos de análise, melhorou de vários problemas clinicos, como Endometriose e Tumores de Fígado (!). Os cientistas diriam que a moça melhorou porque seguiu o seu tratamento médico e atribuiu a melhora ao terapeuta, como um índio atribuiria uma melhora espontânea às artes de um pagé. Já os psicanalistas alfinetam a Psiquiatria comparando os colegas a fascistas da medicação, tacando remédios em sentimentos normais, como a tristeza, que é diferente da Depressão. Não briguem, crianças, não briguem.
Eu, que como um mutante, faço as duas coisas, fico um pouco desalentado com essas alfinetadas. É como levar porrada de dois briguentos quando tentamos separar a briga.
A moça, jovem advogada, faz um relato de sua dificuldade em engravidar, por conta da Endometriose. Suprema heresia, afirma que a sua doença tinha uma origem psicossomática. Traduzindo em bom Português, como se houvesse um fantasma na máquina de seu corpo, produzindo uma doença orgânica. Uma frase bonita de seu relato: "A análise desautorizou o meu sofrimento e me fez responsável pela minha vida, minha dor. Tirei a muleta". Não é engraçado que os detratores sempre afirmem que a análise é exatamente uma muleta para os inseguros diante da solidão da vida? A moça tirou a muleta de atribuir ao Outro a responsabilidade por sua dor. Passou a andar com as suas pernas, passo a passo. O fantasma do medo saiu de dentro da máquina, ou virou o Gasparzinho, o fantasma camarada.
O processo analítico traz à tona o relacionamento de um sujeito com seus estressores, reais e sobretudo imaginados. Dá a pessoa uma capacidade de olhar em perspectiva para velhas e novas feridas e, acima de tudo, como a jovem paciente descreveu lindamente, tira das feridas o estatuto de prisão, de mordaça. O efeito é uma diminuição progressiva das angústias e uma resiliência maior aos estressores diários de nossa vida. Diminuindo o Estresse e os estressores, as doenças que dependem dos mesmos (quase todas) também evoluem melhor. Por isso que a análise ajudou no controle da Endometriose e na diminuição dos tumores de Fígado. A Medicina tradicional também contribiui para a melhora? É óbvio que sim.
Imagino que vai demorar algumas décadas para que os analistas e os neurocientistas trabalhem conjuntamente, aproximando os constructos, alinhando hipóteses, compartilhando os saberes. Dr Freud e Dr Jung, hoje em dia, prescreveriam os medicamentos disponíveis com muita alegria.

2 comentários:

  1. Sabemos ser saudável a discordância de opiniões em qualquer assunto que seja.Afinal, através de diferenças, contrastes, conseguimos perceber conceitos e assim caminha a evolução de tudo.
    Com a exposição do conhecido, podemos escolher o melhor, o mais eficaz e buscar avançar.
    O problema é não haver senso comum verdadeiro pelas partes interessadas.
    Vemos atualmente e no post , a descrição de uma discussão egóica a respeito do que é bom, melhor, ou ultrapassado.
    E vemos isso em muitos temas, situações na TV, nos jornais, onde o foco principal da discussão , que é o objetivo comum , que nesse caso é a melhora e cura de pessoas, fica para segundos, terceiros planos.
    Profissionais se empenhando em "fazer nome"(e dinheiro), acima de tudo.A questão é... acima de tudo!!!
    Somar? Para que?
    Compartilhar os saberes? Para que?

    Quero terminar esse comentario com uma frase de Galileu Galilei:
    "Você não pode ensinar nada a um homem, você pode apenas ajudá-lo a encontrar resposta dentro dele mesmo".

    Abraços,
    Sonia

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  2. Gostei do título do post....me fez recordar da teoria de David Bohm... Quem olha o holograma processado pelo cérebro??? "o fantasma na máquina".. A.M

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