sábado, 10 de março de 2012

O Impera-Dor

Na sua obsessão edípica pelo São Paulo e por Juvenal Juvêncio, Andrés Sanchez, então presidente do Corinthians, contratou Adriano, O Imperador, para vestir a camisa 10 do Timão, há um ano. ( Calma, meninas, embora o texto vá falar de alguns personagens do futebol, o assunto será outro. Vamos falar do assunto de sempre, a construção de uma Psiquiatria Compreensiva).
Tentando causar o impacto publicitário que o São Paulo obtivera com o Luís Fabiano (outro furo n´água, diga-se de passagem), Andrés Sanchez riu-se com a atenção e o espaço na mídia gerado pela contratação de um exjogador em atividade, como é o caso de Adriano. Deu no que deu. O roliço tirou um ano sabático no Corinthians, curou os seus tendões, enganou em alguns treinos e repetiu o que vem fazendo nos últimos anos, com a rotina de bebedeiras, faltas e mentiras que escondem algo pior e mais grave, clinicamente falando. Ontem, finalmente, Tite jogou a toalha e sentenciou que o jogador volta para o seu Spa, onde ele vai fingir que quer treinar, emagrecer e voltar a ser um atleta de alto desempenho que foi pela última vez há uns cinco ou seis anos. O desânimo em seus olhos sugere que ele, simplesmente, desistiu de Adriano. Como Dunga e vários outros já fizeram antes.
Normalmente volto mais tarde para a casa, depois de um longo dia de trabalho e adoro ouvir os programas de esporte que tem no rádio. Há alguns meses eu ouvia um debate em que os analistas esportivos, nome bonito para a saraivada de palpites que damos em qualquer conversa de boteco, se perguntavam por que um cara que tem tudo, dinheiro, sucesso, talento, afeto das pessoas, consegue destruir tudo o que construiu diariamente, mantendo, apesar dos milhões de reais que correm em suas contas, o mesmo comportamento autodestrutivo. Um deles tentava explicar que a Depressão é uma doença como outra qualquer, independe da conta bancária do doente. Mas tem mais caroço nesse angú.
Adriano sempre foi um bad boy, mas tenho a impressão que degringolou de vez após a morte de seu pai. Não é incomum que um jogador de futebol passe a ser um embusteiro depois de ganhar dinheiro para as próximas cinco gerações de sua família. Há uma infinidade de exemplos, Ronaldinho Gaúcho, por exemplo. O cara aprende que não precisa mais se esforçar, basta fazer uma jogadinhas que lembrem os anos de ouro e beleza, a mídia bate palminhas, Galvão Bueno baba de esperança, “Ele está de volta”. O jogador vive da memória do atleta que um dia foi, da emoção que causou em todos. Essa é a sua ilusão e desgraça. Tenho a impressão, à distância, que Adriano entrou para esse mundo da “embromation” futebolística após a morte repentina de seu pai.
Quando Adriano ficou “internado” na concentração por uma semana, emagreceu e encheu a todos de esperança (de novo). Alguém da Comissão Técnica pronunciou as palavras fatais: “Mais algumas semanas e vamos ver o Adriano que todos conhecem, ele vai voltar a ser O Cara”. Pronto, o homem afundou de novo, voltou a engordar, voltou a aprontar. A mensagem é clara: “Não queiram nada de mim, não esperem nada de mim”. Esse é o outro lado de quem vive da própria memória: ele sabe que nunca mais vai voltar a ser o que as pessoas esperam.
Nos últimos posts eu falei do Vazio criativo, o vazio que dá origem à nossas idéias e ao nosso Ser profundo. O vazio de Adriano não é esse. É bem diferente, na verdade. É o vazio de quem perdeu o senso de sentido, o que ele vai procurar nos excessos e nas baladas, nos sumiços dentro das ruas da favela onde cresceu, onde a luta pela sobrevivência tinha sentido. Adriano procura pelo menino que um dia foi, as emoções que sentiu até chegar ao sucesso.
Não sei se Adriano, o homem, é abordável para um tratamento. Sei que muita gente já tentou fazê-lo. Mas, como psiquiatra, me dá uma coceira danada vendo um rapaz de menos de trinta anos caminhando a passos largos para o precipício. Numa sessão imaginária, eu gostaria de perguntar sobre o seu pai, o que ele não consegue esquecer nem perdoar na relação com o velho? Por que esse luto não se resolve? Bom, cara, o telefone do consultório está aí do lado na coluna. Liga lá para a Yrá e vamos colocar ordem nessa zona.

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