sábado, 18 de fevereiro de 2012

Carnevale

Essa época para mim é sempre de descanso. Sempre me imagino nos retiros de meditação, uma espécie de antítese do Carnaval. Um tremendo folião.
O pouco que sei sobre o significado do Carnaval é que esse nome deriva de Carne Vale, uma festa de comilanças e bebedeiras antes de um período de abstinência, que é a Quaresma. Esse período antecede a festa da Páscoa, uma preparação para o mistério de Morte e Ressurreição do Filho do Homem. Não deveria haver consumo de carne na Quaresma, então o Carne Vale eram festas para comer e beber tudo o que se tinha de direito nesses quatro dias que antecedem a Quaresma. Lógico que foram incorporados diversos rituais pagãos de embriaguez e fertilidade e talvez a sombra arquetípica de um deus grego, Dioníso, que após a embriaguez e o êxtase costumava fazer suas vestais estraçalharem os participantes da orgia. Esse estraçalhar deve estar manifesto no rasgar da fantasia no último dia da folia.
Estava ouvindo uma entrevista de um carnavalesco do Rio (engraçado como nessa época o título de “carnavalesco” dá ao seu proprietário um certo ar acadêmico, como se fossem usar becas e defender teses sobre o carnaval e quem tem ou não tem o samba no pé). O tal carnavalesco respondeu a uma pergunta sobre o enredo de sua escola, que iria falar do iogurte. Eu soube pelo repórter que o enredo havia sido comprado por um patrocinador, coisa que deve ser feita desde que o rei Momo é rei Momo, mas que essa escola particularmente fez às claras, assumindo publicamente o jabá. Disse o tal sujeito que seria uma boa ocasião para desmistificar e mostrar que se podia fazer bom Carnaval com um tema pautado. Eu só gostaria de saber quem pautou a escola de samba paulista que fez um enredo homenageando essa figura maiúscula de nossa cultura, Roberto Justus. Quem teve essa idéia, meu Deus?
Carnaval é para ser visto e se vender ao olhar do outro. As mulheres com seus peitos de bexiga (silicone francês de última geração), Roberto Justus vestido de rei no carro alegórico, as moças gorduchas tentando caber nos biquínis, tudo pede pelo olhar do Outro que está atrás das câmeras. Essa é a grande disputa na sociedade do espetáculo, a disputa pelos fragmentos de atenção que distribuímos, esgazeados pela profusão de bundas e plumas disputando nossos olhos entediados.
Lembro de uma entrevista de Gilberto Gil há alguns anos, feita logo após um desfile de um bloco baiano, ele estava muito emocionado por se sentir apenas um pedaço, uma partícula ou uma gota naquele mar de gente. Os seus olhos estavam marejados pela emoção de ser só mais um naquelas ondas e poder se sentir parte da emoção que unia as pessoas. Uma experiência de uma condição humana, de ser parte da massa, em suas aflições e visões compartilhadas. Era o famoso recuperando o seu anonimato, uma espécie de antítese do que é o carnaval. Nele, todos os anônimos buscam seus quinze segundos de fama. Acho que o verdadeiro deus do Olimpo por traz do Carnaval não seja mais Dioniso. Carnaval é a festa de Narciso.

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