quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Invisível

Desde que o mundo é mundo que os homens se dividem em quem acredita apenas no Visível e aqueles que acreditam no Invisível. Durante boa parte de nossa evolução humana, os poetas do Invisível eram ampla maioria, com todo um Universo de mitos, lendas e seres invisíveis que se metiam na vida dos homens: gnomos, elfos, almas penadas. Desde o Iluminismo que a balança passou a pender para o lado Materialista. Tudo que estava fora do elemento físico passou a ser taxado de crendice, superstição, ocultismo. As Religiões viraram clubes dominicais onde as pessoas revivem ou recontam velhas histórias e velhos mitos, que ainda sustentam toda a cultura e a ordem social, mas encontram nos cientistas sempre um nariz torcido. Não acreditar em nada que seja medido, testado, comprovado, virou a verdadeira Religião, que conta já com a sua própria Inquisição.
Há alguns meses eu contei nesse Blog que encontrei com um velho e conhecido colega, hoje um ótimo pesquisador e um profissional sério, conceituado. Ele cruzou comigo num Congresso e me perguntou se eu "ainda era um junguiano", como se isso fosse uma doença da juventude que em algum momento encontramos a cura. Essa é a tal Inquisição. Ou você acredita no Método, ou está fora.
Na Física pelo o pouco que eu sei, essa divisão existe e é antiga. Os metafísicos também são caçados e alvejados pelas setas do deboche. Da mesma forma que Galileu teve que engolir a sua teoria diante do tribunal da Inquisição para não morrer na fogueira, alguns metafísicos levam a sua vida sem falar muito em suas crenças, tocando a sua vida no mundo dos fenômenos mensuráveis.
Jung, psiquiatra suiço que nunca quiz que houvesse um movimento junguiano, descobriu, ou renomeou esse substrato de invisível que está na base de nossa vida.
Chamou isso de Inconsciente Coletivo, uma espécie de elo que nos une a todos. Quando uma criança de três anos é atropelada por um jet ski que um garoto de catorze anos foi fuçar, todos somos, de certa forma, afetados. Todos imaginamos o que vai ser do mundo com essa permissividade e impunidade cada vez mais entranhada em todos.
Os Físicos ainda falam em uma Ordem invisível no meio da característica caótica e imprevisível do mundo. Podemos chamar essa Ordem Profunda e Invisível do nome que preferirmos: Tao, Self, Anima Mundi, Deus.
Tem um pequeno texto de Borges que fala sobre essa Ordem Invisível. Conta essa história que um artista passou a vida inteita pintando, esculpindo, produzindo às cegas o que saía de seu coração. Quando ele morreu, foi dado a ele o presente de poder ver lá das alturas toda a sua obra. Olhando lá do céu ele pôde perceber que toda a sua arte, pintura e escultura reunida formavam o contorno de seu rosto.
Vivemos, então, pintando, sem saber, o contorno de nosso rosto. A Ordem Invisível vai juntando esses pedaços, em cada minuto de nossa vida. Acreditemos ou não nisso.

2 comentários:

  1. Que coisa bonita que disse Marco :) sobre a ordem do invisível contando a história do artista.
    Pra mim o invisível é uma questão de Fé (aquela que vivenciamos dentro de nós), para os que tem fé esse é o nosso mundo interior, repleto de mundos,imagens,sons, com personagens e histórias que se entrelaçam em uma grande rede, é a grande ópera ou espetáculo de nossas vidas sendo representada por criaturas feitas de todo tipo de tecido, cor , nosso pano de fundo de nós mesmos. Somos ao mesmo tempo a platéia e os atores encenando seu espetáculo, tantas personas que mostram nossos mínimos detalhes... um invisível possível de ser visto e encarado para buscarmos nossa "perfeição". Jung foi um estudioso desse grande teatro, por ele e através dele foi possível adentrarmos nesse mundo invisível e termos o prazer de nos apresentarmos, de erguer as cortinas e adentrarmos nos bastidores mais profundos de nossa alma.
    Bjs.
    Luciana

    ResponderExcluir
  2. Vindo agora de um "café filosófico", onde folhando um curioso livro do Papa Bento XVI, intitulado Jesus, ele falava sobre a expeiência mística de Paulo na estrada para Damasco. Muitos poderiam dizer que ela foi causada por stress, e a liberação excessiva de cortisol levou Paulo a ter alucinações. Se fosse consultar-se hoje com um médico talvez fosse medicado com estabilizadores de humor.
    O que me incomoda é pensar que se todos os loucos da História tivessem sido medicados com os farmácos de hoje,teríamos tido história?
    Outro dia lia também um livro sobre um médium João de Deus, que realiza curas milagrosas.
    Então se não é o invisível que cura, quem cura?
    Ah, mais uma das inumeras capacidades do cérebro humano. Mas acontece que assim como com Jesus, não são todads as pessoas que são curadas. E aí? a capacidade do cérebro humano escolhe quem vai curar e quem não? Muito burrinho esse cérebro humano...prefiro ficar com o Invísivel! Me consola pensar que Ele vai dar conta do caos, COMO SEMPRE FEZ. Então,quando consigo, sento no barco e aprecio a paisagem...

    ResponderExcluir