sábado, 18 de fevereiro de 2012

O Quarto Cérebro

Eu sei que esse blog anda cheio de revelações bombásticas sobre o seu autor. Recentemente confessei de público que estava curtindo o BBB e até escrevi dois posts sobre ele. Repercussão zero. No churrasco de Domingo, fiz a revelação chocante para a minha família e até apostei em Fael para ganhar essa edição. Repercussão menos que zero. Ninguém sequer sabia quem era Fael. Diante de tanta indiferença, passo aqui para uma nova revelação: estou fazendo um bolo pronto, desses de Supermercado.
É coisa meio boçal de se fazer: junta dois ovos, meia xícara de óleo, duas de leite, bate com a colher até ficar com uma consistência pastosa, unta a fôrma e derruba a massa. Quarenta e cinco minutos depois, tira do forno e (rufar dos tambores): Tcharam! O bolo está pronto, cheio de grãos integrais, botei uma bola de sorvete encima, meu filho curtiu. Tudo muito óbvio, um psiquiatra mediano que acha o constructo da Depressão Bipolar uma grande cagada (assunto para outro post) consegue dominar o processo após ler as instruções umas doze vezes, mais ou menos. Hoje de manhã, enquanto escrevia outro post para esse concorridíssimo blog, deixei o bolo no forno mais tempo do que o necessário, queimando-o embaixo e encima. Tentei me convencer que ainda dava para comer, mas não deu. Nem com bola de sorvete. Quem curtiu foi a minha cachorrinha, Chiara, que anda muito borocoxô com a partida da Bunny (vide o post com esse título, de Janeiro), acabou comendo um bom pedaço do miolo do bolo, cheio de grãos e com pouco açúcar mascavo. Quase falei do Big Brother para ela, mas estava mesmo concentrada no pouco de bolo salvo. O resto foi para o lixo.
O fato é que mesmo uma coisa que demanda poucos neurônios em boa forma para se fazer, como um bolo pronto, de Supermercado, demanda alguns aprendizados. Se colocar muito leite, a massa fica mais fácil de bater, mas fica sem gosto quando pronta, além de meio mole. Se o bolo é tirado na hora certa, fica mais macio, senão seca mais rápido durante a semana. Se deixar esfriar completamente antes de tirá-lo da fôrma, é mais fácil removê-lo, então é melhor não ter candidatos famintos ao bolo na hora em que ele sai do forno. Vejam só que belo sistema de aprendizagem e de tentativa e erro, apenas para aprender a fazer um bolo pronto. Posso dizer que estou ficando bem melhor nessa pequena tarefa doméstica, apenas montando esse pequeno sistema de aprendizagem.
Não há nenhuma coisa que desenvolvamos em nossa vida que não obedeça a esse sistema que parece simples mas é extremamente complexo de repetição e aprendizagem. Já falei disso em outras ocasiões, mas não canso de repetir. O interesse gera a tentativa, a tentativa gera o erro, o erro gera o aprendizado. As pessoas mais sensíveis ao erro passam menos tempo tentando e mais tempo fugindo dos próprios erros. Se o bolo queimar, optam por comprar um bolo da padaria, apenas para evitar a frustração.
Uma parte importante do trabalho de um terapeuta é lidar com esses bloqueios. Eles são antigos, profundos e parecem bestas para quem vê de fora, mas insondáveis para quem os vê de dentro. Bloqueios afetivos, profissionais, sexuais, uso inadequado de substâncias, tudo depende da capacidade de entender o bloqueio e regravar no Cérebro outras experiências, mais favoráveis, inscrevendo um novo modo de fazer aquilo que antes parecia impossível.
Os medicamentos são usados quando os bloqueios são causados e piorados por disfunções de nossa neurotransmissão e esgotamentos de recursos e energia. Incrível como ainda chegam pessoas aos nossos consultórios com um profundo sentimento de fracasso e aquela frase: “Nunca pensei que um dia eu estaria aqui”. Às vezes, eu respondo: “Você não sabe o que estava perdendo”.

2 comentários:

  1. Para algumas pessoas o sentimento de fracasso é devastador. Por que não sobra energia. E não é possível recomeçar. Não há memória de experiências bem sucedidas. Então, acho que a terapia faz isso, grava pedacinhos de possibilidade que aos poucos vão se juntando e formam um chão, o que faz desaparecer a sensação de cair para sempre. E pensar que nem se imaginava o que poderia ganhar.

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